Foto: Ricardo Stuckert/PRXi Jinping com Lula: mundo vive uma “Segunda Guerra Fria” entre EUA e China

O Brasil em meio ao fogo cruzado

Em um momento em que a tensão entre países ricos e a China volta a escalar, o governo brasileiro realiza visita turística ao país asiático
20.04.23

Intitulado O Paradoxo Argentino, um estudo publicado pelos economistas de Harvard Rafael Di Tella e Ingrid Vogel busca compreender “o que deu errado” com a Argentina.

Considerada uma das nações mais ricas do mundo no final do século 19, a Argentina gozava de bons índices em educação, para além de uma abundância de recursos naturais. Ainda assim, o país acabou se tornando um exemplo único no mundo: uma nação desenvolvida que involuiu para uma país subdesenvolvido.

Dentre as teses de ambos, além do populismo, está a análise de que por possuir uma abundância de terras, as empresas agrícolas argentinas tornaram-se atrasadas em investimentos de capital.

No início dos anos 1890, empresas agrícolas no país sul-americano possuíam em média 25% do capital por trabalhador de seus pares em Chicago, principal centro agrícola dos EUA no período.

Essa relação é importante, uma vez que aponta um fator crucial em desenvolvimento: a produtividade.

De forma simplificada: quanto maior o capital por trabalhador (máquinas e equipamentos), maior será a riqueza produzida por cada indivíduo.

Na soma geral, este fator é crucial para se atingir o chamado efeito catch-up, segundo o qual países pobres tendem a alcançar os países ricos no longo prazo.

Na metade do século 20, passamos a incorporar o chamado capital humano na conta. E já nos anos 80, o economista Robert Lucas notou o que se tornaria o “paradoxo de Lucas”. Apesar de parecer óbvio que empresas em países ricos busquem produzir em países pobres dada as altas margens de lucro, aquele  efeito não necessariamente ocorria na realidade.

Barreiras protecionistas criadas por países pobres estão entre as causas desse impeditivo. Importar máquinas em um país como o Brasil está sujeito a pesados impostos de importação, tudo para proteger nossa indústria nacional.

Mas, apesar do ceticismo de economistas modernos em relação a esse processo, há bons casos de países que conseguiram diminuir a diferença entre suas economias e a de países ricos.

Em comum, esses países têm o fato de entrarem para o jogo do comércio internacional por meio de uma dinâmica simples: importam capital físico e exportam capital humano. Ou seja: importam recursos para construir fábricas e exportam produtos produzidos por sua mão de obra, seja pelo baixo custo, ou pela especialização.

A maior parte dos países dentre os que obtiveram sucesso nessa empreitada está situada na Ásia. Da Coreia do Sul aos tigres asiáticos, passando pela China.

Ao contrário do Brasil, a Coreia do Sul tornou-se bem sucedida ao organizar subsídios e políticas públicas de industrialização com foco em exportações. Empresas sul-coreanas passaram a receber apoio na medida em que comprovaram na prática que podiam produzir produtos tão bons que ganhariam espaço no mercado de países ricos.

Este foi o caso da Samsung, Hyundai e LG, por exemplo.

Na China, a abertura comercial foi ainda mais orientada sob uma perspectiva de planejamento central. Como outros países comunistas, o gigante asiático passou a orientar suas metas sob os famosos Planos Quinquenais. Por meio deles, o governo escolhe setores a serem beneficiados.

O resultado é que, a exemplo da União Soviética, a China foi bastante bem sucedida em atingir o desenvolvimento industrial do ocidente.

Ao contrário dos soviéticos, porém, a China parece estar lidando bem com a outra parte do desenvolvimento econômico.

Em suma, não basta apenas copiar as indústrias já existentes no ocidente, como fez Stalin em seu massivo projeto de desenvolvimento que levou uma economia feudal a rivalizar com potências industriais. É preciso dominar o desenvolvimento de tecnologias.

E é este processo, no qual a China está hoje, que parece assustar países ocidentais.

Um estudo recente realizado pelo Australian Strategic Policy Institute (ASPI), apontou que o país asiático lidera globalmente em 37 dos 44 principais ramos de pesquisa da atualidade. Os demais 7 são liderados pelos EUA.

Também segundo a ASPI, em determinados assuntos, a China possui 10 entre as 10 maiores instituições de pesquisa.

É possível que a China se torne monopolista em cerca de 10 áreas, incluindo biologia sintética, 5G, baterias elétricas e nano manufatura.

O país lidera, ou está em segundo lugar em praticamente todos os 44 ramos, incluindo ainda Inteligência Artificial, biotecnologia e computação quântica.

O resultado? No mínimo um sinal amarelo para os países ricos.

Para a Europa, isso pode significar uma dependência que sujeite o continente a chantagens, algo similar ao que ocorreu em relação à dependência energética russa.

A China é responsável hoje por 90% dos painéis solares produzidos no mundo, sendo essa tecnologia crucial na transição energética europeia e global (em especial após pressão de ambientalistas pelo abandono da energia nuclear).

E essa discussão tornou-se ainda mais problemática quando, em visita à China, o presidente francês Emmanuel Macron sugeriu que a Europa deveria “evitar crises que não são suas”.

A fala de Macron explícita um erro americano, reforçado pelo recente IRA, o Ato de Redução da Inflação.

Na busca por se manter à frente como potência global, os EUA reforçaram um viés protecionista em áreas cruciais, pouco abertos a incluir os principais aliados.

O resultado, ao menos até o momento, é o isolamento de países “menores”, como Austrália, Canadá e Japão. Potências econômicas mas não ligadas a um grande bloco como a União Europeia.

Com os EUA tornando-se uma potência acuada e voltando a um período de focar apenas internamente (como ocorria até a segunda guerra), veremos um vácuo de poder.

Para o Brasil, o resultado não é nada animador, apesar da empolgação do atual governo com as relações com a China.

Um estudo realizado pelo FMI apontou que o custo de “desacoplar” da economia chinesa poderia chegar a 7% do PIB global.

Uma recessão global e instabilidade de preços em setores como energia, acabaria por impactar as terras tupiniquins, como já vimos em casos recentes.

Como um país emergente, com problemas internos (como a demografia), o Brasil acabará sendo afetado nessa guerra comercial (que torçamos para que fique apenas neste campo), independente do quanto a propaganda política possa sugerir ganhos na amizade com o país asiático.

 

Felippe Hermes é jornalista

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  1. O Brasil está ferrado. Seu último ativo de montra, a mão de obra, está se esvaindo em taxas de fertilidade mais baixas e população envelhecida. País corrupto, pobre, população envelhecida, indústria frágil, mercado fechado e recursos naturais esgotaveis fará um futuro insuportável

  2. Com os ptralhas baluartes do atraso e d autocracia no poder, comandados pelo deslumbrado Descondenado, nosso país vai se afastando dos parceiros ocidentais e levaremos alguns anos para recuperar o terreno arrasado por essa escumalha.

  3. A China logo será a maior economia do mundo nenhuma dúvida mas os EUA por muitos anos será o líder político do mundo e não precisamos nos indispor com nenhum deles nosso primeiro e segundo maior parceiro comercial mas a ignorante megalomania e esquizofrenia de um de um idiota ungido por ignorantes nos darão quatro anos de atraso isto se não formos salvos acreditem pelo Chuchu a esta altura um mal infinitamnete menor ... piedade senhor Zeus dos idiotas !!!

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