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Leonardo Barreto: “Há um deslumbramento de Janja com o seu projeto político”

26.05.24 16:11

O cientista político Leonardo Barreto é sócio da I3P Risco Político e colunista de Crusoé. Ele foi um dos entrevistados para a reportagem “A mãe dos bichinhos pobres“, sobre a atuação da primeira-dama Janja (foto) na tragédia do Rio Grande do Sul.

Para Barreto, Janja tem errado muito em sua comunicação com o público, ao se colocar no centro das suas publicações, em vez de mostrar o que poderia oferecer às pessoas. “Nas mensagens dela, o centro não é resgate dos animais, mas ela mesma, o protagonismo dela, a capacidade que ela tem de mobilizar recursos. Esse é um erro de avaliação que irá custar caro. Em grande medida, estamos falando da espetacularização da tragédia do outro. Há um deslumbramento de Janja com o seu próprio projeto político. Minha avaliação é que ela está errando muito, e os adversários vão saber aproveitar isso. Aliás, os aliados do PT também vão usar isso”, afirma Barreto.

Abaixo, a entrevista completa com ele:

 

Por que Janja é tão questionada nas redes sociais?
Alguns grupos a veem como aliada. Outros, como adversária. Durante a campanha presidencial de 2022, ela teve a função de dar jovialidade ao Lula. Aparecia com ele namorando e passeando. Quando se falava no amor nas eleições, o objetivo era retirar a imagem de Lula como um idoso rancoroso. Isso funcionou mas, ao mesmo tempo, a Janja trouxe com ela uma vontade de interferência no processo político. Isso tende a ser visto de forma negativa por adversários e por aliados do PT. Para os adversários conservadores e de direita, ela é vista como a cara de uma esquerda nova, identitária, que fala de empoderamento feminino e questões de gênero. Para os aliados, ela é um problema porque concorre com eles pela atenção de Lula.

Como explicar essa resistência a Janja dentro da esquerda?
Essa nova esquerda é vista de maneira negativa pela esquerda clássica, inclusive pelo próprio Lula. No passado, ela foi uma garantia de que o Lula, que sempre foi visto como uma figura machista, que nunca havia se comprometido com essas agendas da esquerda identitária, acaba tendo que assumir compromissos por causa dela. A Janja cobra dele a nomeação de mulheres para cargos no governo e, quando isso não acontece, há um constrangimento. Mas essas coisas nunca estavam no primeiro plano das preocupações do Lula. Apareciam nos programa dos PT, de maneira mais subsidiária. Agora a Janja colocou isso entre as prioridades dele e há algumas resistências. Além disso, o protagonismo que ela alcançou a coloca na linha de possíveis candidatas a sucessores do Lula. Veja o Fernando Haddad, o Camilo Santana e o Geraldo Alckmin, todos políticos que já disputaram eleições. É bem possível que ela seja mais conhecida que todos eles hoje, além de conseguir mais engajamento que qualquer um deles nas redes sociais.

O Lula poderia indicá-la, mesmo sem que ela tenha enfrentado uma eleição antes?
Sim. O Lula já fez isso em 2010, quando escolheu Dilma Rousseff como sucessora. Ela nem tinha muitas raízes no PT. Era um corpo estranho. Então eu acho que, dentro do PT, já existe uma sensação de que esse filme pode se repetir, com o Lula escolhendo a Janja no futuro. 

Mas esse é o objetivo dela?
Não tenho a menor dúvida de que ela tem ambição política, e também não vejo ela tentando esconder isso. Janja quer ser percebida como alguém que tem poder, que influencia nas decisões, que faz articulações entre os ministros, que tem um papel central nas decisões políticas. Ela está semeando essa história porque pretende colher os frutos disso no futuro.

Vai dar certo?
Em política, o que importa não é a intenção, mas o resultado. Com o que ela já fez até agora, Janja sabe que será incluída nas pesquisas eleitorais no futuro. Quando o Lula for tomar a decisão de participar ou não da eleição de 2026, ela será um nome importante. E se ela for mais conhecida do que os ministros e seguir navegando bem em um eleitorado identitário, com muita relevância nas redes, é claro que ela vai virar uma opção. O PT sofre com uma escassez de nomes populares e, convenhamos, o sucessor de Lula não irá passar por nenhuma plenária partidária. Será alguém escolhido por ele. 

Como o sr. vê essas publicações de Janja nas redes em meio às enchentes no Rio Grande do Sul?
Dizem que a beleza de uma ideia está na sua execução. Acho que Janja não tem conselheiros com capacidade de fazer uma boa análise do ambiente. Há um claro objetivo de criar uma identidade política para a Janja. Mas, na comunicação política, o mais importante é dizer para os eleitores o que o candidato pode fazer por eles. Não é simplesmente aparecer e se colocar como sendo o melhor, como a Janja vem fazendo. Nas mensagens dela, o centro não é o resgate dos animais, mas ela mesma, o protagonismo dela, a capacidade que ela tem de mobilizar. Esse é um erro de avaliação que irá custar caro. Em grande medida, estamos falando da espetacularização da tragédia do outro. Há um deslumbramento de Janja com o seu próprio projeto político. Minha avaliação é que ela está errando muito, e os adversários vão saber aproveitar isso. Aliás, os aliados do PT também vão usar isso.

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  1. Enfim a nossa Evita da diversidade e da estupidez mas é o que este país de manés sob a ditadura mais cínica da história a esmagar a cidadania merece ... no censor please.

  2. Janja é uma deslumbrada e vai aproveitar até o fim. Espero que em 2026 o eleitorado seja mais consciente no voto. #ForaLula! #ForaPT!

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