Houthis via YouTube"Ataques piratas podem ocorrer tanto perto da costa, como em alto mar. Mas o grande problema está em alto mar"

Piratas do mundo real continuam sendo uma ameaça global

A atmosfera aventureira e fascinante, perpetuada pelos filmes do capitão Jack Sparrow, deturpa o mundo real
19.04.24

Crescemos ouvindo histórias sobre piratas como se fossem personagens meramente fictícios. Não só isso, também crescemos admirando-os, já que geralmente são retratados nas obras audiovisuais como revolucionários e corajosos. A atmosfera aventureira e fascinante aos olhos humanos criada e perpetuada pelos filmes protagonizados pelo capitão Jack Sparrow deturpa o mundo real, no qual piratas não só existem até hoje, como também são uma das maiores ameaças ao bom desenvolvimento do comércio internacional. A pirataria marítima é uma ameaça global e tem se agravado nos últimos anos; por isso, precisamos falar sobre ela.

Cerca de 80% do comércio internacional é operacionalizado via transporte marítimo. Isto se dá por inúmeros fatores, mas algumas vantagens econômicas do modal marítimo se sobressaem em comparação a outros modais: menor custo operacional; maior eficiência, especialmente no transporte de grandes volumes; eficiência energética; menores índices de acidentes; e menor custo de frete. Contudo, para todo “pró” existe o seu “contra” e a pirataria marítima é tão antiga quanto a navegação marítima comercial em si, apesar de pouco conhecida e debatida. Sendo assim, é preciso entender em que termos, contextos e locais acontecem os ataques piratas na atualidade.

O principal documento internacional que regulamenta o uso do mar é a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, ratificada pelo Brasil em 1988. A CNUDM define o que é a pirataria enumerando várias hipóteses, dentre as quais destacarei “ato ilícito de violência ou de detenção ou todo ato de depredação cometidos, para fins privados, pela tripulação ou pelos passageiros de um navio ou de uma aeronave privados, e dirigidos contra um navio ou uma aeronave em alto mar ou pessoas ou bens a bordo dos mesmos ou um navio ou uma aeronave, pessoas ou bens em lugar não submetido à jurisdição de algum Estado“. Ataques piratas podem ocorrer tanto perto da costa, como em alto mar. Mas o grande problema está em alto mar.

Apesar de ser um só, o mar é juridicamente todo dividido. Grande parte da faixa marítima que se estende pela costa de um país estará subordinada às leis deste país. Sendo assim, grande porcentagem da superfície oceânica chamamos de alto-mar, aquela que não está submetida a jurisdição de nenhum país, o que torna mais dificultosa a fiscalização e a regulamentação. Se um crime ocorre em uma embarcação em águas sob a jurisdição de um país, esse crime será investigado e judicializado de acordo com as leis desse país.

As rotas marítimas do comércio internacional, por óbvio, atravessam áreas de alto-mar. São áreas extremamente vulneráveis onde as embarcações costumam ficar suscetíveis a ataques de piratas. Contudo, algumas áreas costeiras se destacam e existem algumas regiões que são consideradas de altíssimo risco, como, por exemplo, o Golfo de Áden e a costa da Somália. A costa da Somália é uma preocupação global antiga da marinha mercante quanto à pirataria, pois é um dos lugares mais perigosos graças à situação geopolítica local – guerra civil, corrupção, catástrofes etc. Entre as atividades dos piratas, destacam-se roubos de navios e cargas, assaltos a mão armada e sequestro da tripulação.

Segundo matéria de fevereiro de 2024 da CNBC, a pirataria está aumentando nas principais rotas marítimas do mundo. Segundo o relatório anual sobre pirataria e assaltos à mão armada do Bureau Marítimo Internacional (IMB) da Câmara de Comércio Internacional (ICC), houve um aumento das ameaças à segurança das tripulações, tendo o número de tripulações feitas reféns aumentado de 41 para 73 em 2023 e o de tripulações raptadas de 2 para 14. Neste ano, os ataques piratas superaram os de qualquer outro momento dos últimos seis anos no Chifre da África, de acordo com o Royal United Services Institute (Rusi).

O que está em jogo é o comércio internacional, é o transporte de mercadorias, de alimentos. A questão da pirataria deve ser endereçada, principalmente, por meio da cooperação internacional, princípio básico do Direito Internacional, junto aos órgãos voltados para isso, com destaque a Organização Marítima Internacional, e junto às próprias empresas de navegação. Os EUA aprovaram, em fevereiro, a venda de 4 bilhões de dólares em drones e equipamento militar à Índia para segurança e vigilância marítima. Isso reforça a adoção de medidas estratégicas e tecnológicas de prevenção e repressão, compreendendo as particularidades da pirataria moderna.

 

Letícia Barros é advogada, empreendedora e vice-presidente do LOLA Brasil. 

 

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  1. Elon Musk financiando viagens intergaláticas e no mar ainda assistimos essa pirataria crescente. Que mundinho de ações desencontradas estamos vivendo!!

  2. A pirataria somali tinha perdido força nos últimos anos pelo investimento em segurança por parte das potências mundiais, mas o perigo dos Houthis, associado a redução da operação dos piratas, fez cair o número de navios de guerra, pelo que a pirataria regressou. Enquanto a Somália não tiver um governo estável e democrático não haverá solução para o problema que não passe pela vigilância armada constante das rotas comerciais

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