Avener Prado/FolhapressKassab: "Partido não tem tradição de fechar questão"

O animal político

Saiba como Gilberto Kassab virou o principal conselheiro de Tarcísio de Freitas em SP, emplacou três ministros no governo Lula e ainda reelegeu o presidente do Senado
10.02.23

No início de março de 2022, quando ficou claro que Rodrigo Pacheco — assim como qualquer outro candidato de terceira via — não decolaria na disputa pela Presidência da República; Gilberto Kassab, presidente do PSD, ligou para várias lideranças da legenda. Em uma decisão coletiva, que abarcava os interesses regionais de cada uma, decidiu-se que o partido ficaria neutro na campanha mais polarizada da história. Mas não em cima do muro. Cada integrante poderia optar por apoiar Lula ou Jair Bolsonaro, ou nenhum dos dois. Na Bahia, o senador Otto Alencar, um dos caciques da legenda e destaque na CPI da Covid, reeditaria a aliança bem-sucedida com o PT, garantindo mais um mandato e a eleição de seis deputados. Em São Paulo, o próprio Kassab emplacaria Felício Ramuth como vice na chapa do bolsonarista Tarcísio de Freitas, após um longo namoro político iniciado, seis meses antes, numa visita do ex-ministro da Infraestrutura ao amplo apartamento onde o ex-prefeito vive na capital paulista.

Quem viu Kassab anunciar no início do mês a filiação de Mara Gabrilli e Eliziane Gama ao PSD também não imagina que a costura levou tempo. No caso da ex-integrantes do Cidadania, as conversas se iniciaram 1 ano antes. Com a agora ex-tucana, a relação começou ainda na primeira disputa pela vereança nos tempos do PSDB e virou uma amizade. O encolhimento do ninho tucano acabou forçando a troca de partido. Na antiga legenda de Gabrilli, sobraram três senadores. Já o PSD virou a maior bancada do Senado, com 16 membros, e ainda manteve o comando da Casa, com Pacheco. Tem também uma das maiores bancadas da Câmara (43 deputados), dois governos estaduais (SP e PR) e prefeituras de importantes capitais.

Não se trata apenas de quantidade. Pacheco é o terceiro na linha sucessória da Presidência e tem o controle sobre a pauta do Congresso. Outros nomes do partido estão estrategicamente posicionados no governo federal — Carlos Fávaro na Agricultura, Alexandre Silveira em Minas e Energia e André de Paula na Pesca. No governo de São Paulo, o próprio Kassab comanda a Secretaria de Governo. Boa parte dessa performance é resultado de uma combinação rara de instinto político com dedicação, capacidade de diálogo e paciência. O presidente do PSD, que concedeu entrevista exclusiva a Crusoé em parceria com o podcast CDTalks, vive na política e para a política, raramente é visto em passeios frugais ou viagens de lazer. É fácil, porém, encontrá-lo em jantares de trabalho, especialmente no eixo São Paulo-Brasília.

Apesar do poder de que dispõe, Kassab se mantém acessível, inclusive para a imprensa, cujas publicações acompanha obsessivamente. O político também é obsessivo quando se trata de negociar para obter consensos. Assim são tomadas as decisões na cúpula da legenda, o que também garante o alto desempenho partidário. “O importante na vida pública é que tudo seja feito com transparência e de forma coletiva, o que envolve todo o partido”, diz. Quando questionado sobre os resultados eleitorais de 2022, repisa: “Foi um trabalho partidário, feito com muita seriedade.” 

A autonomia desfrutada pelos parlamentares do PSD tem sua explicação na formação do partido. Quando ainda era integrante do DEM — o antigo PFL que fez ferrenha oposição aos governos petistas de Lula e Dilma Rousseff —, o político se desentendeu com Rodrigo Maia. Kassab queria se aproximar do governo de Dilma Rousseff, mas enfrentava resistência. A oportunidade surgiu quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que parlamentares que mudam de partido devem perder o mandato, salvo quando satisfazem algumas condições, como quando são incorporados a um novo partido, recém-criado. A regra se tornou um estímulo para que deputados e senadores que estavam insatisfeitos migrassem para o PSD, fundado em 2011. O novo partido, assim, se constituiria uma salada ideológica com políticos de diversas correntes.

À época, Kassab chegou a declarar que o PSD não seria nem ‘de direita, de esquerda ou centro’. Além de 17 deputados federais do DEM, o PSD incorporou gente do PPS, PR, PMDB, PV, PSC, PMN, PSDB, PCdoB e PT, além de outros partidos. Nos anos seguintes, o partido ainda seria beneficiado por decisões da Justiça que permitiram ao partido novato ganhar verbas do fundo partidário e minutos no horário gratuito de propaganda eleitoral, o que lhe garantiu bons resultados nas disputas por prefeituras e ao Congresso nos anos seguintes. “Essa formação heterogênea sinalizou como seria o PSD dali em diante. O partido acabou reproduzindo a estrutura do MDB, um partido aberto para correntes diferentes e com flexibilidade para se acomodar com diferentes perfis de governos no âmbito federal e estadual”, explica o cientista político Ricardo Mendes Ribeiro, da MCM Consultores e que fez um estudo sobre o PSD, que, segundo o próprio Kassab, “não tem tradição de fechar questão” — termo usado para a definição de posicionamento do partido em votações. “Até hoje nunca fechamos uma questão“, diz.

Com tamanho e sem ideologia, o PSD se tornou um aliado desejável por todos, principalmente dos governos de turno. Em 2013, quando a polarização no Brasil era entre PT e PSDB, Guilherme Afif Domingos, um dos principais quadros do PSD e padrinho político de Kassab, era vice-governador de São Paulo, ao lado do tucano Geraldo Alckmin. Mesmo assim, assumiu o cargo de ministro da Secretaria das Micro e Pequenas Empresas, no governo de Dilma. Também no governo de Dilma Rousseff, Kassab foi empossado como ministro das Cidades. “Foi uma estreia impactante. Essa é uma pasta muito cobiçada pela elite política, porque tem um grande poder de alocar recursos que depois se convertem em votos”, diz o cientista político Paulo Franz, pesquisador da Universidade Federal do Paraná. Mesmo com o governo Dilma empurrando o país em uma de suas piores crises econômicas e o processo de impeachment avançando, o PSD foi um dos últimos partidos a abandonar o barco. Kassab só entregou sua carta de demissão dois dias antes da votação do impeachment na Câmara, em abril de 2016. Em maio, após a posse de Michel Temer, que até hoje é xingado de traidor pelos petistas, Kassab foi nomeado ministro de Ciência e Tecnologia do novo governo. É um giro que poucos políticos no Brasil seriam capazes de executar.

Para poder circular por todos os governos sem ser captado pelo radar da opinião pública, Kassab evita holofotes e deixou de concorrer a cargos eletivos desde que saiu da Prefeitura de São Paulo. É um antipopulista convicto, usa redes sociais com parcimônia e nunca entra em discussões públicas, muito menos ideológicas. Um trunfo nos dias atuais. Reconhecido no meio político por sua capacidade de antever movimentos importantes e fazer as apostas certas, como a parceria com Tarcísio, lhe renderam adjetivos como o de “raposa” ou “coruja”. Na entrevista, cuja íntegra vai ao ar no domingo, disse que sua “intuição” aponta para a tentativa de Lula tentar uma reeleição (o petista é um interlocutor frequente). Talvez, por isso, recomende ao atual governador de São Paulo que se dedique a governar bem para buscar um segundo mandato em 2026. Ele é um autêntico político profissional. No Parlamento britânico, existem vários como ele. Mas no Brasil ele reina quase sozinho nesse ramo”, avalia Paulo Franz. Para circular a salvo na fauna política dos nossos trópicos, é preciso compreender quem está no topo da cadeia alimentar.

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  1. O tal PSD não é um partido político mas um bando fisiologista que tantos males fez e ainda fará ao país é quanto ao sr. Kassab não é presidente mas um capo.

  2. Animal Político: Tanto Lulu como Bozo são animais políticos de estimação do Kremlin. O Kibe está mais para predador do tipo hiena, hiena-das-cavernas uma espécie que se achava extinta predominante carnívora. Predador político das trevas noturnas, cavernoso, Corcuta Cavae Tenebrosus Lobbium.

    1. O Kibe não tem ideologia. É um predador oportunista, seja Democracia ou Ditadura Comunista estaria confortável com as presas

  3. Quem não respeitar a capacidade do Kassab, já sabe. Talvez a bagunça no país seja exatamente pelos partidos não terem raiz ideológica. Me lembram as algas no fundo do mar. Pra lá e para cá. Só que as algas tem raízes.

    1. …e cores, sabores, venenos e drogas que curam. Esse é inodoro. E, por se-lo, perigosamente venenoso. Tranqueira politica incrivelmente estimulada (e autorizada para ser dono do PSD) por Dilma.

  4. Kassab é extremamente danoso à nossa democracia: político profissional sem qualquer comprometimento com o país nem possuidor de qualquer projeto para o mesmo, apenas lhe interessando crescer o partido e espalhar raízes na estrutura de poder, parasitando tudo e gerando nada.

  5. Realmente é um animal politico sem compromisso com nada, nem com cidadania. Só com o poder. É umTancredo Neves ressucitado (tao sortudo que morreu antes que soubéssemos que era). Texto laudatório que não enriquece os antagonistas. Ao contrário.

  6. Paradiando o grande mágico maluco beleza pernambucano, autor da música Papagaio do Fututro: - Kassab sabe, quem não sabe, sobra.

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