Corruptofobia
A filha de Eduardo Cunha virou deputada. E a deputada, filha de Eduardo Cunha, teve uma ideia para acabar com o preconceito dos brasileiros contra os políticos. “Qual deputado ou senador já não sofreu discriminação”, pergunta Dani Cunha, filha de Eduardo (foto). Por isso ela sugere mudar as leis para equiparar crime de racismo com...

A filha de Eduardo Cunha virou deputada. E a deputada, filha de Eduardo Cunha, teve uma ideia para acabar com o preconceito dos brasileiros contra os políticos. “Qual deputado ou senador já não sofreu discriminação”, pergunta Dani Cunha, filha de Eduardo (foto). Por isso ela sugere mudar as leis para equiparar crime de racismo com xingamentos a políticos que respondem a processos por corrupção. A filha de Eduardo Cunha mostrou a que veio. Sua bandeira política é o combate à corruptofobia, que é a aversão irreprimível do povo contra pessoas que se unem para lesar o patrimônio público em benefício próprio.
Ela também pretende enquadrar as instituições financeiras que promovem o preconceito e a discriminação de políticos acusados de corrupção. Filha de um exemplar desta espécie, diz já ter sofrido na pele tamanha injustiça, quando lhe negaram a abertura de uma conta no banco. Talvez por isso o pai preferiu abrir uma conta num banco suíço.
Porém, Dani Cunha faz questão de deixar claro que “não é contra o controle que visa o combate à lavagem de dinheiro envolvendo políticos”. Ela só acha que “existe um exagero”. E esse exagero traz terríveis consequências psicológicas aos familiares do político envolvido num escândalo de corrupção. A filha de Eduardo também poderia considerar um exagero os valores movimentados no esquema de corrupção em que o pai fora acusado, estimados em 153 bilhões de reais. Também é exagerada a situação das famílias que sofrem as consequências dos esquemas de corrupção. Um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) apurou que os brasileiros trabalham, em média, 1 mês inteiro por ano para pagar as despesas da corrupção. Já a Confederação Nacional da Indústria estima que cada 1 real desviado pela corrupção representa um dano econômico e social multiplicado por 3. E os impactos nos serviços públicos, sobretudo nas áreas de saúde e educação, são incalculáveis. Qual deputado ou senador já passou a madrugada num hospital público sem ser atendido? Qual deputado ou senador já viu um familiar morrer por falta de uma vaga na UTI? Qual deputado ou senador já deixou de ir trabalhar porque não conseguiu uma vaga para deixar o filho numa creche? Na verdade, eles costumam deixar de ir trabalhar por outros motivos.
Mas além de lutar, à sua maneira, contra a discriminação e o preconceito, Dani Cunha, a filha de Eduardo, também está preocupada com o baixo nível das discussões políticas. Está convicta de que “a discriminação dos políticos é tão odiosa quanto as demais discriminações previstas em lei”. Até poderia justificar suas ideias citando um trecho do livro Racismo Estrutural, do nosso ilustre ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, que diz categoricamente ser “preciso ressaltar que mulheres e homens negros não são as únicas vítimas de opressão estrutural: muitos outros grupos sociais oprimidos compartilham experiências de discriminação em alguma medida comparáveis”. Talvez com a de políticos condenados por corrupção que tiveram suas sentenças anuladas e se tornaram presidentes.
Na verdade, o projeto de lei da deputada Dani Cunha promete “colocar as coisas nos seus devidos lugares”. Eu acredito. Vivemos no país dos anões do Orçamento, da compra de votos para a reeleição, das sanguessugas, do mensalão, do petrolão, das rachadinhas, do caixa 2 e do abuso de poder econômico nas campanhas eleitorais. Estranho mesmo seria uma operação como a Lava Jato, que incentiva à corruptofobia, como sabemos, uma aversão irreprimível e preconceituosa contra pessoas que agem de forma desonesta, buscando sempre lesar o patrimônio público em benefício próprio.
Diogo Chiuso é escritor e autor do livro O que restou da Política, publicado pela editora Noétika em 2022
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Comentários (10)
Branda
2023-04-21 11:56:31Valores totalmente invertido. Ou talvez, total falta de valores.
Alberto de Araújo
2023-04-18 10:12:46O corrupto se transforma em vítima.Isso me faz lembrar uma peça do dramaturgo falecido, Nélson Rodrigues, "perdoa-me por me traíres". A vítima da traição pede perdão ao traídor.A carroça na frente dos bois. Seria cômico se não fosse trágico.
ROMEU
2023-04-17 20:40:54Pois é... Filha de corrupto não nega a que veio. Difícil imaginar o que passa na cabeça de quem vota numa figura dessas.
Manoel
2023-04-17 17:26:21Uma Cleptocracia que se preza tem de punir severamente quem fica indignado com a corrupção! Boa Dani bananinha... Vamos prender logo esse Sérgio Moro e o Dallagnol, devolver o dinheiro das empreiteiras e da JBS, e claro, pedir a canonização do papai...
Adriano
2023-04-17 13:49:44Não nega a vagabundagem do dna nem debaixo d'água...
Neide Júlio Guimarães
2023-04-17 12:13:17Parabéns pela reportagem, palavras perfeitas para a situação de tantos absurdos escancarados.
Benjamin Gomes Neto
2023-04-17 11:34:59Gostei muito do texto! É até engraçado! Vale a pena ler até o fim...
Sônia Adonis Fioravanti
2023-04-17 11:16:43Pobre CONGRESDO ,cada vez mais 🐀🐀🐀🐀🐀
Maria
2023-04-17 09:20:42O incrível não é essa corruptinha falar merda, o incrível mesmo é o povo votar nela, isso sim é que dá nojo 🤮🤮🤮
Felipe
2023-04-16 17:26:38É de dar nojo. E o mais nojento é que tem gente que vota nessa tralha aí.