Ricardo StuckertLula anuncia Paulo Pimenta para a nova Secretaria: viril expoente das magnificências do Governo

Governo, seu lindo

Você é tão maravilhoso que eu não consigo parar de chorar ao contemplar o teu sacro semblante
16.05.24

Eu tenho uma crítica ao Governo. É esta: Governo, seu lindo, você é tão maravilhoso que eu não consigo parar de chorar ao contemplar o teu sacro semblante. Tenho mais uma: caramba, Governo, você não se cansa de ser ótimo, extremamente competente e ágil? Descansa um pouco, Governo, você assim acaba desidratado! E, para arrematar, esta última: toda a solidariedade, todo o amor, todos os óleos santos que você derrama sobre nós ininterruptamente, ó Governo sem par, fazem eu me sentir culpado de não te adorar o tanto que você merece. Vem cá que eu quero lamber as solas dos teus sapatos.

Antes que o amigo se pergunte se quem está escrevendo esta é alguma apresentadora de um desses canais de notícias, apresso-me a esclarecer: sou eu mesmo. Em carne, osso e patriótico senso democrático. Vim ofertar meus pitacos críticos construtivos, obedecendo com rigor aos padrões aceitos pelo ilustríssimo e nada menos que excelente Ministro Paulo Pimenta, ele mesmo viril expoente das magnificências que tão mal gabei. E expressar a esperança de que, ao assim fazer, talvez, ó, talvez eu seja chamado para uma conversa franca, amistosa, esclarecedora e democrática, por algum membro importante do Senado.

Quanto ao Ministro Paulo Pimenta: como já deve ser do conhecimento do amigo, o solerte supracitado representante do povo, feito Ministro da Comunicação Social do Governo, ficou chocado com a canalhice de pessoas que andaram por aí declarando e propagando muitas mentiras – o nome novo das mentiras é fake news, expressão que é usada tanto pro plural quanto pro singular: uma fake news, duas fake news etc. – a respeito de uma suposta ineficiência do Governo, ou de uma suposta demora do Governo para dar bola, no caso da tragédia do Rio Grande do Sul. Tão chocado mesmo ficou o Ministro que deu ordens para que todas as patranhas inventadas pelos antidemocratas fossem imediatamente investigadas e punidas.

(Sabia que se eu chegar para você, amigo, com uma foto da minha avó e lhe disser: “Olha, esta belezinha tem só 19 aninhos”, isto será uma fake news, uma falsa nova? E também, claro, uma notícia falsa? E se você, como eu, não sabe bem o que faz um Ministério da Comunicação Social, atente para o nome: é um Ministério que se comunica com a Sociedade, poxa. “Bom dia, Sociedade, tá precisando de uma mão aí?”, “Esfriou, né, Sociedade?”, “Pois não, Sociedade, é logo ali, duas quadras à direita”, essas coisas democráticas.)

Mas razão assiste ao Ministro, claro, que inclusive foi eleito para isso, para mostrar, com flor ou com pau, que o Governo é bom, sim, senhor. É bom, ou mais que bom, é ótimo e chega de conversa: circulando, vá, circulando. Aliás, sua ação intimorata foi logo seguida pela igualmente intimorata Advocacia-Geral da União, numa ação em forma de ondas concêntricas benéficas e purificadoras.

Quanto ao convite para a conversinha com algum Senador (se bem que Deputado também serve; não estou em posição de ser muito exigente), é que eu soube que o Presidente da Casa Senatorial (tudo sempre em respeitosíssimas maiúsculas), Rodrigo Pacheco, se pôs publicamente à disposição da cantora – sim, cantora – Anitta para esclarecer aí umas coisinhas das quais ela andou reclamando. É uma espécie de corpo-a-corpo da Democracia, se é que o amigo me entende: Democracia olhos-nos-olhos, quero ouvir o que você diz, etc. Ou então é aquilo que chamam de Democracia direta, sei lá. Democracia do vem cá, vamo cunversá.

O fato de eu não ser cantor famoso ou anônimo me desanima para conseguir esse tête-à-tête? (Antes que você pense besteira, amigo, tête é “cabeça” em francês.) De jeito nenhum. O fato de eu não ter subido no palco com a Madonna também conta contra a minha pretensão? Não quero crer. Mesmo feio, anônimo e ruim de papo, tenho esperança de que alguém do baixo-clero me chame prum cafezinho, desses de máquina mesmo, só pra saber se tá tudo bem, se eu tenho alguma ideia de melhoria de alguma coisa, se estou precisando de um par de óculos pro meu pai ou de um de muletas pra minha avó. Democracia direta e tal.

* * *

Também soube que, com relação ao cavalo (ou à égua) ilhado num telhado no Rio Grande do Sul, a situação do bicho abalou o sono – geralmente angelical – do nosso grande timoneiro. Alma sensível está aí. Ainda bem que o Governo agiu logo (como se o Governo não agisse sempre logo, ora essa!) e resgatou o bicho. Porque é um perigo sermos guiados por um homem com o sono atrasado (ainda que santo, ainda que sacrossanto – mas tresnoitado!). E outra: como o amor, cavalos (ou éguas) são importantes, pombas! São aquilo que Camões e Machado de Assis chamavam de pets, e, pois, caros aos corações de seus tutores. Para arrematar: eu soube ainda que a situação das pessoas lá no Sul também chateou nosso líder pra caramba. Foi um combo de tristezas para ele. Felizmente, creio eu, já superado.

 

Orlando Tosetto Jr. é escritor

 

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  1. Adoro suas crônicas. Vamos rir para não explodir de raiva desse desgoverno. E, depois que vi a foto da Janja num "informe publicitário", dentro de um avião com cestas básicas bem afiveladas fiquei com vontade de me tornar uma assassina famosa.

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