Queda de Maduro pode exportar facções venezuelanas ao Brasil?
Igor Lucena analisa como a possível deposição do ditador afetaria a segurança brasileira e o capital político de Lula
O ditador venezuelano, Nicolás Maduro, enfrenta um momento decisivo em seu país.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarou na terça, 3, que as forças americanas devem iniciar "muito em breve" operações terrestres contra o narcotráfico da Venezuela.
Crusoé entrevistou Igor Lucena, economista e Doutor em Relações Internacionais, para analisar os possíveis impactos desse cenário para o Brasil, especialmente para o governo Lula.
Ele alerta que uma eventual deposição ou fuga do ditador pode desencadear uma nova onda de refugiados rumo ao território brasileiro.
Dessa vez, segundo ele, com a presença de organizações criminosas venezuelanas que se beneficiam da proteção de Caracas.
De que maneira a possível queda ou fuga de Nicolás Maduro pode impactar o Brasil?
Quando falamos da queda ou fuga do regime venezuelano, estamos diante de uma crise humanitária iminente. Dificilmente a queda de Maduro manteria as estruturas do país funcionando. Geralmente, nesses cenários, há uma espécie de saqueamento institucional e físico, o que resultaria em uma terra quase sem lei.
Isso pode afetar o Brasil de duas maneiras: Primeiro, existe o risco de contratos existentes entre os países deixarem de ser honrados e a Venezuela já acumula dívidas com o Brasil. Mas o impacto mais grave seria o humanitário: a possibilidade de um conflito civil interno, desabastecimento e uma fuga massiva de pessoas para países vizinhos, especialmente Colômbia e Brasil.
Além disso, uma mudança brusca pode retirar criminosos do poder, o que pode gerar a migração de organizações criminosas para o Brasil. Não seria apenas um fluxo de refugiados em busca de sobrevivência, mas também a entrada de grupos armados e facções que hoje encontram proteção no regime venezuelano. Será necessário um controle muito rigoroso da Polícia Federal e até mesmo das Forças Armadas para impedir que isso aconteça.
Nos últimos meses, Lula optou por distanciar-se de Maduro, apesar de tê-lo recebido em 2023, em Brasília. Como essa aproximação pode ser usada contra ele nas eleições de 2026?
Lula tem se afastado de Maduro e Chávez, inclusive impedindo a presença da Venezuela no BRICS estendido. Do ponto de vista pragmático, ele sabe que a Venezuela é um parceiro ruim e que não está pagando o que deve. O problema é que, ideologicamente, há uma parcela da esquerda brasileira que insiste em colocar a Venezuela como um modelo a ser protegido, algo completamente distante da realidade.
Em caso de queda do regime ou até de uma intervenção externa, a grande questão será qual postura Lula adotará: apoiar uma transição democrática com novas lideranças, como Maria Corina Machado ou González, ou tentar defender Maduro?
Se escolher essa última alternativa, o desgaste será enorme, pois o governo brasileiro ficaria isolado e associado à defesa de um ditador. Isso pode gerar um custo político pesado nas urnas, com a oposição explorando a narrativa de que Lula apoia regimes autoritários.
O senhor acredita que o Brasil ofereceria asilo a Maduro ou o custo político seria alto demais?
Muito improvável que o Brasil conceda asilo a Maduro. O custo político seria altíssimo.
Já houve desgastes consideráveis com a concessão de refúgio a Cesare Battisti e mais recentemente com a ex-primeira-dama do Peru. Oferecer asilo a um ditador que responde por crimes internacionais daria margem para que a oposição afirmasse que o Brasil virou refúgio para criminosos de regimes autoritários. Seria um prejuízo interno e global à imagem do país.
Como o senhor avalia o posicionamento atual do Brasil — maior potência regional — diante da crise venezuelana?
A postura brasileira é, infelizmente, vexatória. Durante anos, o Brasil sustentou, ainda que indiretamente, os governos Chávez e Maduro, com financiamentos e apoio econômico que fortaleceram o regime e enfraqueceram a oposição.
O governo brasileiro sempre afirmou que as decisões da Venezuela deveriam ser tomadas pelo povo venezuelano, mas, ao apoiar financeiramente o regime, fez justamente o contrário: deu sobrevida a um governo que se perpetuou no poder de forma autoritária. Mesmo nas eleições sem transparência, amplamente condenadas pelo mundo livre, o Brasil não teve coragem de se posicionar com firmeza.
O fim da ditadura venezuelana será positivo para toda a região, mas principalmente para o próprio povo da Venezuela, que precisa urgentemente de oportunidade, liberdade e prosperidade. O Brasil, como liderança regional, deveria estar ao lado desse processo, e não do atraso que o regime representa.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)