Referendo pode manter Putin no poder até os 84 anos
Nesta quarta, 1º de julho, os russos votam em um referendo para dizer se aprovam ou não um pacote que altera catorze trechos da Constituição. A mudança, a maior já feita na Carta desde sua criação, em 1993, foi proposta pelo presidente Vladimir Putin (foto) em janeiro. A principal alteração é em relação ao tempo...
Nesta quarta, 1º de julho, os russos votam em um referendo para dizer se aprovam ou não um pacote que altera catorze trechos da Constituição. A mudança, a maior já feita na Carta desde sua criação, em 1993, foi proposta pelo presidente Vladimir Putin (foto) em janeiro.
A principal alteração é em relação ao tempo em que Putin, hoje com 67 anos, poderá ficar no poder. Ele está no comando da Rússia desde agosto de 1999, ocupando as funções de primeiro-ministro e presidente. Seu atual mandato expira em 2024. Segundo a atual Constituição, o mandato de presidente só pode ser exercido duas vezes. A reforma que está sendo discutida anula essa contagem. Com isso, Putin poderia concorrer nas eleições de 2024 e 2030. Em 2028, ele ultrapassaria Josef Stálin em tempo no cargo. Putin só precisaria deixar o posto 2036, ano em que deverá completar 84 anos.
Ao retirar os empecilhos legais para que Putin permaneça no cargo pelos próximos dezesseis anos, a reforma acabará com qualquer especulação sobre possíveis sucessores do presidente. "Ele certamente está tentando evitar qualquer discussão sobre sucessores neste momento. Qualquer conversa desse tipo poderia perturbar o delicado equilíbrio de poder que ele construiu na elite russa", diz Sergey Radchenko, especialista em Rússia e Guerra Fria na Universidade Cardiff, no Reino Unido.
A reforma também reduzirá as pretensões de alguns rivais. Uma cláusula exige que os candidatos à presidência tenham morado no país nos últimos 25 anos e que não tenham documentos estrangeiros. Até então, a exigência era de dez anos vivendo na Rússia.
Para garantir a vitória no referendo, foram incluídas várias medidas populistas e de bem-estar social no pacote. O salário mínimo passará a ser reajustado de maneira a cobrir o custo mínimo de vida. As aposentadorias serão reajustadas pela inflação. O governo ficará encarregado de dar "uma educação que garanta um desenvolvimento amplo espiritual, moral, intelectual e físico das crianças, cultivando o patriotismo e a consciência cívica". Além disso, o estado assumirá a educação dos órfãos.
Outras mudanças apelam diretamente aos eleitores de Putin, que são mais inclinados ao patriotismo, ao conservadorismo social e à Igreja Ortodoxa. O casamento passará a ser considerado apenas como a união entre um homem e uma mulher. Pela primeira vez, a palavra Deus entrará na Constituição. "A Federação Russa, unida por uma história milenar, preservando a memória de seus ancestrais que nos transmitiram os ideais de fé em Deus, assim como a continuidade no desenvolvimento do estado russo, reconhece a unidade estatal historicamente estabelecida", diz um artigo novo.
A iniciativa também segue o revisionismo histórico adotado pelo Kremlin, segundo o qual todos os governantes anteriores do país — sejam czares ou revolucionários comunistas — devem ser enaltecidos. Será proibido criticar os feitos dos defensores da pátria e a Rússia será entendida como a sucessora da União Soviética. "Putin está recorrendo a grandes narrativas históricas, como a ideia de que a Rússia venceu as forças das trevas do nazismo. Além dele acreditar nessas narrativas, essa também é claramente uma forma de ele ganhar legitimidade", diz Radchenko.
As reformas propostas já foram aprovadas pelo Parlamento e não há nenhuma exigência na Constituição de que um referendo seja convocado. Mesmo assim, Putin insistiu na consulta popular. Para estimular a população a sair para votar, um feriado foi decretado nesta quarta. Como Putin controla toda a imprensa e tem uma aprovação de quase 60%, é bem provável que a população valide sua proposta. Com mais da metade dos votos favoráveis, as reformas serão aprovadas.
Atualização: na quarta, 1, a Comissão Eleitoral Central da Rússia anunciou, cinco horas antes do fechamento dos locais de votação em Moscou, que 73% dos russos apoiaram a reforma constitucional.
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