Foto: Antônio Augusto/Secom/TSE

Alexandre de Moraes salvou a nossa democracia?

27.05.24 10:39

Não há mais dúvida de que Jair Bolsonaro e seus comparsas, civis e militares, tinham intenção golpista (à moda antiga mesmo, com tropas nas ruas). No entanto, é muito duvidoso se suas tentativas de desfechar um golpe ou um autogolpe, se tivessem se concretizado, seriam bem-sucedidas, com a instalação de uma ditadura militar de extrema direita no Brasil. Não é assim que funciona na atualidade, sobretudo em países complexos, com instituições democráticas funcionando.

Não foi assim o caminho de autocratização percorrido pela Hungria de Orbán, nem pela Turquia de Erdogan, para não falar das investidas autoritárias de Trump nos EUA. Hungria, Turquia, EUA e Brasil não são Mianmar, nem Sudão.

Em sociedades complexas o processo de autocratização ocorre por erosão democrática progressiva (o que estava em curso durante todo governo Bolsonaro, desde 2019 e não apenas nas articulações alopradas de final do governo e na manifestação cenográfica do 8 de janeiro de 2023, cosplay do 6 de janeiro de 2021 americano, o nosso famoso “capimtólio“). Mas isso demora. Nesse caminho (o da erosão democrática), o Brasil não viraria uma ditadura da noite para o dia.

Além disso, não há uma única ameaça à nossa democracia. Temos golpistas (populistas de extrema-direita) e “erosistas” (populistas de esquerda). Os golpistas querem dar um golpe de mão para destruir as instituições democráticas. Os “erosistas” querem ocupar as instituições e controlá-las, colocando-as a serviço de um líder ou partido, usando a democracia para promover a erosão da democracia.

A erosão democrática não é promovida apenas pelos populistas de direita radical, como Orbán, Erdogan, Trump e Bolsonaro. Também contribuíram para ela os populistas de esquerda, como Hugo Chávez (que acabou ensejando a conversão do regime venezuelano em uma ditadura, com Maduro) e continuam contribuindo Obrador (México), Petro (Colômbia), Evo e Arce (Bolívia), Xiomara (Honduras), Widodo (Indonésia), Ramaphosa (África do Sul) e Lula (Brasil) que estão se alinhando às maiores ditaduras do planeta (Rússia, China, Irã etc.) contra as democracias liberais.

O STF cumpriu um importante papel naquela conjuntura, em defesa do Estado democrático de direito, mas o golpe bolsonarista não se concretizou porque faltou aos golpistas força político-militar para tanto. E porque seus potenciais apoiadores sabiam que, se tivessem logrado sucesso num “putch de cervejaria“, ao estilo do século passado, muito provavelmente o novo regime não conseguiria se manter diante da pressão internacional e da reação da sociedade brasileira.

O STF combateu os golpistas. Palmas para ele. Mas nada fez ainda para frear os “erosistas”.

Então vamos parar de repetir essa narrativa de que Alexandre de Moraes (foto) salvou a democracia brasileira. Ele contribuiu para defender a ordem democrática contra os golpistas, assim como contribuíram múltiplos agentes de todas as instituições — do Judiciário, mas também do Parlamento (inclusive o chamado Centrão, que pode querer tudo, menos matar sua galinha dos ovos de ouro), da imprensa livre, das associações civis, dos militares legalistas e do novo governo que tomou posse em 2023 — que nunca foram favoráveis a um golpe de Estado à moda antiga, nem a trocar uma democracia (ainda que defeituosa) por uma ditadura de direita.

Convém repetir. Repetir a narrativa de que Alexandre de Moraes salvou a democracia brasileira é um desserviço à democracia. Não que ele não tivesse, como já foi dito, dado sua contribuição para defender a ordem democrática e sim porque cria um mito (a rigor antidemocrático) de que um herói com poder e convicções certas é capaz de substituir as instituições e a sociedade na defesa da democracia. E acaba encorajando um ator particular a se sentir suficientemente empoderado para atuar como corregedor-geral da sociedade, atropelando os ritos jurídicos e dispensando a contenção e o comedimento que cabem aos juízes em uma democracia. E, ao fazer isso, investe na erosão da nossa democracia.

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  1. A maneira sistemática de implantar o socialismo a moda brasileira, vem sendo praticada desde os tempos do FHC (socialismo chic!), passando pelos governos Lula-Dilma (socialismo poor) e parando no Bolsonaro (direita atrapalhada!) e agora retomado pelo governo Lula metido a socialismo com protagonismo mundial, mas que não consegue nada além de gastos extraordinários em viagens inúteis mundo afora, e expondo uma politica externa sem rumo e sem nexo. Estamos a deriva!!!

  2. Precisamos de líderes focados na melhoria das nossas instituições democráticas. Estado mínimo. Privilégios para ninguém. Corruptos julgados e presos, com rapidez no judiciário e sem advogados pagos com dinheiro da corrupção. Aplicação de "Performance Bond" na contratação de obras públicas. Ótimo artigo Sr. Augusto de Franco!

  3. Uma única observação: a tentativa de erosão democrática brasileira ocorreu no governo Bolsonaro como uma continuação do que já vinha de antes, não começou em 2019.

  4. Dá nojo ler semelhantes asneiras típicas da imbecilidade e do fanatismo medieval que grassa entre pseudo intelectuais iludidos, onde este idiota vive? golpe é o que está sendo dado neste país ridículo dividido entre ódio e ignorância e os ditadores acolitados prenderam ilegalmente e torturam mentalmente mais de 1500 inocentes o triplo havido no regime militar esta a triste e cruel realidade que fingem não ver ... no censor please.

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