Eleições no México: Saiba tudo da disputa pela Presidência neste domingo
Disputa pela Presidência mexicana recorda eleição de Dilma Rousseff em 2010; legado de Andrés Manuel López Obrador é misto
O México realiza as maiores eleições de sua história neste domingo, 2 de junho, que ainda definirão a Presidência da República pelos próximos seis anos.
As urnas estarão abertas das 8h às 18h no horário local. Os resultados serão anunciados ainda pela noite, ou entre 1h e 2h de segunda, 3, na hora de Brasília.
Além do recorde em eleitores, quase 100 milhões, o número de cargos em disputa também é inédito.
Graças a uma reforma constitucional de 2014, que vem concentrando o calendário eleitoral, os mexicanos votam neste domingo para mais de 20 mil postos a nível nacional, estadual e municipal — no Brasil, em 2022, havia menos de 2 mil.
O pleito mais importante, claro, é para a Presidência da República. Nessa corrida, o México se vê em um cenário que recorda a eleição de Dilma Rousseff, em 2010.
O atual presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, eleito em 2018, não pode concorrer, porque a Constituição proíbe a reeleição.
Com menos da metade do mandato cumprido, AMLO já dava declarações públicas sobre seus favoritos à sua sucessão.
Até 2022, já estava confirmado nos bastidores que a escolhida a dedo era a então chefe de governo da Cidade do México, Claudia Sheinbaum (de vestido grená na foto). A opção de Lula por Dilma também se deu com cerca de dois anos de antecedência da eleição.
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Sheinbaum é a franca favorita neste domingo. Ela tem 20 pontos percentuais de vantagem nas pesquisas sobre a segunda colocada, a senadora Xóchitl Gálvez.
Essa diferença, que se mantém por meses, é ainda mais significativa porque a votação no México se dá em turno único. Não adianta aguardar o voto do contra.
Seja Sheinbaum ou Gálvez, o México se encaminha neste domingo a eleger sua primeira presidente mulher.
Assim como Lula carregou Dilma ao Palácio do Planalto, a popularidade de López Obrador é o principal ativo da campanha de Sheinbaum.
“As pessoas veem Claudia Sheinbaum como quem garante a continuidade e toma a bandeira de López Obrador, mesmo sem ter tanto carisma”, diz o jornalista mexicano Hernán Gómez.
Ele é autor de um dos principais livros de análise sobre o lopezobradorismo, “AMLO y la 4T: una radiografia para escépticos” (2021).
López Obrador cerca os 60% de aprovação na maioria dos levantamentos. “Os setores populares têm uma identificação de classe com AMLO. É como passou com Lula. Existe uma ideia de representação que vai além de governar bem ou mal”, diz Gómez, que viveu no Brasil entre 2007 e 2009.
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De fato, o governo de López Obrador apresentou resultados mistos nos dois principais temas da sociedade mexicana, economia e segurança pública.
Pobreza em queda, e a economia também
Se considerado o aumento da população mexicana, AMLO vai entregar o México com uma economia menor que a recebida em 2018.
O PIB per capita, que mede a produção de riqueza por 100 mil habitantes, deve cair 0,85% ao final do mandato. Os dados são de pesquisa publicada em abril pela instituição financeira mexicana Banco Base.
“A economia do país piorou”, diz Gabriela Siller, diretora de análise econômica do Banco Base.
Os eleitores não sentem a piora, porque o governo impulsionou gastos com programas de transferência de renda — outras medidas também tiveram impacto, embora mais difícil de medir, como os aumentos no salário mínimo.
“As pessoas que recebem transferências do governo se sentem otimistas, porque a economia familiar melhorou, apesar de a economia do país ter piorado”, diz Siller.
Mais de 5 milhões de mexicanos, cerca de 4% da população, saíram da pobreza durante os quatro primeiros anos do governo de AMLO. Os dados oficiais são publicados a cada biênio, sendo o mais recente de 2022.
Segundo levantamento do jornal El País, as transferências diretas explicam 20% do crescimento dos ingressos das famílias da chamada classe média-baixa, que estão entre os 10% mais pobres e os 50% mais ricos.
Apesar da redução na pobreza geral, 400 mil entraram na pobreza extrema, um crescimento de 0,1%.
Diferente da maioria dos países, dentre eles o Brasil, o México não mede pobreza apenas por ingressos.
O governo mexicano também considera a autodeclaração de carências específicas. A que registrou maior aumento foi acesso a serviços de saúde pública. Essa é uma das áreas mais precarizadas pelo governo López Obrador.
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As transferências de renda podem estar contribuindo para reduzir a pobreza, ao menos a geral, mas não são uma medida sustentável a longo prazo.
“O ruim é que essas transferências geram uma pressão maior sobre as finanças públicas. Uma hora, outros gastos terão que ser cortados para continuar com essas transferências já que elas estão previstas em lei”, afirma Siller.
López Obrador vai entregar ao seu sucessor o maior déficit fiscal dos últimos quatro governos — deve-se considerar que ele é o primeiro presidente de esquerda no país em décadas.
Oportunidade desperdiçada
Quando Lula avançou com programas de transferência de renda nos anos 2000, a alta das commodities sustentava os gastos públicos. O PIB per capita do Brasil multiplicou por quase 4 ao longo dos dois primeiros mandatos do petista.
AMLO também tem um cenário internacional favorável, embora de menor importância.
Desde a década passada, o México passou a ser destino de realocamento da produção de multinacionais americanas da China a países mais próximos dos Estados Unidos.
Segundo o Banco Base, o México sob López Obrador aproveita apenas 10% do potencial econômico desse fenômeno, chamado nearshoring.
Os principais motivos para o desperdício são a falta de incentivos fiscais e de projetos de infraestrutura, assim como a incerteza do mercado sobre a política econômica, todos sequelas do descuido fiscal de AMLO.
Continuidade à guerra ao narco
A crise de violência no México segue em alta desde 2006, quando o governo começou a usar as Forças Armadas para combater o narcotráfico.
No governo do presidente Felipe Calderón, que inaugurou essa política, reverteu-se mais de uma década de tendências de queda nos números de homicídios.
O país ultrapassou o Brasil, em 2018, já na gestão de Enrique Peña Nieto. No mandato de AMLO, os homicídios e outros crimes violentos, como sequestros, seguem em alta, embora tenham desacelerado.
Um dos lados mais notórios da atual onda de violência no México é a crise de desaparecidos. Há cerca de 105 mil desaparecidos no país. Com quase o dobro da população mexicana, o Brasil tem menos de 75 mil registros.
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Apesar da guerra ao narco estar relacionada causalmente à crise de violência, boa parte da população mexicana é favorável à militarização, que foi intensificada por López Obrador.
“Muita gente, em especial no interior, considera necessário e se sente mais segura com as Forças Armadas”, diz o jornalista mexicano Hernán Gómez.
Segundo pesquisa encomendada pelo El País em 2022, quando o governo determinou a manutenção dos militares na segurança pública até 2028, três de cada quatro mexicanos apoiavam a medida.
Insegurança institucional
As organizações civis e funcionários do governo que denunciam as violações de direitos humanos cometidas pelo Estado na guerra ao narco passaram a ser perseguidas.
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AMLO impulsionou ofensas públicas a adversários e inaugurou o uso de milícias digitais para descredibilizar a crítica, uma de suas características populistas, de acreditar que o governo é o único representante legítimo da sociedade.
“Na segunda metade do mandato, após perder a maioria absoluta no Congresso, López Obrador começou a ficar brigando demais com os seus opositores. Essa foi a maior mudança ao longo do mandato”, diz Gómez.
Um dos principais alvos de AMLO foi justamente a Justiça Eleitoral.
O atual mandatário tentou três vezes implementar uma reforma eleitoral que sucatearia o Instituto Nacional Eleitoral (INE), o órgão responsável por organizar as eleições, o TSE mexicano.
As duas primeiras fracassaram e a terceira está em trâmite no Congresso.
Os constantes ataques ao INE e à credibilidade das eleições afasta o voto da classe média das grandes cidades.
A presidenciável da oposição, Xóchitl Gálvez, conseguiu formar aliança com o movimento apartidário pela autonomia do INE, o Marea Rosa, e mobilizou mais de 90 mil pessoas na frente do palácio presidencial, no centro da Cidade do México, em 19 de maio.
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O aparelhamento de outros mecanismos independentes de controle, como o Ministério Público e a agência de transparência do governo federal, minaram o combate à corrupção, uma das principais bandeiras de AMLO nas eleições de 2018.
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