A cena por trás do pedido de demissão de Moro
Pela terceira vez desde que nomeou Sergio Moro para ser seu ministro da Justiça e Segurança Pública, o presidente Jair Bolsonaro tenta interferir em nomeações e na escolha do diretor-geral da Polícia Federal. Corporação responsável pela investigação de todos crimes contra o erário federal, a PF é o principal ativo da pasta comandada por Moro...
Pela terceira vez desde que nomeou Sergio Moro para ser seu ministro da Justiça e Segurança Pública, o presidente Jair Bolsonaro tenta interferir em nomeações e na escolha do diretor-geral da Polícia Federal. Corporação responsável pela investigação de todos crimes contra o erário federal, a PF é o principal ativo da pasta comandada por Moro e, por esse motivo, ele nomeou o delegado Maurício Valeixo, seu amigo pessoal e experiente investigador, para o cargo de chefe dos policiais.
A primeira tentativa de Bolsonaro foi em agosto de 2019, quando anunciou, sem consultar Moro e a própria direção da PF, a mudança de comando na superintendência do Rio de Janeiro. A reação foi imediata. O presidente não gostou, mas recuou. Em janeiro deste ano, houve nova investida. Dessa vez, Bolsonaro e seus aliados chegaram a levantar a possibilidade de separar o ministério de Moro em dois, deixando o ex-juiz da Lava Jato sem o comando da PF. Após nova reação, inclusive dos próprios apoiadores do presidente, Bolsonaro se segurou. Mas como mostrou Crusoé, a vontade dele não passou. Era preciso apenas encontrar o momento adequado para a troca.
Nessa terceira investida, além do desejo antigo de mudança para ter a corporação sob o comando de alguém mais próximo à família Bolsonaro, outros aspectos chamam a atenção, segundo policiais e integrantes do governo. A primeira delas é o momento. Por que Bolsonaro se desgastaria ainda mais em meio à pandemia para trocar o comando da PF e correr o risco de perder Moro?
A resposta de alguns investigadores aponta para dois pontos. O primeiro deles é que alguém mais próximo ditando as ordens na PF poderia focar em casos de desvios de dinheiro nas contratações relacionadas à pandemia em estados comandados por adversários políticos do presidente. Leia-se: São Paulo e Rio de Janeiro. Notícias sobre possíveis desvios e a necessidade investigá-los começaram a surgir, muitas delas carreadas por pessoas ligadas ao governo.
Outro ponto é a investigação aberta pelo Supremo Tribunal Federal a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, para apurar possível burla à Lei de Segurança Nacional pelos organizadores das manifestações do último domingo, 19. A PF é que fará todas as diligências ao longo do inquérito que já tem dois deputados da base do governo mencionados. Há ainda o inquérito sobre supostas ameaças a integrantes do STF por meio de ataques virtuais. Também neste caso, aliados do presidente estão na mira.
Ainda há, como pano de fundo, segundo integrantes do governo, o descontentamento de Bolsonaro com Moro. O presidente tem emitido sinais há tempos de que esperava mais empenho do ministro em sua defesa em momentos de crise, como no caso da pandemia. Na direção oposta, o ex-juiz sempre se manifestou publicamente numa linha mais próxima da de Luiz Henrique Mandetta, o ex-titular da Saúde, do que da do presidente. Também incomoda Bolsonaro a sombra política de Moro: ele nunca digeriu bem a alta aprovacão do ministro e as especulações de uma possível candidatura presidencial em 2022.
O nome defendido por Bolsonaro na PF, como já mostrou Crusoé, é o do atual secretário de segurança pública do Distrito Federal, o delegado Anderson Torres. Ele é próximo do presidente e de sua família, em especial do senador Flávio Bolsonaro. Corre por fora o atual diretor da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, o também delegado Alexandre Ramagem, benquisto por Carlos, o filho 02 de Bolsonaro.
Até o momento, a investida não chegou ao fim. Após ser informado oficialmente pelo presidente sobre a futura mudança na PF, na manhã desta quinta, Moro apontou para a porta de saída do ministério. Deixou para Bolsonaro, de novo, o peso da decisão: o presidente está disposto a pagar para ver a saída de seu ministro mais popular?
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