ReproduçãoA campanha só vai começar de fato quando a candidata genérica dizer o que pensa

As chances de Kamala

A candidata democrata está um pouco à frente de Trump nas pesquisas, mas isso não é garantia de vencer no Colégio Eleitoral
16.08.24

A democrata Kamala Harris está em seu melhor momento na corrida presidencial dos Estados Unidos. Nas pesquisas de intenção de voto, ela está um, dois ou três pontos percentuais à frente do republicano Donald Trump, a depender do agregador de pesquisas. Com 59 anos, Kamala não carrega consigo a principal desvantagem do presidente Joe Biden, que era sua idade avançada. Nos últimos dias, ela atraiu os holofotes da mídia, turbinou a arrecadação da campanha, recrutou voluntários e lotou comícios. Mas o resultado desta eleição ainda é impossível de prever. Se o pleito fosse hoje, a vantagem de Kamala nos votos totais ainda não seria suficiente para lhe garantir uma vitória no Colégio Eleitoral, a instituição que efetivamente decide quem será o próximo presidente. Ela ainda tem um grande desafio pela frente, que é mostrar aos americanos quais são suas posições em vários temas, sem desagradar potenciais votantes.

No agregador de pesquisas do site Real Clear Politics, Kamala tem 48,1% e Trump, 47,1%. A vantagem é de apenas um ponto. No do site FiveThirtyEight, ela tem 46,2% e ele, 43,5% — diferença de 2,7 pontos. Em um sistema eleitoral como o brasileiro, Kamala estaria eleita caso esses números se confirmassem nas urnas. Mas não funciona assim nos Estados Unidos. Vale lembrar que, em 2016, a democrata Hillary Clinton teve 2,8 milhões de votos a mais que seu concorrente, o republicano Donald Trump, mas perdeu na contagem do Colégio Eleitoral: 227 contra 304 de Trump. Em agosto daquele ano, Hillary estava bem mais à frente de Trump, com uma diferença de seis pontos — bem mais do que Kamala neste momento.

O que distorce o resultado nos Estados Unidos é que, na grande maioria dos estados, os candidatos mais votados levam todos os delegados que representam aquele estado no Colégio Eleitoral. Trata-se de uma instituição que só se reúne após as eleições, com a função de escolher o próximo presidente. Nessa configuração, a importância dos estados-pêndulo aumenta exponencialmente. Nesses locais, em que tanto republicanos quanto democratas podem ganhar, um candidato que tenha pouco mais da metade dos votos pode levar todos os seus delegados, desequilibrando a disputa.

Na última semana, uma pesquisa da Cook Report mostrou que, nos sete estados-pêndulo (a conta varia), Kamala está com uma pequena vantagem ou empatada com Trump em seis deles. Trump só leva a melhor em Nevada. Essa pequena vantagem, contudo, ainda pode mudar nos próximos três meses, já que a eleição só ocorre em 5 de novembro.

Com a desistência do presidente Joe Biden em julho, a corrida presidencial praticamente voltou à estaca zero. Os eleitores democratas comemoraram a troca de candidato, mas a briga ainda não começou para valer. Os que declaram seu voto nela ainda não a conhecem direito. Kamala é uma candidata “genérica”. Suas declarações confortam, pois ela diz aquilo que gostaria qualquer democrata: é preciso respeitar o direito das mulheres e das minorias, baixar o preço dos remédios, valorizar a previdência e melhorar os programas sociais para os mais pobres e idosos.

Por enquanto é só isso. Tudo genérico, sem sal, sem personalidade, sem profundidade. Os democratas se regozijaram ao encontrar uma candidata que pensa como eles, mesmo que ela fale pouco ou quase nada. Acontece que nem todos defendem as mesmas coisas. Essa lua de mel deve mudar assim que ela começar a dar entrevistas para a imprensa. Além disso, Kamala tem três debates agendados com Trump.

Ao tomar posições, Kamala frustrará muitos dos democratas e até mesmo alguns independentes que hoje a apoiam. Ela já se aproximou de jovens que defendem boicotes de armas a Israel, mas evitou tomar uma posição mais firme. Só prometeu conversar sobre o assunto. Se seguir nessa toada, ela perderá o apoio de muitos judeus. No passado, Kamala se colocou contra a exploração do gás e petróleo de xisto, o que desagrada os americanos que defendem o crescimento da economia privada e são contra o excesso de intervenção governamental. Ela também já defendeu uma reformulação no sistema de saúde e apoiou a compra de armas pelo Estado, o que os lobbies a favor chamam de “confisco”.

É do interesse de Kamala prolongar ao máximo sua condição de “candidata genérica” e evitar causar mágoas entre os que hoje a apoiam. Mas, numa disputada eleição como a americana, manter o secretismo é impossível. Em algum momento, ela terá de se colocar. É aí que a campanha vai começar. De novo.

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  1. Estou sentindo que o pessoal da Crusoé está batendo demais na Kamala, ao passo que não fazem a mesma oposição ao Trump. Acho que deveriam refletir e fazer, mais ou menos, como no Brasil (dar em Chico e em Francisco).

    1. No Brasil não se bate em Chico e tb em Francisco. O duplo padrão moral corre solto.

  2. Trump é tão detestado que basta colocar alguém que não esteja senil que é o suficiente para virar o jogo, a julgar pelas sondagens. A sorte do Trump é que a Kamala é péssima e quanto mais falar mais vai expor sua falta de capacidade

  3. realmente, a eleição está totalmente aberta, mas a evolução da Harris tem sido muito positiva e o colégio eleitoral é outra eleição, como Trump bem sabe; por outro lado, Trump, nos seus comícios, só faz atacar a candidata democrata, contrariando os seus estrategistas e, por isto, não tem agregado eleitores, "pregando" para os já convertidos; vai funcionar?

  4. Realmente, a eleição está aberta e falta bastante tempo até a eleição...antes da saída do Biden, Trump ganharia fácil no voto direto...colégio eleitoral é outra coisa e o Trump sabe muito bem disto, já que perdeu para o Biden...por outro lado, a evolução da candidatura da Harris é extremamente positiva e o discurso do Trump não tem agregado votos...ou seja, prega para os já convertidos e em seus comícios, contrariando os seus estrategistas, só faz atacar a candidata democrata; vai funcionar?

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