Por que Maduro quer mudar a Constituição?
Eleições de segundo escalão e perda de nacionalidade para opositores podem estar entre as alterações da Carta

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro (foto), anunciou que pretende mudar a Constituição do país, aprovada no primeiro ano do governo de Hugo Chávez, em 1999.
Ao longo dos anos, o texto chavista aumentou os poderes do Executivo, facilitou o controle sobre o Judiciário e intensificou o envolvimento político dos militares.
Os direitos humanos contidos na Carta em vigor são ignorados por Maduro, que não respeita a liberdade de expressão, ignora o direito à manifestação, frauda eleições e tortura opositores.
Para entender qual é a motivação de Maduro para mexer no texto, Crusoé conversou com o sociólogo venezuelano José Guillermo Pérez, que faz doutorado na Universidade Estadual de Campinas, Unicamp.
Por que Maduro quer mudar a Constituição, se já não a respeita?
Acredito que o objetivo de Maduro é consolidar completamente o poder e fechar qualquer espaço para possíveis contestações.
Um problema para todos os ditadores é como estabilizar os processos de acesso ao poder.
Nas democracias, existem eleições. Nas monarquias, a transmissão de poder é hereditária.
Mas as ditaduras modernas frequentemente apresentam uma contradição entre o que está escrito nas Constituições e o que os ditadores fazem.
Isso frequentemente abre caminhos para protestos. Os donos do poder então podem ser desafiados tanto pela oposição quanto por membros menos leais de sua coalizão.
Parece que o objetivo de Maduro é acabar com essas potenciais contradições entre a norma e a ação, para tirar ferramentas de inimigos internos e externos.
Quais mudanças Maduro pensa em fazer na Constituição?
Parece que o ditador pretende conduzir a Venezuela a uma espécie de eleições de segundo escalão, mas isso não está totalmente claro.
O que ele propôs até agora é que os conselhos comunais tenham maior representatividade nas eleições.
Além disso, as comunas (as unidades territoriais-administrativas que Chávez promoveu, mas nunca foram implementadas) assumam um papel mais ativo no Estado.
Isso levaria a uma redução da importância dos governadores, que poderão ser substituídos ou perder funções para as comunas.
Também se fala em estabelecer penas mais severas para pessoas consideradas como "terroristas" ou "conspiradores". Ou seja, para opositores.
Outra possível mudança é em relação à correção dos salários.
A Constituição atual exige que os salários compensem a inflação, o que não tem acontecido.
Atualmente, os movimentos sindicais usam esse artigo da Constituição para denunciar o governo em fóruns internacionais, como a Organização Internacional do Trabalho.
Qual nova pena poderia ser adotada para os opositores?
Entre elas se fala na perda da nacionalidade.
Hoje, a Constituição venezuelana proíbe a revogação da nacionalidade de uma pessoa.
Na Nicarágua, essa medida já é feita com frequência.
É uma tática antiga das ditaduras.
Também se fala em prisão perpétua, que é outra coisa proibida pela atual Constituição.
Maduro está conseguindo o que quer?
Esse movimento do ditador pode estar tendo resistências.
Inicialmente, Maduro queria fazer isso no início deste ano.
Agora, parece que ele decidiu adiar a iniciativa para o ano que vem.
Como acontece com todos os ditadores, é muito difícil saber as motivações finais para a mudança de atitude.
Mas talvez esse adiamento seja devido à inquietação ou descontentamento interno.
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Comentários (1)
Denise Pereira da Silva
2025-05-28 21:27:04Creio que o adiamento deve ser também devido ao fato de os atuais "aliados" temerem, a qualquer momento e por simples vontade de Maduro, ser considerados opositores também pelo ditador.