Divulgação/BBCFabián Gutiérrez, que foi assassinado em Santa Cruz: de secretário de Cristina a milionário com 36 propriedades

Mais um corpo

O assassinato do ex-secretário pessoal de Cristina Kirchner inaugura mais uma rumorosa disputa de narrativas e revela uma afoita caça ao tesouro da corrupção argentina
10.07.20

O corpo do promotor argentino Alberto Nisman, de 51 anos, foi encontrado estendido no banheiro de seu apartamento no bairro de Puerto Madero, em Buenos Aires, em janeiro de 2015. Ele estava em uma poça de sangue e com uma pistola ao lado. Em menos de doze horas, Cristina Kirchner, então presidente, insinuou que se tratava de um suicídio. Autópsias feitas posteriormente revelaram que o tiro foi dado na nuca e que Nisman estava ajoelhado, o que dificilmente se encaixaria na tese de suicídio. A desconfiança em relação a Cristina foi inevitável. No dia seguinte, Nisman iria apresentar uma denúncia contra a presidente no Congresso. Cinco anos depois, o caso continua sem solução.

Na última semana, outro crime deflagrou uma guerra de narrativas na Argentina e gerou suspeitas sobre a agora vice-presidente do país. No sábado, 4, a polícia encontrou o corpo de Fabián Gutiérrez, um ex-secretário de Cristina, na cidade de El Calafate, província de Santa Cruz, na Patagônia argentina. Ele estava parcialmente coberto por terra. A autópsia revelou que Gutiérrez sofreu cortes no pescoço, golpes na cabeça e morreu asfixiado por enforcamento. Ele trabalhou como secretário pessoal e motorista de Cristina quando ela foi primeira-dama e, depois, presidente. Depois de ser preso em 2017, por lavagem de dinheiro, virou delator na causa que investiga o envio de sacolas cheias de dinheiro para cofres do casal Néstor e Cristina Kirchner na Patagônia.

No dia em que o corpo foi encontrado, deputados opositores publicaram um comunicado dizendo que se tratava de um crime “da maior gravidade institucional”. Também solicitaram que familiares da vice-presidente fossem afastados do processo. Cristina é tia da promotora do caso, Natalia Mercado. O presidente Alberto Fernández retrucou as acusações da oposição, dizendo que envolver Cristina na morte era uma canalhice. O advogado da mãe de Gutiérrez disse prontamente que a morte nada tinha a ver com a vice-presidente.

Reprodução/redes sociaisReprodução/redes sociaisCristina Kirchner: a promotora do caso é sobrinha da vice-presidente
Como delator, em 2018, Gutiérrez afirmou que ele e os secretários apelidaram a chefe de “louca” e “égua”, porque “ninguém queria trabalhar com ela”. Disse ainda que alguns funcionários acompanhavam o casal presidencial em voos frequentes para a Patagônia, carregando sacolas, algumas com cadeado. Ao chegar às casas dos Kirchner, em El Calafate e Rio Gallegos, os assistentes tinham de se afastar do imóvel por uma hora. “Em El Calafate, existia um lugar descendo a escada onde havia uma porta branca fechada. Sempre dizíamos que ali era onde eles guardavam as sacolas. Era o único lugar da casa a que eu não tinha acesso”, contou. Na casa de Rio Gallegos, segundo ele, o procedimento se repetia.

Histórias como essa, de sacolas de dinheiro voando para a província de Santa Cruz, despertaram a cobiça de criminosos locais nos últimos anos. Esses caçadores de tesouro passaram a sonhar não apenas com a fortuna escondida dos Kirchner, como também dos empreiteiros e secretários próximos à Casa Rosada. Em 2016, Roberto Néstor, também ex-secretário de Cristina, foi sequestrado por criminosos que pediam o dinheiro da corrupção, que estaria guardado em um galpão. Três dias depois, outro ex-secretário de Cristina, Daniel Álvarez, teve a casa de seus pais assaltada por três ladrões armados.

As propriedades do empreiteiro Lázaro Báez, acusado de ter lavado 60 milhões de dólares, são as que mais mexem com a imaginação dos ladrões. Em agosto de 2016, quatro homens entraram em um sítio do milionári ligado a Cristina. Deram várias marretadas nas paredes. A incursão restou infrutífera. Em um prédio da Austral Construções, de Báez, os ladrões chegaram com uma clava gigante e abriram um buraco entre os tijolos.

ReproduçãoReproduçãoFacundo Zaeta, um dos quatro criminosos: a vítima foi torturada
Com o avanço da investigação, a hipótese de que o assassinato teve motivo econômico, e não político, tem avançado. Em primeiro lugar, Gutiérrez já tinha contado na Justiça tudo o que sabia, ao contrário de Nisman, que ainda tinha uma denúncia por fazer. “O assassinato de Gutiérrez não muda em nada o processo sobre corrupção na Justiça”, diz o cientista político argentino Guillermo Rodríguez.

O amadorismo dos criminosos, todos entre 19 e 23 anos, também afasta a possibilidade de que eles sejam mercenários pagos para realizar o serviço. Quatro jovens foram detidos na operação policial. Um deles morava na casa em que o corpo foi encontrado e confessou o crime. Foram encontrados com eles uma televisão, um aparelho de som e outros objetos roubados da casa de Gutiérrez. Os advogados dos detidos afirmam que eles não foram movidos pela política, e sim pela intenção de praticar roubo.

O fato de o ex-secretário de Cristina ter sido torturado, contudo, pode indicar que os criminosos estavam em busca de algo mais. Facundo e Agustín Zaeta, dois irmãos que participaram do crime, são netos de um escrivão que realizou operações imobiliárias para os Kirchner. “Mesmo que o crime não tenha uma motivação política, é claro que não se pode tirar a política da história. Gutiérrez não teria se tornado milionário se não tivesse sido funcionário dos Kirchner”, diz o advogado argentino Luis María Palma, presidente da Associação Internacional para a Administração de Tribunais. Na causa em que foi acusado de lavagem de dinheiro, Gutiérrez teve 900 milhões de pesos embargados, o equivalente a 67 milhões de reais. A Justiça identificou que ele tinha 36 propriedades, 35 carros de luxo e três embarcações.

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  1. Na Argentina como é aqui o veio esquerdista não vacila em silenciar para sempre aqueles que porventura ousam cruzar a sua trajetória. Celso Daniel começou a saga!

  2. Essa é a grande companheira de Lula e sua quadrilha... leia-se Partido dos Trabalhadores - PT.... Há gente ainda que acha que o PT deve ser perdoado pelos seus maus feitos negados e nunca assumidos... Perdoar quem não se arrepende com provas de devolução e desapego, é como assinar um cheque em branco, para mais falcatruas caso haja o perdão e o retorno.... O Brasil tem que avançar na punição completa dos seus mau feitores. Não há como ser complacente com quem não valoriza a coisa pública...

    1. Realmente, José, você está certo. Espero que o Marco aceite seu comentário com civilidade. Afinal, ninguém sabe tudo mesmo. Por outro lado, vale muito o respeito ao idioma nacional...

    2. Escreva "mal feitos". "Mal" opõe-se a "bem". "Mau" opõe-se "bom". Ex: mal feito, bem feito...........mau sujeito, bom sujeito.

  3. Tenho maior aprecio pelo trabalho realizado pelo promotor Nisman e nenhuma dúvida sobre as diversas culpas de Cristina Kirchner. Contudo, depois de assistir por 2 vezes a série documentário da Netflix, decidi ler mais sobre o atentado contra a sede da AMIA em Buenos Aires que fara 26 anos neste 18 de julho. Li diversos livros em espanhol sobre estes fatos e devo dizer não ter mais tanta certeza sobre o promotor ter sido assassinado. A perícia à qual o artigo se refere é muito controversa.

  4. Problemas da América Latrina. Pelo menos a política dos hermanos é mais emocionante, vez ou outra alguém mata alguém...

    1. No Brasil é pior!! É só lembrar dos casos do Celso Daniel, do prefeito de Campinas, e muitos outros. Toda semelhança é mera coincidência.... dirão

  5. Saqueadores comuns tentam saquear acusados de corrupção hiperbólica - que retrato triste da degradação da Argentina sob o peronismo.

  6. A culpa dessa corrupção é do povo Argentino que comete sempre o mesmo erro. Eles já conheciam Cristina e sua turma muito tempo

  7. Na falta de boas notícias sobre Trump ou outro ícone da new-right mundial, só resta caçar alguma matéria sobre a esquerda latino-americana nas páginas policiais do Clarín. Não tá fácil, né Duda Teixeira?

  8. O que será que acontece na América do Sul? Por que será que continuamos votando em verdadeiros bandidos, repetidamente? Por que não somos como os Ingleses que não aceitam a corrupção de ninguém, por mínima que seja?

    1. O Brasil foi fundado e formado como colônia de exploração e tendo a escravidão como força de trabalho para extrair as riquezas naturais, pau brasil e ouro principalmente, e mandar para a Europa. Eram proibidas escolas, imprensa, tecelagem ( em MG faziam escondido, dentro de casa).

    2. Tânia. Isso é o que da a falta de informação e vira difamação. Daniel Um nativo da Ilha.

    3. Simples! Infelizmente fomos colonizados pelos Espanhóis/Portugueses com a Igreja Católica dando ordens e não pelo Ingleses!! Basta comparar a situação dos colonizados e tem a resposta!

    4. Os ingleses não aceitam CORRUPÇÃO?? Será??Mas aceitam príncipe pedófilo e o protegem. Com dinheiro dos contribuintes.

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