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Macron quer ser amado

10.06.24 10:18

As eleições do Parlamento Europeu que aconteceram entre a quinta, 6, e o domingo, 9, não vão trazer grandes mudanças. O bloco Partido do Povo Europeu (European People’s Party, EPP), de Ursula von der Leyen, atual presidente da Comissão Europeia, foi o mais votado. Os dois principais grupos da direita populista, somados, terão somente 131 das 751 cadeiras. Em Bruxelas, Estrasburgo ou Luxemburgo, os novos parlamentares continuarão discutindo muito e decidindo pouco.

Mas as eleições tiveram um importante resultado: a dissolução do Parlamento francês pelo presidente Emmanuel Macron (foto).

O presidente, cujo partido Renaissance teve 14% dos votos na França (menos da metade dos 31% do Reagrupamento Nacional, RN, de Marine Le Pen), achou por bem convocar um novo Parlamento

Decidi devolver a vocês a escolha do seu futuro parlamentar por meio do voto. Portanto, estou dissolvendo a Assembleia Nacional esta noite”, disse Macron na noite deste domingo, 9. “Esta decisão é séria, pesada. Mas é, acima de tudo, um ato de confiança. Confiança em vocês, meus caros compatriotas. Na capacidade do povo francês de tomar a decisão mais justa.”

 

Não precisava

Foi uma decisão desnecessária. Macron misturou as eleições nacionais com as do Parlamento Europeu e reagiu de forma exagerada.

Uma coisa é o voto para o Parlamento francês ou para a presidência. Nesse momento, os eleitores estão preocupados com quem irá governá-lo e quem irá elaborar suas leis.

A eleição do Parlamento Europeu é de outra natureza e tem menos importância. Tanto é assim que o comparecimento costuma ser entre 40% e 50%, enquanto que, nas eleições nacionais, o índice fica acima dos 70%.

Quem vota nas eleições para o Parlamento Europeu normalmente são as pessoas mais engajadas, que tendem para os extremos políticos e estão preocupadas com questões que despertam mais paixões, como a criminalidade, o aumento da imigração e o terrorismo (em alguns momentos).

Mais recentemente, essas eleições para o Parlamento Europeu também começaram a ser usadas pela oposição dos vários países para incomodar o governo nacional de turno.

Essas eleições se tornaram, assim, algo parecido com as eleições legislativas de metade do mandato nos Estados Unidos. Dois anos após a eleição do presidente, os americanos escolhem deputados e senadores. Se o presidente é republicano, então os democratas levam vantagem. E vice-versa. Além de ser mais fácil mobilizar quem está descontente, esse comportamento é uma maneira saudável de equilibrar o poder e impedir o seu abuso pela Casa Branca.

 

Marine Le Pen 

Na França, o que aconteceu foi que Marine Le Pen, do Reagrupamento Nacional (RN), e Jordan Bardella, o presidente do partido, usaram as eleições do Parlamento Europeu para espezinhar o presidente.

Eles foram favorecidos pelo desgaste natural de um presidente em segundo mandato, que promulgou uma reforma da previdência à revelia do Congresso.

A votação que o RN teve neste domingo, de 31%, foi menor do que a que Marine Le Pen obteve no segundo turno de 2022, de 41%.

A principal diferença foi o tombo de Macron. Ele teve 58% no segundo turno de 2022 e apenas 14% agora. A queda foi de 44 pontos percentuais.

A razão é fácil de entender: muitos dos que apoiaram a reeleição de Macron o escolheram não pelas suas qualidades, mas porque queriam evitar uma vitória de Marine Le Pen.

Macron poderia continuar governando como antes, sabendo que o partido RN está em crescimento, mas que ao mesmo tempo conta com uma grande rejeição na população.

Mas não.

Ele interpretou o resultado deste domingo como uma questão pessoal e agora quer que os franceses voltem para as urnas para dizer que o amam.

Não foi um bom resultado para os países que defendem a Europa, incluindo o da maioria presidencial. Os partidos da extrema direita nos últimos anos se opuseram a muitos avanços que fizeram a Europa possível; seja uma reativação econômica, a proteção das nossas fronteiras, o apoio aos nossos fazendeiros e à Ucrânia. Esses partidos estão progredindo através do continente. Por considerar que uma Europa unida, forte e independente é algo bom para a França, eu não posso aceitar essa situação“, disse Macron no discurso deste domingo.

 


Não vai dar certo

Não há por que acreditar que os franceses irão em massa às urnas só para atender a um pedido de um presidente vaidoso e egoísta que se sentiu melindrado após uma derrota eleitoral.

Além do mais, convocar eleições quando se está enfraquecido não faz qualquer sentido estratégico.

O primeiro-ministro britânico Rishi Sunak cometeu esse erro há duas semanas e logo passará o poder para o rival Partido Trabalhista no Reino Unido.

Na França, as previsões indicam que Macron terá de conviver com um Congresso refratário, que provavelmente será comandado por Jordan Bardella, do RN.

Se isso se confirmar, será o resultado direto de uma escolha de Macron.

Se o presidente que já foi chamado de “jupiteriano“, pelo seu pendor ao narcisismo, acha que os franceses voltarão às urnas só para dizer que o amam, sorte para ele.

 

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