De presidiário a 'dono' do maior partido do Congresso: a volta por cima de Valdemar Costa Neto
Condenado a quase oito anos de prisão no escândalo do mensalão, Valdemar Costa Neto se entregou à Polícia Federal no dia 5 de dezembro de 2013 para cumprir a pena imposta pelo Supremo Tribunal Federal. Naquela mesma tarde, o então líder do PR, deputado Luciano Castro, leu a carta de renúncia de Valdemar – apenas...
Condenado a quase oito anos de prisão no escândalo do mensalão, Valdemar Costa Neto se entregou à Polícia Federal no dia 5 de dezembro de 2013 para cumprir a pena imposta pelo Supremo Tribunal Federal. Naquela mesma tarde, o então líder do PR, deputado Luciano Castro, leu a carta de renúncia de Valdemar – apenas dois deputados acompanharam do plenário o que parecia ser o melancólico fim do mensaleiro. “Certo de que pagarei pelas faltas que já reconheci, reitero que fui condenado por crimes que não cometi”, dizia no texto de despedida, escrito antes de seguir para o presídio da Papuda, nos arredores de Brasília. Pouco mais de oito anos depois, Valdemar Costa Neto deu a volta por cima. Desde a última sexta-feira, o cacique do Centrão é dono do maior partido do Congresso e um dos nomes mais influentes da política nacional.
Após a janela para troca partidária, o PL saltou de 33 para 78 deputados federais. Nos estados, o crescimento também foi expressivo. Na Assembleia Legislativa de São Paulo, a maior do país, o número de deputados estaduais do partido foi de seis para 19. A maioria dos novatos é egressa da União Brasil e do PSL. O aumento de 136% da bancada da Câmara dos Deputados e o fortalecimento dos diretórios regionais ocorreram graças à filiação de Jair Bolsonaro e à perspectiva dos deputados de conquistar benesses governamentais às vésperas das eleições, como repasses de recursos do orçamento secreto. O presidente da República é o grande responsável pela ampliação do PL, mas a sigla segue totalmente sob controle de Valdemar, que exerce poder sobre todos os diretórios regionais e sobre os acordos para a formação de chapas e distribuição de recursos. Nada é fechado sem o aval dele.
“A gente credita a forte migração para o PL ao presidente Jair Bolsonaro. Mas o partido tem um líder que é o Valdemar Costa Neto. Não tem divisão interna, é a ele que a gente obedece”, diz, sem meias palavras, o vice-presidente da sigla, o deputado paulista Capitão Augusto. "O nosso candidato é Bolsonaro, mas a nossa liderança é Valdemar. Ele é um líder muito generoso, um belo de um estrategista político", emenda o parlamentar.
O PL esperava dobrar de tamanho, saltando de 33 para cerca de 65 deputados. A marca de 77 parlamentares surpreendeu até mesmo o próprio Valdemar, que conseguiu atrair políticos das mais variadas siglas – inclusive da esquerda. O gaúcho Marlon Santos migrou do PDT para o PL, assim como Silvia Cristina, de Rondônia, que é feminista e do movimento negro. O PSB, o mais afetado durante a temporada de troca-troca, perdeu quatro deputados para o PL. Até o PSDB, do ex-governador paulista e presidenciável João Doria, teve debandada de deputados federais para o PL: aliado de Aécio Neves, o mineiro Domingos Sávio migrou para a sigla em razão das indefinições entre os tucanos em torno da corrida presidencial.
Todas as negociações com os deputados federais foram conduzidas pessoalmente por Valdemar Costa Neto. Os acordos foram precedidos do tradicional beija-mão, realizado na sede nacional do PL. O escritório fica em um luxuoso edifício de salas comerciais na área central de Brasília, a menos de 4 quilômetros do Congresso Nacional. Após conversas com lideranças regionais, os parlamentares eram então levados até Valdemar para que a filiação fosse sacramentada. No caso dos deputados bolsonaristas, interlocutores do presidente da República, como o senador Flávio Bolsonaro, intermediaram as tratativas.
A expansão sem precedentes do PL gerou ciumeira entre aliados e quase colocou em risco o apoio do Republicanos, ligado à Igreja Universal, ao governo. Para permanecer na base do Planalto depois da saída em massa, a sigla exigiu a filiação de Tarcísio de Freitas, que deixou a Infraestrutura para disputar o governo de São Paulo, e Damares Alves, ex-chefe da Secretaria da Mulher e dos Direitos Humanos.
A União Brasil, sigla que surgiu a partir da fusão entre DEM e PSL, perdeu 24 parlamentares para o PL, quase todos bolsonaristas eleitos com apoio do presidente da República em 2018. A adesão dos parlamentares mais alinhados ao Planalto ocorreu após o naufrágio dos planos de criação da Aliança pelo Brasil – o partido idealizado para ser um ninho de políticos alinhados com Jair Bolsonaro foi lançado em 2019, mas seus entusiastas não conseguiram angariar o número mínimo de assinaturas para criá-lo.
Depois da tentativa frustrada de tomar o comando do PSL, há três anos, os bolsonaristas do PL já sabem que deverão rezar na cartilha de Valdemar. Até por isso, os deputados bolsonaristas trabalham para manter boas relações com o mensaleiro. “O presidente Valdemar tem reputação de não interferir na votação dos deputados. Todos terão autonomia e o nosso grupo, que chegou ao partido para votar com o governo, terá liberdade para isso. É uma coisa pacificada”, garante Loester Trutis, do Mato Grosso do Sul, bolsonarista de carteirinha.
Um dos receios dos deputados leais ao Palácio do Planalto é que Valdemar, depois das eleições, volte a apoiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva caso o petista vença as eleições. A tese é factível, dado o histórico de alianças entre os dois e o fato de que, como típico representante do Centrão, o PL não abre mão de ser governista. “A gente nem considera essa hipótese. Só trabalhamos com o plano de reeleição do presidente Jair Bolsonaro”, desconversa Trutis.
Para as eleições deste ano, o objetivo do PL é eleger uma bancada de pelo menos 70 deputados federais, o equivalente a 15% do total de cadeiras da Câmara. Se conseguir cumprir a ousada meta, o partido pode ter quase 750 milhões de reais para aplicar nas eleições municipais de 2024, a julgar pelos critérios atuais de distribuição dos valores do fundão eleitoral. Com um fundo partidário anual de cerca de 1 bilhão de reais a ser repartido entre todas as agremiações, a legenda teria ainda quase 150 milhões de reais por ano para bancar suas atividades. Ou seja, a conta pode chegar a nada menos que 900 milhões de reais.
Para se ter uma ideia do quanto representa esse montante, ele é cinco vezes maior do que o PL tinha em 2020. Àquela altura, o partido contava com apenas 181 milhões de reais, somados os fundos partidário e eleitoral. E olha que, mesmo com essa cifra menor, Valdemar já se fartava. Como Crusoé mostrou na edição 188, nos últimos anos, ele se beneficiou pessoalmente dos recursos: em apenas três anos, só em salários, embolsou 1 milhão de reais. A agremiação pagou ainda, com recursos públicos, contas de restaurante, hospedagem, carro com motorista e passagens aéreas para o mensaleiro.
O caixa para as eleições deste ano será feito com base nas bancadas eleitas em 2018, ano em que o então PR (após a crise do mensalão, a legenda trocou o nome temporariamente para Partido da República) fez 33 representantes na Câmara. Com isso, o percentual do fundão destinado ao partido será de 6,4%, o que deve render cerca de 313 milhões de reais para serem gastos nas campanhas à Presidência da República, aos governos estaduais, à Câmara dos Deputados e às assembleias legislativas. Lideranças da sigla evitam falar, por ora, dos critérios a serem adotados para repartição do butim.
A presença de Bolsonaro é vista como um fator fundamental para o engajamento de eleitores e para o alcance das metas estipuladas pelo partido. Em 2018, por causa dele, o PSL teve 450 mil votos de legenda em São Paulo. O PL espera ter, agora, 1 milhão de votos de legenda no estado, o suficiente para eleger quatro deputados federais e cinco estaduais. A futura bancada de Valdemar, entretanto, não será automaticamente a bancada de Jair Bolsonaro. Se for reeleito, o presidente terá que renegociar, necessariamente, os termos do acordo. Valdemar será um sócio ainda mais relevante do governo.
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Comentários (10)
Lucia
2022-04-12 21:53:52Um país que tem um ex-presidiário como favorito ao cargo de Presidente nas próximas eleições e que tem um latifundiário comandando o STF não causa espanto a ninguém quando se depara a figuras como Valdemar e tantos outros!
Nildo Jose Formigheri
2022-04-07 09:13:55Muito difícil para mudar comportamento de eleitores ignorantes políticos e fanáticos, mesmo na Alemanha só deram por conta depois do estrago.
Benedicto
2022-04-06 22:06:21Nunca se deixa de perguntar: que país é este? É de amargar!!!!!!
E agora?
2022-04-06 20:03:03Não e a toa que somos uma Bananania!
MARCOS
2022-04-06 18:27:41O que se pode esperar num país que teve um ex-presidente presidiário, vários governadores e políticos corruptos presos. Um país que a corte suprema deveria constitucional mas é política e onde a justiça não atinge poderosos?
Marcos Rezende Souza
2022-04-06 15:44:15Essa é a herança que Bolsonaro nos deixa. Bandidos são bandidos. GENTE DA PIOR ESPÉCIE.
Paulo
2022-04-06 15:12:06Todos são o que são, à luz do dia e sob a penumbra da noite, tanto faz. Hoje, ninguém mais consegue esconder o que é, graças à abundância e facilidade de se conseguir informações. Não há mais tolos entre os eleitores (entre os eleitos, nunca houve). Mas, se hoje tudo, ou quase tudo, acontece sem preocupação com o bem público, a coerência ou mesmo a vergonha, essas coisas "ultrapassadas", havemos que nos voltar para o eleitor, que coloca no poder todo esse estrume, do qual se alimenta depois.
claide reis rocha
2022-04-06 14:23:23Nós brasileiros estamos nas mãos de bandidos...Lula..Bolsonaro..Waldemar da Costa Neto..Eduardo Bolsonaro...todos juntos para destruir o Brasil e nos cobrir de nojo e humilhação.Destroem a educação para manter o povo ignorante e miserável.horror dos horrores. .
claide reis rocha
2022-04-06 14:11:34Cada dia mais escancarado... Bandido cheira bandido...tudo farinha do mesmo saco...enquanto isto o Brasil já está pra lá do fundo do poço...e que foi mesmo que disse que no governo dele não tem corrupto nem corrupçao? Quem??
Míriam
2022-04-06 14:10:11Num país pobre como o nosso é um desaforo com a população esses milhões todos para sustentar essa classe política que nada faz em prol dos eleitores.