Diego Nigro/JC Imagem/FolhapressAs reviravoltas da política: não será surpresa se Bolsonaro e Luciano Bivar voltarem a ser companheiros de partido

À beira da ruptura

Por que Jair Bolsonaro e o comando do PSL estão em pé de guerra e quais são os caminhos possíveis caso o presidente decida deixar o partido
11.10.19

O presidente Jair Bolsonaro passou os últimos dias com munição à mão e vontade de atirar no PSL. No final da semana anterior, ele havia recebido em seu gabinete no terceiro andar do Palácio do Planalto dois de seus advogados de confiança, Karina Kufa e o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral Admar Gonzaga. Ambos relataram, mais uma vez, as dificuldades que vêm enfrentando com a cúpula do partido, que se recusa sistematicamente a lhes dar acesso às contas nacionais e dos diretórios estaduais. Kufa e Gonzaga disseram ao presidente haver uma caixa-preta na legenda, com dezenas de prestações de contas rejeitadas pelos tribunais país afora. Outras nem sequer foram apresentadas. Bolsonaro, por fim, foi avisado de que a situação tem grande potencial de lhe render problemas no futuro.

Foi com base nessas informações que o presidente resolveu ir para cima do comando partidário. Na terça-feira, 8, um vídeo gravado na porta do Palácio da Alvorada captou o momento em que um militante do PSL, animado, chegou perto do presidente e lhe disse: “Bolsonaro, sou do Recife, pré-candidato do PSL”. O presidente cochichou no ouvido do apoiador: “Esquece o PSL”. O interlocutor insistiu. Queria gravar um vídeo. Abraçou o presidente e disse: “Eu, Bolsonaro e Bivar, juntos por um novo Recife”. Bolsonaro se irritou de pronto: “Cara, não divulga isso, não. O cara está queimado pra caramba. Vai queimar o meu filme. Esquece esse cara, esquece o partido”. O “cara” era o presidente da sigla, o deputado federal Luciano Bivar. Foi o estopim para que a crise de Bolsonaro com o partido que lhe deu legenda em 2018 chegasse ao seu ponto mais elevado.

Surpreendentemente, no Congresso, a reação da maioria dos parlamentares do partido à fala do presidente foi de apoio a Bivar. A bancada da Câmara, por exemplo, formada por 53 deputados (a segunda maior da casa), divide-se em três grupos. Os pragmáticos, os militares e os ideológicos. Apenas esse último grupo, que tem ao redor de 15 integrantes e é liderado por Bia Kicis, Carla Zambelli e Luiz Philippe de Orleans e Bragança, apoiou o presidente. Os demais, encabeçados pelo próprio Bivar e pelo líder da bancada, Delegado Waldir, viram a oportunidade de liderar um levante para que Bolsonaro, de fato, deixe a legenda.

Pedro Ladeira/FolhapressPedro Ladeira/FolhapressDelegado Waldir, líder do PSL: “Quintal de Bolsonaro também está sujo. E o filho dele?”
A avaliação desse grupo é a de que vale mais estar com o comando do partido do que ter a companhia do presidente, algo inédito na história recente do país, dado o poder da caneta que o mandatário da República, seja ele quem for, tem em mãos. Os parlamentares, porém, consideram que será por meio de Bivar, e não de Bolsonaro, que conseguirão ter algum acesso aos cerca de 500 milhões de reais de recursos públicos que devem irrigar as contas do partido em 2020, ano de eleição municipal. O deputado pernambucano, uma espécie de dono do PSL, tem controle absoluto da legenda. É presidente do partido desde 1998 – ele se licenciou em 2018 para que o grupo de Bolsonaro assumisse a legenda durante a campanha, mas meses depois retomou o leme. O caixa é todo controlado por pessoas de sua confiança, assim como as decisões políticas. Quem chiar, pode recorrer ao diretório nacional, mas sem muitas chances de sucesso: dos 100 integrantes, 65 são ligados a Bivar.

Uma ampla mudança interna dependeria, obrigatoriamente, de uma negociação com o deputado. Era o que Bolsonaro vinha tentando fazer. Com seu aval, a ala ideológica começou então a reivindicar um novo estatuto para o partido. O deputado Orleans e Bragança chegou a elaborar um documento e a colher assinaturas dos correligionários para que a mudança tivesse algum respaldo interno. Não só não conseguiu apoio suficiente como discutiu com Bivar e foi destituído do diretório paulista. A negociação passou a ser conduzida então por Karina Kufa, que caiu nas graças do clã Bolsonaro após salvar o PSL de São Paulo de uma enrascada na campanha de 2018. A legenda não tinha apresentado documentos na prestação de contas de 2017 e a Justiça ameaçava não autorizar as candidaturas de sua seccional paulista, entre elas a de Eduardo Bolsonaro, o filho 03 do presidente. Karina Kufa iniciou ela mesma uma negociação com Bivar. Pediu acesso a todas as contas dos diretórios nacional, estaduais e municipais, a inclusão de regras de compliance e uma renovação do comando da sigla. Não conseguiu nada.

Nesse meio tempo, o embate público entre dois grupos — o de Bivar e o de Bolsonaro — foi se acentuando. A ala próxima ao deputado começou a manifestar publicamente insatisfações com o presidente e seus filhos. Passou, por exemplo, a cobrar explicações sobre o envolvimento do senador Flávio Bolsonaro com seu antigo assessor na Assembleia Legislativa do Rio, Fabrício Queiroz, ambos alvo de uma investigação do Ministério Público do Rio que apura a existência de um esquema de arrecadação ilegal de recursos de funcionários do gabinete. “Quintal de Bolsonaro também está sujo. E o filho dele?”, indagou nesta semana o líder do partido na Câmara, Delegado Waldir, respondendo à fala de Bolsonaro sobre Bivar. Para o grupo, o presidente tenta criar uma narrativa de que a legenda tem problemas e ele, não. Essa ala lembra, contudo, que foi o grupo de Bolsonaro que assumiu o PSL em 2018 e foi a partir dali que surgiu o que hoje é o maior constrangimento interno: o indiciamento, pela Polícia Federal, do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio. Ele comandava o diretório de Minas Gerais no ano passado por indicação do grupo de Bolsonaro. Os bivaristas, por assim dizer, assumem ter alguns problemas em contas partidárias, mas nada da dimensão que o clã sugere. Por sua vez, o presidente sempre falou com certo desdém do partido. E sempre deixou circular que poderia deixar o PSL.

TSEKarina Kufa, advogada de Bolsonaro: planos para o futuro político do presidente
Hoje a saída é cada vez mais provável, mas ainda não é possível assegurar que se trata de um caminho inevitável. Kufa e Gonzaga analisam apresentar questionamentos no Tribunal Superior Eleitoral sobre a validade de decisões tomadas por Bivar sem consulta às demais instâncias partidárias. Seria uma maneira de dividir o controle da legenda pela via judicial. Se isso não for possível, outras alternativas serão analisadas. Inclusive a criação de uma nova legenda ou a migração de Bolsonaro e seus aliados mais fiéis para um partido já existente.

Muitos partidos já se colocaram à disposição para receber o presidente e seu grupo, como o Patriotas e a União Democrática Nacional, a UDN, cuja recriação deve ser homologada em novembro pela Justiça Eleitoral. No entanto, a grande dificuldade que a migração impõe é que os parlamentares não conseguem levar consigo o tempo de TV e as cotas do fundo partidário, além de correrem risco de perderem o mandato por infidelidade. Pela legislação, é o número de eleitos para a Câmara dos Deputados que determina o tamanho de cada um desses ativos, fundamentais em qualquer eleição depois do fim do financiamento privado eleitoral. A equipe jurídica do presidente até avalia uma batalha para que os novos filiados arrastem as fatias no horário eleitoral gratuito e os recursos financeiros, sob a justificativa de que o PSL só alcançou o tamanho que tem hoje graças à filiação de Bolsonaro. Mas não há qualquer garantia de que o argumento seria aceito.

Por fim, sobraria como possibilidade a criação de um partido, o que é algo bastante trabalhoso. É necessário, por exemplo, colher 2 milhões de assinaturas, um número equivalente a 0,5% dos votos válidos na última eleição da Câmara. O entorno do presidente até avalia que é possível colocar isso de pé, pelo apoio que Bolsonaro detém, segundo as pesquisas, de cerca de um terço da população. Admar Gonzaga, um dos homens de confiança do presidente destacados para cuidar do assunto, é do ramo. Foi ele o responsável por toda a operação jurídica que criou o PSD de Gilberto Kassab. Uma das alternativas possíveis para Bolsonaro já está em processo de construção. Admar e Kufa trabalham na elaboração do que seria o estatuto de um nova sigla, que se chamaria Conservadores. O problema é que é praticamente impossível viabilizar a legenda já para as eleições municipais de 2020, o que obrigaria Bolsonaro e aliados a buscarem, ao menos por ora, mais uma barriga de aluguel para enfrentar o próximo ano. Se o presidente de fato deixar a legenda, será o décimo partido dele em 30 anos de vida pública.

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    1. Concordo plenamente. Dinheiro pro SUS não tem. Mas tem pra sustentar vagabundices.

  1. Tudo isso gira em torno da disputa por dinheiro do povo, pra jogar no lixo das campanhas. Bolsonaro posa de "nova política" mas é tão arcaico e oportunista como Bivar. Se merecem. Se tivesse um mínimo de coerência, teria tomado medidas pra acabar com o fundo eleitoral e o fundo partidário. O dinheiro dos impostos deve ir para saúde, educação e segurança. E, se não tivesse rabo preso, o caso Queiroz já estaria esclarecido e o ministro das laranjas no olho da rua. Briga de sujo com mal cheiroso.

    1. Pra presidente da ALERJ, de onde nunca deveria ter saído.

  2. Que reportagem fraca. No tom da covardia da imprensa brasileira, que não fala as coisas de forma clara: há não um PSL “ideológico”, mas um PSL honesto, em sintonia com o PR, e um PSL de pilantras, que surfou no conservadorismo visando ao enriquecimento ilícito. Como caíram do cavalo quando perceberam que a honestidade de Bolsonaro não era só discurso de campanha, agora miram o fundo partidário para poder roubar dinheiro público. Que decepção, antagonistas, ecoando a narrativa da imprensa lixo.

  3. Demonstra o "estado de deterioração" que se encontra as agremiações políticas.Todos parecem terem sido contaminados pelo PT.Algumas em estado terminal.Outras sobrevivendo e algumas se recuperando.Ainda tem os estéricos que diante do potencial de extinção ou clausura forçada,rasgam-se,gritam por motivos irrisórios,debatem-se,etc.

  4. Em 30 anos de baixo clero, dá para imaginar os galinheiros que foram os gabinetes do bozo na câmara federal e estadual. O filhão pilantrão teve com quem aprender.

  5. Projeto de poder os f.d.p. dos políticos brasileiros tem. Projeto de nação não existe na cabeça dessa escumalha que ocupa o Congresso Nacional e o planalto.Eles são a garantia que Brasil continuará sendo uma gigantesca GAMBIARRA , uma terra sem futuro .

    1. Na realidade nunca tivemos futuro promissor algum. Quem dizia isso era por desinformação ou má fé intelectual

  6. No bordel Brasil os desentendimentos sempre são passageiros . Logo as putas políticas encontram algo que as unam , como sempre . A vontade de gozar sempre fala mais alto.

  7. A cagada de um jacu é mais importante do que a maioria dos politicos do Brasil. Ao defecar a ave espalha dezenas de sementes que irão produzir novas árvores e frutos e assim insistir na preservação da vida. Ao contrário do jacu, as cagadas dos politicos brasileiros nunca faz nada em prol das gerações passadas, presentes e futuras .

  8. Se o PSL pode realizar suas contas do fundo partidário sem prestar contas ao presidente... Ele deve ficar atento e até sair agora, afinal se houver problemas é ele que irá responder!!!!

  9. Briga pelo controle dos fundos partidário e eleitoral, essa anomalia criada pelo $tf legislador, que tira dinheiro dos contribuintes para entregar de bandeja para esses políticos corruptos.

  10. Está explicado. É por isso que Bolsonaro faz tantas metáforas entre vida política e amorosa. Trocou tanto de partido quanto de mulher. Agora que cansou do cangote de Bivar, procura um novo xamego.

  11. O motivo da disputa é nada menos, nada mais que dinheiro. Aliás o quê o Ministro do Turismo ainda faz na pasta, já passou da hora de dar tchau.

    1. Esse ministro tem um rabo preso com o presidente, tão grande, mas tão grande, do que supõe nossa vã filosofia....

  12. Bolsonaro e PSL é um casamento com união universal de bens... Se o acervo de parlamentares do PSL ficou robusto graças a JB, por outro partido de maior expressão, a candidatura de Bolsonaro teria sido rifada, pois sua pretensão era muito mal vista no início da campanha e o PSL bancou seu nome!

    1. O partido aceitou Bolsonaro quando estava em cima da hora e nenhum partido o queria!

  13. Enquanto não houver uma reforma política, reduzindo para no máximo 4 partidos políticos, essa turma de sanguessugas, desorganizadas, não encontrarão o caminho ao qual se comprometeram a trilhar que são: Amor a pátria, honestidade, trabalho, justiça, ordem e progresso. Gastam suas energias articulando, tramando, indiferentes aos anseios da nação.

    1. O problema não é o número de partidos e, sim, a manutenção deles via fundo partidário e eleitoral.

    2. Gostaria de ver dois partidos - situação e oposição. No final tudo se resume a isto. O resto é negociata. Acorda Brasil!!!🇧🇷🇧🇷🇧🇷

    3. Celso e Carlos, não há necessidade de limitar o número de partidos. Basta cortar a farra do fundo partidário bilionário feito com nossa grana. Os partidos teriam que levantar recursos dos apoiadores sem a participação fraudada das empreiteiras e que tais.

    4. Será que um dia teremos só uns 4 partidos? Seria o máximo para a economia do país .

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