Lá vai o trem com o ministro
Toffoli conduz o trenzinho do STF rumo à responsabilização das plataformas de rede social pelo conteúdo publicado por terceiros, sem muito apreço pela liberdade de expressão

Dias Toffoli evocou o Clube da Esquina no trecho mais confuso de seu voto para responsabilizar as plataformas de rede social por conteúdos postados por terceiros.
Além de Milton Nascimento e Fernando Brant, apareceu na sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) de quinta-feira, 5, o economista Adam Smith, com uma alusão à mão invisível do mercado, para criticar a mão invisível da Inteligência Artificial — evocada de forma errada por Luiz Fux para se referir aos algoritmos que definem os rumos das conversas online.
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"A culpa é do robô", disse Fux, na tentativa de dizer que os ministros não vão tolher a liberdade de expressão ao impor mais responsabilidades às plataformas, e sim combater a disseminação de desinformação por meio de mecanismos automatizados.
O debate dos ministros, que Felipe Moura Brasil e Duda Teixeira definiram no Papo Antagonista de quinta-feira, 5, como conversa de boteco (assista abaixo), foi parar nas ferrovias, por meio da "teoria do risco", citada por Flávio Dino, que não perdeu a oportunidade de criticar os lucros das big techs.
Lá vai o trem sem destino
"A lei brasileira de 1912 já impôs a teoria do risco para as ferrovias. E o que era a ferrovia, senão a via de comunicação? Como você ia colocar um vigia em cada trecho de trilho, de um metro e meio, dois. O batente, não sei quantos metros tem, mas quem já viajou de trem, a cada segundo são três, quatro barulhos que você escuta", divagou Toffoli, chegando aos "trens de Minas Gerais" e fazendo menção à mineira Cármen Lúcia.
Foi aí que apareceram Brant e Milton. Toffoli já tinha comparado, na sessão anterior, liberdade de expressão a violência física, ao mencionar o caso do policial militar que jogou da ponte um suspeito em São Paulo, dando a dimensão do espírito com que os ministros do STF tratam do assunto.
Ao que tudo indica, o ministro gostaria de mandar arrancar o caminho de ferro, para ficar nas alusões à obra de Milton Nascimento. Mas o voto de Toffoli lembrou mesmo "O Trenzinho do Caipira", de Ferreira Gullar, Heitor Villa-Lobos e Edu Lobo (leia mais sobre a música):
"Lá vai o trem com o menino / Lá vai a vida a rodar / Lá vai ciranda e destino / Cidade e noite a girar / Lá vai o trem sem destino..."
Faltam 10
O voto de Toffoli levou quatro sessões para ser concluído, o que detona a relevância que os ministros do STF dão ao tema, mas também a dificuldade de justificar uma mudança de interpretação que pode, sim, interferir na liberdade de expressão no Brasil.
Não é que o Marco Civil da Internet não precise ser atualizado. O debate é válido.
O problema é que os ministros do STF tenham reivindicado essa missão e que evidentemente o façam com um espírito de revanchismo contra as plataformas de rede social, como já deixou bem claro Alexandre de Moraes.
"Ainda"
Para Moraes, as big techs foram diretamente responsáveis pela depredação das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, até tentou ser simpático com as empresas, ao dizer a um dos advogados que participam do julgamento que "esse é um debate em boa fé", e "não um inquirição", mas Moraes completou: "Ainda".
Com esse ânimo e sem muito apreço pela liberdade de expressão, é muito difícil imaginar que sairá alguma coisa boa desse julgamento, que só deve ser finalizado em 2025.
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Comentários (1)
Sandra
2024-12-06 16:19:15Esses devaneios todos ficaram tão confusos, indo de trilho de trem, IA, Clube da Esquina..... vai ser difícil entender a lei que provavelmente vão fazer; aí o povo tem 2 alternativas, somente lê o que foi postado ou sai de todas as redes sociais