‘A nota de R$ 200 é um retrocesso no combate à corrupção’, diz o procurador Júlio Marcelo
A decisão do Conselho Monetário Nacional que autorizou a criação de uma nota de 200 reais pode facilitar o transporte de dinheiro em espécie e favorecer corruptos. A opinião é do procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público de Contas, que critica a ausência de estudos diagnósticos que comprovem a necessidade de uma nova...
A decisão do Conselho Monetário Nacional que autorizou a criação de uma nota de 200 reais pode facilitar o transporte de dinheiro em espécie e favorecer corruptos. A opinião é do procurador Júlio Marcelo de Oliveira, do Ministério Público de Contas, que critica a ausência de estudos diagnósticos que comprovem a necessidade de uma nova cédula de valor alto.
“A União Europeia tinha nota de 500 euros, que foi retirada de circulação, justamente porque favorecia a corrupção e o transporte de dinheiro em espécie para operações ilícitas e espúrias. Isso também pode acontecer aqui”, argumenta o procurador. Confira abaixo a entrevista com Júlio Marcelo.
Qual é a sua avaliação sobre a decisão do Conselho Monetário Nacional de lançar uma nota de 200 reais?
No campo da corrupção, a existência de notas de maior valor facilita o transporte de dinheiro em espécie. Para quem quer evitar a rastreabilidade do dinheiro e receber de forma oculta, é melhor receber um pacote de notas de 200 reais do que de notas de 100 reais, porque ele tem metade do volume e do peso. É muito mais fácil e discreto de transportar. Em vários países, se discute até o fim do papel moeda. No campo do combate à corrupção, a nova nota de 200 reais é um retrocesso.
Como é a política de outros países com relação a notas de valor alto?
A União Europeia tinha nota de 500 euros, que foi retirada de circulação, justamente porque favorecia a corrupção e o transporte de dinheiro em espécie para operações ilícitas e espúrias.
Uma das justificativas do governo é o aumento da circulação de dinheiro em espécie, por conta do pagamento do auxílio emergencial. Esse argumento é plausível?
Essa justificativa parece forçada. O beneficiário do auxílio emergencial usa notas de menor valor, eles precisam de notas de 10, 20, 50 reais. Até a nota de 100 é inconveniente, porque dificulta o troco em pequenas compras. As grandes notas são um problema para pequenos negócios. Essa não é uma justificativa plausível. Até porque o pagamento do auxílio é uma situação transitória, não vamos ter o benefício daqui a alguns meses. Ou, se tiver algum programa, será em valor menor.
O gasto com a produção das notas de 200 reais poderia ser direcionado então a notas de menor valor?
Com certeza, se tem demanda, seria o caso de aumentar notas de 10, 20 ou 50 reais, em vez de criar uma nota de valor maior. A produção e distribuição dessas cédulas pelo território requer uma grande operação e tem um custo alto, que até seria justificável se a necessidade realmente existisse. Mas o que me parece é que não há essa demanda, até porque que estamos em uma realidade de redução da circulação do papel moeda.
O MP de Contas pode questionar a decisão do CMN que criou a nota de 200 reais?
A decisão pode ser avaliada quanto à questão da existência de um diagnóstico prévio. A gente não pode substituir o gestor em um leque de escolhas possíveis, quando há um problema a ser resolvido. Mas houve estudo? Houve um diagnóstico? Isso está aderente aos fatos? Essas questões poderão ser avaliadas, sim, tanto a necessidade da nova nota, quanto a análise dos inconvenientes, como o problema da corrupção, que certamente o governo tem que levar em consideração em qualquer estudo que se faça sobre isso.
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Comentários (10)
Ubirajara
2020-08-02 06:30:27Ñ há justificativa razoável para a criação da nota de 200 reais!
HIPERIDES
2020-08-01 19:06:10Concordo com todas as respostas dadas pelo Procurador Júlio Marcelo e vendo uma decisão sem base lógica por não ter sido antecipada por um diagnóstico, providência indispensável para uma iniciativa dessa natureza acompanhada de vários riscos, além dos elevados custos necessários para sua implementação. Lamentável.
Antonio
2020-08-01 18:28:57senhores uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa...o procurador é reconhecidamente capaz. Seu argumento que $200 é metade de peso e volume ok, que alguma ladroage vai se beneficiar, corresponde...porém comparar 500 euros com 200 reais é irreal, mesmo com os velhos u$100. Não deve desconhecer do "papel" o papel de reserva de valor e a racionalização impressão/trasporte/armazenagem. Quanto a extinção do papel moeda é bom estar atento também a uma série de modificações/riscos .
Max
2020-08-01 17:25:05Concordo plenamente!
ANTONIO
2020-08-01 17:08:35O texto reflete uma verdade. Facilita a corrupção.
ANA
2020-08-01 12:29:27O Procurador é um homem , lúcido , inteligente , sereno e competente! Qualidades ausentes em 90% dos políticos nos membros do judiciário e no executivo encabeçando os 90% o presidente da república.
Elenir
2020-07-31 13:54:55Parabéns, sempre sensato e coerente! 👏🏻👏🏻👏🏻
MARIA
2020-07-31 12:33:20Entrevista de qualidade, digna de O Antagonista. Acompanhei o Dr. Julio no impedimento da Dilma e assisti a live do Vem Pra Rua. Muito bom
Alexandre
2020-07-31 11:38:00"...estamos em uma realidade de redução da circulação do papel moeda". Premissa equivocada do procurador, a demanda por cédulas permanece aumentando ano a ano: https://www.bcb.gov.br/conteudo/home-ptbr/TextosApresentacoes/CAB_Coletiva_29.7.20.pdf
Walter
2020-07-31 11:22:25se o governo decidir acabar com o dinheiro físico, haverá jornalistas e PR do MP com o mesmo argumento.