Gleisi contra 346 deputados
Ministra das Relações Institucionais de Lula projeta tranquilidade após derrota acachapante na Câmara, mas só tem motivos para se preocupar

Gleisi Hoffmann (ao centro na foto) projetou tranquilidade após mais uma acachapante derrota do governo Lula na Câmara dos Deputados.
Segundo a ministra de Relações Institucionais, "a votação da urgência para o PDL do IOF não cessa a eficácia do novo decreto sobre alíquotas do imposto nem abala a confiança do governo no diálogo com o Legislativo para aprovar as medidas necessárias ao fortalecimento das contas públicas".
"Quanto mais debate houver sobre taxação de bets, dos investimentos financeiros incentivados e outras distorções tributárias mais avançaremos no rumo da justiça fiscal e social e na construção conjunta de alternativas, no interesse do país", completou a ministra em seu perfil no X.
Gleisi disse isso após seu governo não conseguir impedir a aprovação, por expressivos 346 votos a 97, de urgência para deliberar sobre o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que suspende a elevação de alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Aliados?
A derrota dos governistas contou com votos de deputados de partidos que comandam 12 ministérios no governo Lula. Todos os 56 parlamentares do União Brasil que participaram da votação optaram pelo "sim".
O União toma conta de três ministérios do governo Lula, mas fez pressão pública por corte de gastos na semana passada junto com o PP, cujos deputados também não deram um único voto contra a urgência, apesar de o partido ocupar o Ministério do Esporte.
Até o PDT, mais alinhado ideologicamente ao governo e no comando do Ministério da Previdência Social, votou majoritariamente pela urgência, e restou ao Palácio do Planalto o apoio empenhado de PT, PSB, PSOL e PCdoB, os partidos mais à esquerda.
Justiça fiscal?
Restou aos governistas remoer o discurso de que tentam fazer "justiça fiscal".
"No meu discurso no plenário da Câmara dos Deputados fiz questão de deixar claro que o Governo Lula não governa para o mercado financeiro, mas para a classe de menor renda, que é quem mais paga imposto no Brasil", disse o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
"O mercado ficou nervoso porque a proposta do Governo é fazer justiça fiscal. Cerca de R$ 1,7 trilhão em aplicações financeiras que não paga 1 centavo sequer de imposto. Só de isenção fiscal, que o governo deixa de recolher, tem cerca de R$ 800 bilhões", reclamou Guimarães em seu perfil no X.
E agora?
Não há data para votar de fato a derrubada do aumento do IOF, o que sugere que a Câmara não está exatamente incomodada com a elevação das alíquotas, mas com a débil liberação de emendas pelo governo.
Gleisi se justificou dizendo que o Orçamento deste ano foi aprovado tarde demais — mas isso também é culpa do governo.
A votação da segunda-feira, 16, mostra, mais uma vez, que o governo Lula não tem base na Câmara e que não há qualquer motivo para a ministra de Relações Institucionais confiar no diálogo com o Legislativo — a não ser que os termos da conversa sejam financeiros.
O discurso de tranquilidade Gleisi é compreensível, ela não precisa admitir a fraqueza do governo em público, mas isso só faz sentido se estiver sendo feito apenas da porta para fora.
Negar que existe um problema de articulação com o Congresso Nacional pode servir para iludir os apoiadores, mas não vai resolver os problemas fiscais causados pelo governo, e deve dificultar até a tentativa de reeleição de Lula, que é a real prioridade do governo hoje.
Leia mais: É assim que Gleisi pretende convencer o Congresso?
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