A esquerda está manifestando a “extrema-direita”

Obviamente, nem sempre se trata de inocência e de medo do mundo. Sei bem. A agência Mynd8, que está fazendo uma campanha para as pessoas tirarem suas contas do Nubank porque a CEO do banco divulgou um convite de evento da Brasil Paralelo com Jordan Peterson, pode ser chamada de muitas coisas, mas “inocente” não é uma delas. Obviamente para as pessoas que estão comandando as coisas lá na esquerda não se trata tanto de inocência mas da conveniência de colocar um limite bem, bem próximo para o que é considerado “extrema-direita“, para que as pessoas desinformadas ou congenitamente bobas tenham medo de se aproximar desse limite.

Mas e os acima-mencionados desinformados e congenitamente bobos? Por que falam tão alarmados da “extrema-direitice” de Jordan Peterson ou da Brasil Paralelo? No caso deles se trata de fato de um grau espantoso de inocência e de medo do mundo. E imagine como essas mesmas pessoas vão se sentir no dia em que se depararem com um autêntico membro da “extrema-direita“.

“Aqui um artigo sobre Jordan Peterson, o guru da extrema-direita”, escreveu o professor de jornalismo Marcelo Träsel. Caramboletas! O “guru da extrema-direita“, Jordan Peterson, um homem tão firmemente e inflexivelmente moderado que é o centro metafísico do mundo, em torno de quem os continentes giram! Se Jordan Peterson é um “guru da extrema-direita“, de quais espectros políticos Alan de Benoist ou Varg Vikernes são líderes? Ou Mishima? Ou o Bronze Age Pervert (que aliás, cá entre nós, acho divertido)?

Mesmo eu que sou um reles liberal, mesmo eu que sou prudente e sofisticado com todas as conotações ridículas atribuídas aos liberais num famoso vídeo de canal de YouTube “Brasileirinhos”, mesmo eu quando ouço alguém falar da extrema-direita, bom — acho que estão falando de mim. Passando perto da tevê, ouço o latino lá de colete da GloboNews falando alarmado do avanço da extrema-direita, e eu paro pra ouvir o que ele está falando de mim. Um grupo de ministros vai para Lisboa para participar de uma conferência sobre “os perigos da extrema-direita”, e tenho a certeza de que foram para Lisboa falar mal de mim pelas costas.

Essas pessoas nunca ouviram falar da Lei da Atração? Não leram O Segredo? Parecem ser, pelo menos os desinformados e congenitamente bobos, o tipo de pessoa que acredita nessas coisas. Pois se acreditam, não ocorre a eles que, com essa fixação na extrema-direita, é isso mesmo que eles estão manifestando? E não veem que isso acontece de modo bastante natural? Não veem que mais e mais pessoas normais, ao serem acusadas de extrema-direitice, tomam o insulto como um elogio e reforçam em si mesmos, por birra, por pura birra, crenças que talvez possam ser chamadas corretamente de “de extrema-direita”?

*

Para um conservador, a história às vezes parece um pêndulo que vai para um lado só.

“Uma hora vai voltar. Uma hora eu sei que o pêndulo vai voltar”, você se diz, porque é impossível para um pêndulo ir para um lado só; mesmo que ele gire, faça um círculo completo, o que um pêndulo nem devia fazer pois não é para isso que ele foi feito, mas mesmo que o pêndulo não retroceda na direção contrária e continue avançando até girar, uma hora ele volta ao ponto onde estava. Não é?

É o que diz a lógica, pelo menos; mas o pêndulo da história está indo para um lado só desde, como dizem os letristas de escolas de samba, “tempos imemoriais”.

Mas todos os dias eu e um amigo conversamos sobre os sinais de que o pêndulo finalmente está voltando. Às vezes é ele que argumenta que isso já está começando a acontecer; às vezes sou eu. Um dia, talvez, num futuro distante, um de nós dirá que o pêndulo está começando a voltar, e estará de fato correto.

*

Vi uma foto do presidente argentino Javier Milei com a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni na cúpula do G7, e fiquei dias tentando criar o segundo verso da música “Meloni e Milei” com a melodia de “Lay, Lady, Lay”, do Bob Dylan.

Nas últimas três ou quatro noites fiquei horas acordado na cama tentando continuar essa música, sem conseguir. O timing já passou faz tempo, evidentemente. A cúpula do G7 aconteceu semana passada. Mesmo que eu aparecesse de repente com o segundo verso de “Meloni e Milei”, teria que lembrar as pessoas da existência desse encontro entre os dois e só depois cantar a música, o que estragaria bastante o efeito. Mas mesmo assim continuo tentando, obsessivamente.

Uma música que consegui fazer nessas noites insones, no entanto, é um jingle para os salgadinhos Ebicen, para ser cantado com a melodia de “Cuide Bem do Seu Amor”: “Ebicen pro seu amor, seja quem for…”

Alexandre Soares e Silva é escritor

As opiniões emitidas pelos colunistas não necessariamente refletem as opiniões de O Antagonista e Crusoé