Sergio Moro promete “oposição firme” ao PT, sem populismo

Em entrevista para Felipe Moura Brasil, o senador comenta a decisão do TSE que manteve o seu mandato e fala de planos futuros
24.05.24

Após ter o mandato de senador mantido em uma votação unânime do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Sergio Moro prometeu seguir fazendo “oposição firme” ao governo do PT e apoiar um candidato para derrotar o partido nas eleições presidenciais de 2026.

Nesse trabalho, Moro diz que evitará entrar nas fileiras mais radicais da direita. “Sou oposição e sou uma firme oposição, mas quero evitar entrar no populismo do outro lado”, disse ele. “Prefiro, se for o caso, limitar minhas chances na política a alimentar um populismo ou um radicalismo que não interessam a ninguém.”

Em conversa com Felipe Moura Brasil, Moro falou sobre a decisão unânime que o livrou da cassação de mandato. “Eu sempre fui muito cauteloso. O que eu coloquei desde o início era: os fatos, as provas e o Direito então do nosso lado. Eram ações artificiais, que não tinham causa. E tanto o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Paraná como o TSE proferiram julgamentos técnicos, os quais não reconheceram ali quaisquer irregularidades”, disse o senador.

Em relação às acusações sobre sua pré-campanha, Moro repudiou especialmente a menção a gastos com segurança, uma vez que ele incomodava o Primeiro Comando da Capital (PCC) e tinha um histórico de combate à corrupção. Ele também reclamou do fato de o Partido Liberal (PL), ter sido autor de uma das ações, assim como o PT.

Assista à entrevista abaixo ou leia a transcrição na íntegra.

 

 

O senhor tinha confiança nesse processo, que obviamente foi desgastante, e de que o julgamento seria técnico e não político?
Olha foi um longo caminho difícil, sofrido. Sempre evitei fazer prognósticos quanto ao julgamento, tanto em relação ao TRE como ao TSE, não só publicamente, mas mesmo com as pessoas em torno. Porque, no fundo, apesar do zum-zum-zum, da “rádio corredor“, ninguém tem certeza do resultado. Ninguém tem condições de fazer uma previsão que seja absoluta. Então, sempre fui muito cauteloso. O que eu coloquei desde o início era: os fatos, as provas e o Direito então no nosso lado. Eram ações artificiais, não tinham causa. E tanto o TRE do Paraná como TSE proferiram — e eu tenho visto a imprensa se posicionar de maneira unânime quanto a isso — julgamentos técnicos, que não reconheceram ali quaisquer irregularidades. Então, o Direito sempre estava do meu lado, mas a gente nunca sabe como a Corte vai decidir no final.

Como que o senhor avalia sobre a questão central, que é a discussão sobre gastos em pré-campanha?
O que me incomodou muito nessas ações foi, primeiro: não tinha nenhuma caixa 2. Foram todos gastos registrados. Mas, da forma como os autores colocam, de abuso de poder econômico, parece que a gente saiu com uma armadura de ouro na rua. Parece que a gente foi perdulário com dinheiro público, e a gente não foi. Minha campanha não teve nada de extraordinário — aliás, na época da pré-campanha presencial, era uma das mais modestas. Depois, para o Senado, infelizmente as campanhas eleitorais custam caro. Mas também não teve nada de extraordinário. Eram despesas com com internet, com jurídico… e um único fator que realmente ficou mais caro na minha campanha, do que vamos dizer “gastos médios” foi a questão da segurança. Mas havia um motivo muito óbvio. Quantos candidatos no país eram ameaçados pelo PCC? Eu tinha um histórico de combate à corrupção, dentro de um ambiente polarizado. Nesse ponto, realmente os gastos foram superiores ao que seria, talvez, o gasto médio. Mas isso não influencia em nada as eleições. Quando o pessoal tentou me cassar com essa história do gasto de segurança, poxa, eu fiquei…nesse ponto em particular eu levo um pouquinho para o lado pessoal. Porque a meu ver foi uma grande irresponsabilidade deles fazer dessa forma. O ideal seria que tivéssemos regras mais claras dos gastos da pré-campanha. Mas eu vejo também uma dificuldade porque hoje a Justiça Eleitoral entende que o candidato ou o pré-candidato pode participar de evento partidário, participar de eventos públicos. O que ele não pode é pedir voto. Se o que ele não pode é pedir voto, como é que vai definir exatamente o que é pré-campanha e o que não é pré-campanha? Aí por isso, se ele não pede voto na pré-campanha, por que que isso tem que ser computado depois para gastos da campanha? Tem uma série de incoerências na legislação e na jurisprudência, que seria talvez melhor ter uma regulação específica.

A ação foi movida pelo PT e pelo PL. O PT do Lula, obviamente, tem um ressentimento porque o senhor foi juiz da Operação Lava Jato, que atingiu petistas — inclusive o atual presidente da República. Em relação ao PL é uma relação um tanto mais ambígua para dizer o mínimo: o senhor responsabilizou o Paulo Eduardo Martins e o Fernando Giacobo, do PL do Paraná, o pelo recurso feito ao TSE depois da decisão favorável ao senhor no TRE do Paraná. Só que o dono do partido é o Valdemar Costa Neto. O senhor está evitando atrito com ele? Ele próprio veio a público dizer que a direita teria se esquecido das críticas que o senhor fez ao ex-presidente Jair Bolsonaro e, no fundo, quem decide no PL é o Valdemar. Ele não é responsável?
Isso é muito claro. Fiquei contrariado com essa iniciativa do PL desde o início. O PT querer cassar o meu mandato, eu já esperava. Era um segredo de polichinelo, né? A gente sabia que eles iam propor a ação tentando questionar e inventar alguma coisa. Já tinham inventado impugnar a transferência de domicílio na fase lá da campanha. A própria presidente do partido (Gleisi Hoffmann) ficava alardeando aos quatro cantos que eu não poderia ser senador. A meu ver, essa política do ressentimento é ruim para o país, esse revanchismo. O PL, quando propôs, foi uma iniciativa ali do PL local e eu fiquei bastante contrariado — acho que política não se faz desse jeito. Independentemente das divergências, tem o governo Lula que precisa ter uma oposição unida e forte naquilo que tenha pontos convergentes. Desde o início, fiquei contrariado com isso. Depois da sentença do TRE, realmente vi um movimento da bancada do Senado do PL, liderado pelo Rogério Marinho e pelo senador Flávio Bolsonaro, que inclusive falou publicamente, tentando demover a interposição do recurso. Também fui informado e saiu publicado na imprensa que o ex-presidente Jair Bolsonaro fez movimentos fortes nesse sentido — mas, no entanto, o PL manteve a ação. A responsabilidade é daqueles que propuseram a ação, o Paulo Martins, candidato derrotado, e o Fernando Giacobo, presidente do PL Paraná. Em relação ao Valdemar eu não quero entrar nos conflitos internos do PL nacional. Eu me reporto sobre a minha realidade ali dentro do Paraná. 

O senhor saiu do governo Jair Bolsonaro apontando interferência na Polícia Federal. O senhor tinha criticado o então presidente por diversas medidas de afrouxamento da legislação penal, depois até da lei de improbidade administrativa, isso também aconteceu no governo dele… E o senhor voltou a apoiar Jair Bolsonaro para fazer oposição à candidatura do presidente Lula. O senhor disse que não fala com Jair Bolsonaro há algum tempo, mas eu noto que há uma intercessão entre os eleitorados de vocês. É uma questão de estratégia política nesse momento nesses acenos ao ex-presidente Jair Bolsonaro?
Na verdade, quando fui candidato, fui uma terceira via no Paraná. O Lula tinha o candidato dele que, que por incrível que pareça estava apoiando, veladamente, o senador Álvaro Dias. O Bolsonaro tinha o Paulo Martins. Eu fui uma terceira via. Foi uma eleição disputada, difícil. Fui eleito, mas nunca tive o apoio do presidente Bolsonaro na época para minha candidatura. Aí, houve o segundo turno. E aqui digo a minha opinião sincera: eu sei que tem muita gente com muitas divergências e críticas e ao governo Bolsonaro — eu mesmo deixei o governo Bolsonaro em conflito com o presidente. Mas, entre Lula e Bolsonaro, eu não tenho como optar por outra pessoa que não Bolsonaro. No governo Lula — tanto que essa tragédia que a gente está vendo aí. Explosão da dívida pública, de aumento de tributos, de falta de políticas consistentes na segurança pública e em outros setores. Então, apoiei Bolsonaro no segundo turno, deixando as divergências de lado. Nunca disse que os fatos não aconteceram, que eu me retratava. Coloquei minhas divergências de lado para aquilo que eu entendia que era melhor para o país — e eu tinha assumido um compromisso no primeiro turno com o eleitor paranaense de apoiar o Bolsonaro no segundo turno contra o Lula. E eu mantenho a minha palavra com o eleitor paranaense. Fiz assim. Muita gente me criticou, não compreendeu. Respeito essas opiniões. A gente está vendo a tragédia que é hoje esse governo Lula. Se Bolsonaro tivesse sido eleito, nós também teríamos uma posição crítica, a depender do que acontecesse dentro do governo. Desde então, não tenho tido muito contato com o ex-presidente Bolsonaro. Meu foco é fazer oposição ao governo Lula, além de construir e trabalhar nos projetos que eu acredito. O que eu posso te dizer e assegurar é o seguinte: eu serei oposição ao governo Lula até o final deste governo.

Senador, durante o o processo do qual o senhor foi alvo e acabou se livrando, o senhor teve uma reunião com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. O senhor se arrepende de ter se reunido com ele, considerando que ele vazou para a imprensa uma série de declarações que teria feito para o senhor? Mendes parece ter vazado para a imprensa a declaração de que não persegue ninguém — mesmo tendo acionado a PGR contra o senhor por causa de uma piada sobre a brincadeira de prisão em barraquinha de festa junina?
Tenho muita segurança das coisas que eu faço e das coisas que eu fiz. Tenho um grande orgulho do trabalho que fiz na Lava Jato e depois como ministro. Sempre cabem críticas, é evidente, mas eu tenho muita segurança de que a gente agiu corretamente. A gente ouve algumas críticas às vezes e fica chateado até. Mas não é uma coisa que me abale pessoalmente, no sentido de “não tenho uma opinião favorável dessa ou daquela pessoa”. Tenho divergências enormes com o ministro Gilmar Mendes e mantenho a minha posição. Agora vejo o seguinte: o país é prejudicado por esse espírito de revanchismo, de uma guerra de todos contra todos. Tem que fazer oposição assim ao governo Lula porque ele é ruim e as políticas estão totalmente apontando para a deterioração da governança representada pelo enfraquecimento da Lei das Estatais, pelo clima político de desmonte dos mecanismos de prevenção e combate à corrupção. Mas eu não quero levar essas coisas por um lado pessoal, adversarial, e alimentar a polarização radical que, a meu ver, prejudica o país. Fiz um movimento, uma visita ao ministro Gilmar Mendes. O senador Wellington Fagundes gentilmente intermediou esse encontro. Era uma conversa privada. Não vou me sentir confortável, ainda que se tenha vazado do outro lado, em dizer o que respondi ao ministro. Minha convicção, minha segurança nos meus princípios e meus valores no que fiz na Lava Jato permanecem inabaláveis. Não me arrependo. Foi um gesto no sentido de “vamos tentar olhar para frente” e resolver essas situações, sem abdicar daquilo que a gente acredita: os princípios e valores dos meus projetos. Conversar na política é algo normal. Achei que se fez um incêndio em cima desse encontro, mas vejo como algo corriqueiro dentro do mundo político. Conversar com uma pessoa não quer dizer que se está concordando com aquela pessoa, que se está convergindo ou que se quer aprovação daquela pessoa em relação às suas atitudes. A ideia é apenas, assim, distensionar.

É que Gilmar Mendes é ministro do Supremo Tribunal Federal, né? Em tese, ele não estaria no mundo político, mas parece que o senhor insere o Gilmar mente como articulador político…
Não sei se essa é a premissa. Acho que o os tribunais e as Cortes de justiça, em geral, deveriam se afastar totalmente do mundo político, dessas conversas. Talvez seja impossível para um Supremo Tribunal, uma Corte constitucional, se afastar totalmente, mas existe algum alguns desajustes que precisariam ser consertados. Não é do meu interesse ficar numa guerra em relação ao que aconteceu no passado (que eu defendo esse passado e, como disse, tenho orgulho do trabalho que foi feito na operação Lava Jato), mas não é uma guerra que me interessa, o que me interessa é discutir o presente e o futuro.

O senhor é autor de um livro cujo título é Contra o sistema da corrupção e o senhor faz no livro diversas críticas ao poder Judiciário, principalmente ao Supremo Tribunal Federal (STF), em relação a todas as manobras que foram utilizadas para anular processos e condenações na Lava Jato, o que está acontecendo até hoje. Muitas vezes o senhor passa a impressão de que deixou de fazer críticas mais incisivas a ministros de tribunais superiores — agora, por exemplo, no dia da sua vitória no TSE, houve uma leva da impunidade: a decisão do Dias Toffoli de anular todos os atos da Lava Jato contra o Marcelo Odebrecht; a decisão da segunda turma do STF de aliviar José Dirceu; a decisão no STF, a pedido da PGR, de arquivar inquérito sobre Renan Calheiros e Romero Jucá, que havia falado em “acordão nacional, com o Supremo com tudo”… E a gente não vê mais, o senhor fazer críticas em relação a essas decisões. O senhor buscou baixar a temperatura no momento em que estava na berlinda?
Não, não é essa a interpretação. Se a gente for ver o retrospecto, todas as críticas que eu sempre fiz às decisões judiciais do Supremo Tribunal Federal foram respeitosas. Eu não as retiro, mesmo no período que eu era juiz. Eu nunca criticava decisões, por exemplo… Quase a totalidade delas mantinham as minhas sentenças. Naquelas poucas em que havia alguma reforma, eu nunca me pronunciei contrariamente a elas. Não era o meu papel. Depois, como ministro, eu também zelava muito, dentro do Executivo, pelo respeito institucional. Por exemplo, aqui conto algo que me chamou a atenção. Barack Obama foi um presidente muito respeitado nos Estados Unidos, independente do seu viés ideológico. Uma única vez ele criticou a decisão da Suprema Corte americana. Antes de um julgamento, ele se posicionou criticamente porque havia uma possibilidade de revisão daquela lei do Obamacare, e ele se pronunciou de uma maneira um pouco mais contundente. Então, existe uma certa questão institucional, de respeito às atribuições das instituições. Assim como eu não vejo apropriado ministro do Supremo ficar criticando legislação, fora dos autos, que é aprovada no Congresso, ou que vai ser deliberado pelo Congresso o ato do Poder Executivo. Existe uma questão institucional envolvida. Fiz críticas no meu livro. São críticas que não têm nada… não tem um recuo nem nada de berlinda, mas são críticas respeitosas. A anulação da condenação do ex-presidente Lula foi um baita erro judiciário. É assim que eu me pronuncio sobre esse tema no meu mandato de senador. Embora a gente tenha imunidade, de voto e de palavra, tem que ter um respeito institucional que não me impede de falar claramente como tenho falado. Eu ponho minha mão no fogo por tudo que foi feito na Operação Lava Jato. Foi tudo conforme a lei. O que existe, no entanto, no país, é um clima político gerado pelo governo Lula, que é de enfraquecimento da prevenção e do combate à corrupção e que acaba contaminando de certa maneira todo esse cenário. Nós retrocedemos. Estamos retrocedendo. O Lula promoveu o ataque à Lei das Estatais. O Lula tem acabado com a governança das nossas instituições. Isso evidentemente afeta outros atores e outros personagens. Agora: eu posso criticar o Supremo Tribunal Federal, mas é necessário haver manter um respeito institucional.

É função de senador fiscalizar o Supremo Tribunal Federal, quero dizer, é atribuição do Senado. Qual é a sua opinião específica, já que o senhor falou de uma maneira muito genérica, sobre a decisão do Dias Toffoli, que cita inclusive o senhor — porque fala de diálogos entre magistrado e procurador que isso teria sido conluio e portanto misturam-se as funções juiz e de acusação, logo tudo tem que ser anulado contra o Marcelo Odebrecht. O senhor não repudia esse tipo de interpretação, baseado no conteúdo não autenticado de mensagens roubadas sem qualquer tipo de processo a respeito dele?
Na Operação Lava Jato, fui um juiz muito rigoroso, mas ainda assim absolvi mais de 20% dos acusados. O Ministério Público na época fez esse levantamento. Confesso que não tenho o número exato, mas era 24%, 25%. Tiveram decisões minhas em que eu tinha absolvido e o tribunal reverteu para condenar ou aumentou pena, como foi a do próprio ex-presidente Lula. Sem entrar nessas mensagens, quem não foram autenticadas ou reconhecidas, desconheço qualquer mensagem que possa indicar qualquer espécie de conluio relacionado a qualquer acusado e, em especial, em relação a Odebrecht. A Odebrecht tinha um departamento de propina, a gente tem que ser bastante objetivo em relação a isso. É uma empresa que acabou gerando processos criminais e responsabilização em outros países, vários da América Latina, mas também a Odebrecht reconheceu os crimes. Mas veja: o Senado Federal aprovou ano passado a PEC 8/2021, para dar uma racionalidade maior ao funcionamento do Supremo Tribunal Federal, valorizando o colegiado para evitar decisões monocráticas suspendendo leis por vários períodos que não sejam submetidos ao colegiado. Eu voltei a favor. A PEC antidrogas, que foi votada agora recentemente — e havia um certo receio, fundado ou infundado, mas havia um receio na população, de que pudesse haver uma descriminalização do tráfico de drogas ou do porte de drogas para fins de consumo. Num país como o Brasil, em que o crime organizado está incrustrado nesse mercado e isso poderia ter consequências muito negativas, o Senado veio e aprovou a lei de drogas. Então essas são respostas também. Não são respostas agressivas, mas respostas que dentro do limite do trabalho institucional podem ser realizadas — e eu votei a favor dessas medidas. Então o que mais me interessa não é alimentar uma polarização ou uma vitimização de uma instituição. A gente tem sim que fazer a crítica, que no entanto tem que ser uma crítica respeitosa. Mas o que me interessa principalmente é obter resultados aqui dentro do Congresso Nacional o que a gente tem feito dentro do espaço político é avançar em áreas como da Segurança Pública. Avancei com um projeto no Senado que a gente deve votar em breve na CCJ, já foi aprovado em outras casas, para diminuir fraudes dentro do mercado das bolsas de valores. Inspiradas no caso das Lojas Americanas, um programa whistleblower para o mercado de bolsas de valores. A gente tem apontado essas contradições do governo Lula que acabam afetando todo o ambiente político. Agora não vejo como produtivo entrar numa guerra contra as instituições, que às vezes não se alcança o objetivo e não se realiza.

Só para concluir esse tema antes de falar do futuro político: o senhor deu uma declaração elogiando a independência do Poder Judiciário. Se o senhor se referia ao julgamento é que acabou livrando do senhor?
Não, claramente ali eu fiz uma referência quando foi o julgamento do TRE, falei “há juizes em Curitiba” — essa é uma referência histórica, né? Pelo fato que… tem uma história antiga, que diz que é uma lenda no fundo, que não foi isso que aconteceu, mas que o Frederico, O Grande, da Prússia, né, lá no século 18, tinha um moinho nos limites da sua propriedade e ele teria tentado comprar esse moinho do moleiro de Sans-souci. O moleiro tinha se recusado a vender e aí o rei da Prússia, que no fundo era um déspota, mas um déspota esclarecido, sugeriu que ele poderia forçar o moleiro a vender, já que ele era o rei da Prússia e o moleiro utiliza uma frase: “você poderia fazer isso, mas ainda há juízes em Berlim”. Essa é uma lenda aí dentro do mundo jurisdicional e a reforçar a independência do juízo. Quando o TRE decidiu, eu fiz essa referência. Quando o TSE decidiu, também destaquei: o julgamento foi técnico, foi independente, e aí a gente tem que elogiar o Judiciário por essas duas decisões, muito embora podemos ter críticas em relação às outras, como essas que foram aí mencionadas, não é possível não deixar de reconhecer que o julgamento foi técnico e foi independente, tanto do TRE como do TSE.

Só registro aqui de minha parte que o desgaste é tão grande dos tribunais superiores em relação a essa questão da independência que, mesmo quando se julga tecnicamente, se suspeita de que foi pelos motivos errados. Quer dizer, por alguma espécie de articulação política, por exemplo. Como se os tribunais superiores tivessem escolhido a frente da anulação dos atos da Lava Jato tomando essas decisões que favoreceram Dirceu, Romero Jucá, Renan Calheiros e outros e tivesse pisado no freio ali em relação ao senhor e eventualmente até em relação a um senador bolsonarista, o Jorge Seif. Há toda uma análise mais conjuntural nesse sentido.
Acho que nós temos de pensar essas questões um pouco no longo prazo. Como você quer ser lembrado no futuro. Porque nós estamos aqui no momento histórico: como você vai querer ser avaliado? Tem até aquela frase de filme: “O que você faz na vida reverbera na eternidade”. Quero ser lembrado como alguém que combateu a corrupção como juiz, de maneira independente, não como um justiceiro, nem nada (e nunca fui nada disso). Sempre apliquei a lei, e os fatos de corrupção são inegáveis. O que existe, no entanto, é uma tradição de impunidade no Brasil, que volta e que tenta prevalecer. Acho que essa é a contramão da história… Agora, como se constrói e como se supera isso? Tem que ser uma insistência na direção certa, na política certa. Como é que nós resolvemos os problemas das críticas ao poder Judiciário? Nós temos que reforçar a independência do Poder Judiciário e a vinculação do juiz à lei, porque essa é a garantia da liberdade do cidadão: o juízo vinculado à lei, proferindo julgamentos técnicos. Quando esses tribunais proferiram julgamentos técnicos, de aplicação escorreita da lei, eu tenho que evidentemente exarar um elogio. Isso não significa abdicar de críticas em relações a outras decisões.

O senhor foi criticado muitas vezes em relação à sua inabilidade política. No entanto, foi eleito senador e manteve o mandato nesse processo. Acredita que aprendeu a fazer política? Isso é bom?
A vida é um eterno aprendizado. Sempre vou defender aquilo em que eu acredito, que é a integridade da política, combate à corrupção, combate à criminalidade. O diálogo na política é algo inerente à política e, eventualmente, composições igualmente, mas sempre composições republicanas. Nós nunca vamos enveredar para qualquer outra seara, porque aí eu estaria fazendo algo que eu não acredito e comprometendo a minha história. Essas conversas de inabilidade política… olha, eu fui juiz por 22 anos, então a gente claro que tem uma uma carreira que não é exatamente destacada por se ter articulação política. Ao contrário, né? É reprovável ter articulação política quando se é um um juiz. Depois que se vai para a política, pode-se aprender a fazer política, evidentemente envolve esse questão do compromisso com os limites. Porque se você abdica dos seus valores, daquilo que você acredita evidentemente, você está se tornando parte do problema e não da solução para melhorar a qualidade da política.

>Senador, caminhando para o final aqui, falando sobre o futuro da política: o senhor é defendeu eventual candidatura do governador de Goiás Ronaldo Caiado à presidência em 2026, já que ele é do mesmo partido que o senhor, a União Brasil. Seu projeto pessoal é ser governador do Paraná?
Sempre chamei “o” União Brasil, viu? [risos] Então eu fico na dúvida sabe que eu vi no teu celular União Brasil. Fiquei na dúvida aqui…vou fazer uma consulta formal ao presidente do partido.

O partido vai ter que decidir [risos]
O que que imagino para o futuro: estou muito preocupado com o país, porque a gente está vendo descontrole das contas públicas. Veja que isso impacta até na nossa capacidade de enfrentar emergências. Porque a gente sempre pensa num cenário como aquela história do do Titanic. Sempre pensa que vai chegar, que nada vai acontecer, que o mar vai estar calmo e de repente tem um iceberg na sua frente. Cada governo, ele vai pensar num cenário favorável internacionalmente e nacionalmente. Mas ele tem que se preparar para contingências, como foi a pandemia no governo passado, e agora a gente viu essa grave crise no Rio Grande do Sul. O Brasil foi pego despreparado tanto por falta de investimentos adequados em defesa civil e para a prevenção de acidentes, mas também com o caixa do governo estourado do governo federal, o que diminui a sua capacidade para poder enfrentar o desastre. Não só o caixa mas a governança, porque essa destruição da governança que tem sido feita no governo Lula acaba também tornando ineficiente as intervenções necessárias para remediar o desastre ocorrido naquele estado. Estou com muito receio do que pode acontecer com o Brasil. Sei que é um país que tem suas riquezas, é um país forte, que já passou por dificuldades grandes. Mas eu receio que tenhamos em um tempo futuro uma grande recessão, como foi a de 2015 e 2016, não sei se antes se nesse mandato ou em um segundo mandato do presidente Lula. Não creio que nós devemos dobrar a aposta no erro: já foi um erro eleger o Lula de novo e seria um erro muito maior ainda reelegê-lo. Nós temos que apostar em candidaturas e projetos, para 2026. E o União Brasil tem o candidato que é o governador Ronaldo Caiado, que tem se apresentado como pré-candidato legitimamente. Tem fatos positivos para mostrar da gestão dele. Eu não estarei competindo por isso lá em 2026, então quero apoiar um candidato para derrotar o projeto do PT em 2026. Seja com Lula ou com outro porque a agenda petista é ruim para o país. Tem outras possibilidades, né? O governador Tarcísio de Freitas é um nome que se apresenta. O governador Zema é um nome que se apresenta. Evidentemente é claro que, como membro do União Brasil e sem ter essas definições políticas que virá ali à frente, nós temos que dar preferência, também por suas qualidades, ao governador Caiado.

O senhor não respondeu à pergunta sobre o governo do Paraná. O senhor pretende ser candidato?
Ah, desculpe, perdão. Olha, eu vou focar agora… Passei um período difícil, que foi dessas pressões. Embora eu tenha feito o meu trabalho aqui no Senado, mas essas pressões decorrentes dessa ameaça, de vingança no âmbito jurídico, foi uma pressão considerável em cima de mim e da minha família. Sem esquecer que não muito tempo atrás foi descoberto um plano do PCC de sequestro, de ataques à minha família, em um possível plano até de utilizar explosivos no atentado. Tudo isso mexe com a gente. Vou focar mais agora no Senado Federal. Tenho para mim o seguinte: se você produz naquela função, naquele cargo que você se encontra, os resultados vêm. E é possível sim no futuro pensar numa candidatura, mas não é algo que se estabeleça hoje, nesse momento, como algo necessário. O que eu tenho falado é que a gente precisa construir uma fortaleza no Paraná, para impedir que possamos ter aí um duplo desastre que é a reeleição do PT na presidência e ter um governador do PT ou ligado ao PT no estado do Paraná, porque daí é demais, aí provavelmente o Paraná vai para o caminho sem volta de destruição das políticas públicas.

A última pergunta: o senhor, na coletiva, logo após a vitória no TSE, falou contra a polarização, contra o revanchismo. Usou um discurso mais moderado em comparação ao discurso populista, tentando evitar ataques pessoais. O senhor entende que é possível que essa mensagem tenha uma repercussão no eleitorado, diante desses grupos de lado a lado, de Lula e de Jair Bolsonaro, e que é possível construir uma candidatura alternativa ao Lula com um discurso mais pé no chão?
Acredito que sim — mas essa é uma incógnita. Já conheci muita gente, conversei com muitas pessoas que até deixaram o mundo político, com a impressão de que essa polarização acaba afastando o perfil mais técnico, o perfil moderado. Então existe essa tentação, alimentada pela polarização, de que o melhor caminho para ser bem-sucedido, seja fomentá-la e exacerbá-la. E aí você vê cada vez o radicalismo crescendo, que é ruim para o país. Não sei se é um caminho fora do radicalismo, mas independentemente disso não é algo que eu vou alimentar. Não é o meu perfil e acho que isso é ruim é para o país, então eu prefiro, se for o caso, limitar minhas chances na política do que é alimentar é um populismo um radicalismo que não interessa a ninguém. Agora ressalvando, que isso não significa que não serei oposição esse governo Lula. Sou oposição e sou uma firme oposição. Mas eu quero evitar entrar dentro de um populismo do outro lado que no fundo embota o raciocínio e prejudica o futuro do país.

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  1. Parabéns Sérgio Moro! Por enquanto, o mal venceu o bem. Não venceu por nocaute, mas Lula foi solto e uma série de outros bandidos também. Toffoli não sabe o que mais fazer para obter o perdão de Lula por não permiti-lo, quando preso, ir ao funeral do irmão. Toffolli está jogando bilhões de reais que os ladrões corruptos roubaram do povo, no lixo, perdoando dívidas de todos. Quando o Brasil será uma democracia?

  2. Felipe foi incisivo nas perguntas e Moro visivelmente desconfortável na pergunta sobre o Excrementíssimo Gilmar. Também não falou nada sobre as anulações de Bostoffoli

  3. Bravo, Moro. Que todos nos mantenhamos firmes na luta contra a corrupção sempre impune, que corroi as instituições e premia os bandidos mal intencionados, reduzindo as perspectivas do pais se organizar e ser grande e justo.

  4. Parabéns pelas perguntas sinceras, FMB! Quem dera o Brasil tivesse mais homens assim: corajosos e com valores incorruptíveis, no discurso e na prática. Obrigada por falar TUDO, sempre. 🏆🥃

  5. Parabéns pelas perguntas, FMB! O Brasil precisa de homens como o senhor: corajosos e com valores inabaláveis, na prática e no discurso . Obrigada por falar TUDO , sempre. 🏆🥃

  6. Poderia e deveria ter ficado neutro na disputa entre Lula e Bolsonaro, a quem criticou e revelou os desmandos no governo. Para mim ficou claro que agiu por medo. Teria votado nele para presidente, mas hoje não sei se ainda votaria.

  7. Muito boa a entrevista. Acho que foi um bom encontro entre Felipe e Moro. Sinto tristeza somente de saber que o povo brasileiros gosta de populistas, escandalosos, barraqueiros. Isso não dá certo nem para jornalismo (O Antagonista), nem para a Política (Moro).

  8. Parabéns FMB pela incisividade nas perguntas, o que produziu uma excelente entrevista! Torço muito pelo Senador Moro! Um homem corajoso que enfrentou muita gente poderosa e corrupta! Agora que deixou de ser "refém" daquela ação eleitoral absurda , voltará a agir com destemor, impondo-se aos cretinos de plantão.

  9. Concordo em quase tudo que o senador disse, só numa coisa discordo plenamente: apesar de nunca ter votado no Lula em toda a minha vida e, para não deixar que ele (ou seu poste) fosse eleito em 2018, votei em Bolsonaro. Mas, se tivesse que escolher entre as duas piores pragas que o Brasil já teve, ficaria com Lula que já está mesmo com o pé-na-cova. Bolsonaro nunca mais! E quem necessitar de seu apoio para ser eleito não terá o meu voto.

  10. Moro tá aprendendo o jogo. Espero que passe a atuar mais firmemente apontando os exageros e equívocos regularmente praticados pelo executivo e judiciário

  11. Compartilhe esse conteúdo utilizando as ferramentas de compartilhamento oferecidas na página ou pelo link: https://crusoe.com.br/edicoes/316/o-recuo-tatico-de-moraes/. Por mais que Moro tenha cometido erros, e cometeu erros grosseiros, principalmente a adesão ao governo Bolsonaro e a traição contra Álvaro Dias. Por mais que tenha escapado em parte por ter jogado o jogo. Ainda me parece uma pessoa com potencial para voltar a crescer e ajudar a tirar o pais da lama.

    1. Em relação ao Álvaro Dias/ Podemos, acredito que o traído foi o Moro, que largou a segurança em que vivia nos EUA pelo convite p disputa presidencial. O tal convite foi retirado aos 46 minutos do 2º tempo. Restou ao Moro, o Único Brasi.

  12. Felipe forçou, forçou, mas Moro se manteve firme em não fazer críticas para fomentar esta triste polarização que existe no Brasil!!! Parabéns ao Moro 👏👏👏

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