Ciro Gomes tem razão sobre o 4 de junho
Na entrevista que deu ao Jornal Nacional, Ciro Gomes (foto) disse que, uma vez eleito, não se candidataria à reeleição. O motivo é que, ao almejar um segundo mandato, o presidente da República passa a trabalhar principalmente para isso e se torna refém do Congresso. Nas palavras de Ciro Gomes, “O que destruiu a governança...
Na entrevista que deu ao Jornal Nacional, Ciro Gomes (foto) disse que, uma vez eleito, não se candidataria à reeleição. O motivo é que, ao almejar um segundo mandato, o presidente da República passa a trabalhar principalmente para isso e se torna refém do Congresso. Nas palavras de Ciro Gomes, “O que destruiu a governança política brasileira nesse modelo é a reeleição. O presidente se coloca com medo dos conflitos. O presidente se vende aos grupos picaretas da política, grupos de pouco escrúpulo republicano, porque tem medo de CPI e quer se reeleger. Eu tenho outra relação com a questão moral. Eu me garanto. Eu não sou corrupto. Eu não tenho medo de CPI.”
Na campanha de 2018, Jair Bolsonaro também dizia que não seria candidato à reeleição e que faria de tudo para acabar com essa invenção funesta, que não estava prevista na Constituição de 1988 e saiu da cachola de Fernando Henrique Cardoso. Há quatro anos, pouco antes do segundo turno, ele disse: "O que eu pretendo fazer é uma excelente reforma política, acabando com o instituto da reeleição, que começa comigo caso seja eleito, e reduzindo um pouco, de 15% a 20%, a quantidade de parlamentares". Pois é, recordar é frustrar-se ou indignar-se. Logo depois de eleito, Jair Bolsonaro esqueceu tudo o que havia dito a respeito e começou a trabalhar incontinenti em prol de um segundo mandato. Entregou-se ao Centrão e essa gente ilustre, se pudesse, aumentaria a quantidade de parlamentares, para faturar ainda mais.
Lula, por sua vez, costuma dizer que "sempre" foi contra a reeleição, o que é uma verdade tão imensa quanto a história de que ele não sabia de nada, nunca soube (você sabe do que se está falando).
Em outubro de 2020, eu escrevi nesta Crusoé que uma data não deveria sair da cabeça dos brasileiros. Reproduzo parte do texto:
"A origem dos maiores problemas do Brasil, desde a redemocratização, tem data: 4 de junho de 1997. Não esqueça de vestir luto a cada aniversário dela. Foi quando o Congresso promulgou a emenda constitucional que permite a reeleição:
O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.
Singelíssima, a própria emenda tem um vício de nascimento que seria reproduzido como nunca antes neste país: ela foi comprada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, que almejava ser reeleito a todo custo (e bota custo nisso). O tucano sempre negou a compra de parlamentares, mas a sistematização dessa prática começou com a emenda e foi elevada à condição de arte por Lula — que, na sequência dos seus dois mandatos, criou a figura do poste, igualmente reelegível, o que pode proporcionar um mandato de 16 anos.
A reeleição é o nascedouro dos nossos maiores problemas porque o governante eleito, não importa o sinal ideológico, passa a preocupar-se unicamente com ficar mais quatro anos no poder. Assim, deixa de tomar medidas antipáticas necessárias à nação e passa a trabalhar em regime de dedicação exclusiva para ser reeleito, principalmente a partir do segundo ano de governo. Torna-se candidato com mandato, avançando sobre o Orçamento como se fosse recurso de campanha. As aves de rapina do Congresso, obviamente, cobram um preço elevado por isso. Criam dificuldades para vender facilidades, na forma de obstruções sistemáticas em votações relevantes, CPIs e pedidos de impeachment. Depois de levar o seu quinhão de dinheiro público, aderem. O fisiologismo e o corolário dele, a corrupção, sempre existiram, mas o seu coágulo mortal, o Centrão, só cresceu a ponto de entupir as artérias da democracia graças à emenda que constitucionalizou a reeleição.
Neste momento, portanto, Jair Bolsonaro só pensa em reeleger-se, esquecendo o que afirmou durante a campanha. Lembre a data e vista luto. Obrigado, Fernando Henrique Cardoso."
Ciro Gomes está coberto de razão, portanto, ao dizer que a reeleição destruiu a governança política brasileira. Em 2020, o próprio Fernando Henrique Cardoso reconheceu que errou, depois da publicação do meu artigo (não que eu o tenha influenciado, obviamente, apenas forneço um dado temporal). Todo mundo sabe que a reeleição é um problema, mas quem chega ao Palácio do Planalto começa a fingir que o problema não existe, o que é uma ótima solução para o Centrão.
Recomendo continuar a fazer luto todo 4 de junho. Não existe dia mais funesto para nós que padecemos a política brasileira.
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Comentários (10)
José Joao Tavares Junior
2022-08-27 07:46:59Perfeito.👏👏👏
Anna Maria De Mattos Barretto
2022-08-26 00:46:40Boa lembrança, a reeleição deu início ao desastre. O poder qdo é longo distorce as instituições .
ROGERIO
2022-08-25 19:59:51Bolsonaro talvez teria cumprido sua promessa de por fim à reeleição se o STF não tivesse anulado as condenação de Lula e não existisse o risco do PT voltar ao poder, além, claro, de outros motivos, como o prosseguimento das reformas e das políticas econômicas que foram prejudicadas por 2 anos de pandemia. Mas irá cumprir a promessa num eventual segundo mandato.
Camilo Musetti
2022-08-25 19:30:53Se católico fosse, FHC deveria ser excomungado pelo Papa. Por duas atitudes; A releição e ter nomeado Gilmar Mendes para o STF.
Rita
2022-08-25 14:46:13Reeileicao a dica do momento.Concordo com Ciro porem nao sou seu devoto,O que se observa q que esses que se reelegem nao querem mais sair. Hauma grande espera de muitas pessoas com cultura,,e devotadas a melhoria do pais nao tem chance pois os candidadatos ja estao a afixionados no ganho . dai se torna a sequencia de nada mudar num pais tao decessitado de mudancas,sera que o Ciro fara o que esta se mostrando eficiente,sera uma boa no momento que que ele de sua promessa , o PAIS PRECISA URGENTE
Gastão
2022-08-25 14:39:10Ressuscitem o Sergio Motta, ou o psicografem do além. Contará barbaridades sobre a relação de Fernando Henrique Garboso, o " punhos de renda ", sobre seu mensalão e sua relação espúria com o Congresso Nacional.
Gastão
2022-08-25 13:57:46Agora vai se o corruPTo, ladrão e condenado vencer estas eleições. Foro de São Paulo na cabeça. Chama o síndico.
Roberto
2022-08-25 13:52:56O Ciro dizer que ele não se canditará à reeleição é significativo mas é pouco. Ele precisa declarar que, se eleito, encaminhará e se empenhará por proposta legislativa que acabe com a reeleição.
Regina Bueno
2022-08-25 12:30:44Concordo plenamente. E não adianta dizer que outros países democráticos tb têm reeleição, pq não há comparação entre eles e o Brasil. O índice de analfabetismo político por aqui é imenso e o povo é mais suscetível a benesses e promessas populistas - além da absurda “amnésia”! Temos q acabar isso - os fracassos são visíveis e os ÚNICOS beneficiados são os “excrementíssimos”políticos da República das Bananas.
Avelar
2022-08-25 12:20:55Discordo totalmente dessa análise. O Instituto da reeleição existe nas principais democracias do mundo. O nosso problema é falta de estadistas, nível baixo de discernimento político da população e uma mídia idiota que fica desviando o foco dos verdadeiros problemas do país. Se tivéssemos cultura política não reelegeriamos no parlamento figuras nefastas como Artur Lira, Renan Calheiros, Davi Alcolumbre, etc, porque não honraram seus mandatos. O mesmo vale para o executivo.