Roque de Sá/Agência SenadoCaiado: um Jair Bolsonaro que sabe usar garfo e faca

A ressurreição da turma do DEM

Fim da era Luciano Bivar à frente do União Brasil marca nova fase do grupo ligado a ACM Neto, que representa o antigo DEM; mudança vai ter impactos em 2026
08.03.24

Se existe um termo que virou modinha nos últimos dois anos é um tal de “plot twist”. Para quem não está muito habituado a essa expressão, o plot twist é uma mudança radical e inesperada em um enredo de romance, série, filme, quadrinho, jogo eletrônico etc.

Na política, plot twists são comuns. Os menos novinhos chamam isso de reviravolta mesmo.E na semana passada o Brasil presenciou o que pode ser classificado como um dos mais impressionantes plot twists da política recente do país: a forma como Luciano Bivar, antigo ex-super-poderoso do União Brasil, perdeu seu próprio partido para o grupo de ACM Neto e companhia.

No dia 29 de fevereiro, o advogado Antônio Rueda foi eleito o novo presidente do União Brasil. O União, graças à eleição de Jair Bolsonaro em 2018, tornou-se uma sigla poderosa, com uma bancada de 66 parlamentares. Em número absoluto de deputados, fica atrás apenas de PL e PT. Para 2024, o União Brasil deve ter um fundão eleitoral bem gordo. Algo na casa dos 500 milhões de reais.

Não é à toa que Bivar, ao perceber que poderia perder sua galinha dos ovos de ouro, fez de tudo na reta final da disputa contra Rueda para não ser obrigado a sair pela porta dos fundos da sigla. E quando se fala “fez de tudo”, isso não é uma metáfora. Bivar ligou para vários parlamentares e, segundo relatos, teria ameaçado até mesmo a família de Rueda. Uma atitude nada republicana. Em outra linha de atuação, Bivar chegou a convocar uma coletiva com um “dossiê” contra o adversário. A ideia era acusá-lo de usar a estrutura partidária para enriquecer ilicitamente. Bivar desistiu na última hora e ficou quieto.

Deve-se reconhecer que, bem ou mal, foi Bivar transformou o União Brasil no partido parrudo de hoje em dia. Para quem não lembra, a legenda surgiu da fusão do PSL (criado por Bivar) com o DEM. O DEM nasceu dos restos mortais do PFL, aquele comandado pelo antigo Antônio Carlos Magalhães – o pai, não o Neto – e que contava com nomes como José Sarney.

Quando o PSL discutiu a possibilidade de fusão com o DEM, a ala de ACM Neto já sonhava em tirar Bivar do comando do partido. Eles consideram Bivar um político tacanho, que se contenta com migalhas. O ex-prefeito de Salvador, o senador Efrain Filho, o governador Ronaldo Caiado, o líder do União na Câmara, Elmar Nascimento, pensam de outra forma. Não se contentam com centavos. Para eles, ou o União instituía um projeto consistente de crescimento ou poderia minguar na irrelevância.

Com o PSDB agonizante, a turma que veio do DEM vislumbrou a oportunidade de ocupar um espaço que antes era do tucanato. O plano não é nada modesto. A cúpula do União quer cravar a presidência da Câmara dos Deputados em 2025 com Elmar Nascimento, ou do Senado, com Davi Alcolumbre. De preferência, as duas ao mesmo tempo. Para então, em 2026, ter projeto próprio para a Presidência da República. O nome já está certo, conforme apurou Crusoé: Ronaldo Caiado, governador de Goiás.

Caiado vem sendo descrito em Brasília como um Jair Bolsonaro que sabe usar garfo e faca”. A candidatura ostenta a simpatia da bancada ruralista e certo apelo popular. Caiado tem o estilo polêmico e boquirroto do capitão reformado, mas sabe que a vida lhe impõe certos limites. Obviamente que a popularidade de Caiado nem chega perto da de Jair Bolsonaro, mas nada que não possa ser construído ao logo dos próximos anos.

A participação de Caiado nos atos de 25 de fevereiro na Paulista foi um primeiro passo nessa direção. Jair Bolsonaro sabe dos planos de seu novo “aliado” e não esta disposto a dar moleza a Caiado. Para esse, o endosso do capitão seria uma bênção, sendo que Valdemar Costa Neto, presidente do PL, já demonstra alguma simpatia pela ideia. Se em meio às negociações o cargo de vice ficasse com o PL, o partido poderia se consolidar como uma espécie de MDB da direita — aquela legenda que não arca com os custos e desgastes de uma eleição presidencial, mas colhe os frutos de uma vitória.

Pelo cenário que se desenha, a mudança no comando do União Brasil foi apenas o primeiro de outros plot twists que estão em preparação. Como numa boa série, há que esperar os próximos episódios.

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
  1. A ascensão de ACM Neto no União Brasil ecoa o Primeiro Triunvirato de Roma, onde alianças estratégicas remodelaram o poder. Este movimento histórico lembra que, embora eficazes para ganhar influência, tais estratégias podem trazer consequências imprevisíveis para a democracia.

    1. ... o incomensurável ACMzim seria o Crasso ávido de conquistas? se puxou ao velho pai nem duvidem e cancão vai cantar ao meio dia.

  2. Caiado é um nome interessante, mas seu partido é um ninho de víboras. Até me dá arrepios pensar em Elmar na presidência da Câmara e o Alcolumbre de regresso no comando do Senado.

  3. Mais uma vez os políticos mostram que administrar o país, fazer um bom governo para o povo não é a prioridade deles. Só querem saber de ocupar postos. Pergunto: se esses postos fossem todos de trabalho voluntário (ganhariam uma barra de chocolate e uma medalha furreca no final do mandato) estariam se engalfinhando desde agora? Pergunta de 1 milhão de dólares, quem souber responda.

    1. Na realidade, os problemas do Brasil, não são os políticos. Eles não vem de Marte ou qualquer outro Planeta. Somos nós que elegemos e na teoria somos chefes deles. Portanto, o problema somos nós que ainda não aprendemos a votar e cobrar nossos votos.

Mais notícias
Assine agora
TOPO