Adriano Machado/Crusoé

‘Saída do FMI do Brasil evidencia clima de eterna 5ª série do governo’, diz economista

16.12.21 17:09

O Fundo Monetário Internacional, FMI, afirmou nesta quinta, 16, que fechará seu escritório no Brasil. O anúncio ocorreu depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes (foto), criticou a instituição por previsões erradas. “Podem passear lá fora. Vieram aqui para prever uma queda de 9,7%, e a Inglaterra ia cair 4%. Nós caímos 4%, a Inglaterra, 9,7%“, disse Guedes. O ministro ainda atacou Ilan Goldfajn, ex-presidente do Banco Central, que assumirá o cargo de diretor para o Hemisfério Ocidental do FMI, em janeiro. Para o economista Roberto Ellery, da Universidade de Brasília, a saída do FMI do Brasil é negativa, afasta investimentos e atrapalha a entrada do país na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, a OCDE. Segue a entrevista que Ellery deu a Crusoé pelo telefone.

Como o sr. avalia a retirada do FMI do Brasil?
Eu até poderia entender isso no contexto de que as nossas reservas internacionais estão muito altas. Como o principal papel dessa instituição é financiar países com problemas na balança de pagamentos, quando falta dólar, podemos entender que sua atuação não é tão necessária ao país. Mas o que chamou minha atenção foi outra coisa. A saída do FMI evidencia esse clima de eterna 5ª série do governo. Então o ministro da Economia, Paulo Guedes, pediu a saída do FMI alegando que eles erraram previsão? Mas quem foi que acertou previsão nesta pandemia? Mais uma vez, o Brasil passou um recibo ruim. O governo mostrou que não leva nada a sério e que qualquer instituição que o desagrade será atacada. O que podia ser uma saída negociada, combinada, virou um vexame.

Que consequências isso pode ter?
O Brasil quer entrar na OCDE. É claro que o pessoal dessa organização está assistindo ao que está acontecendo. O FMI é uma agência respeitada em todo o mundo, inclusive na OCDE. Então foi mais um gol contra. É bom ter um bom diálogo com o FMI. Eles fazem um acompanhamento de todos os países e publicam um relatório lido por todos. Eu, quando quero comparar as dívidas públicas dos países, leio o relatório deles. Todo mundo nessa comunidade de especialistas faz isso. Isso que aconteceu agora é um absurdo, algo totalmente fora do razoável. 

A crítica de que o FMI errou previsão faz sentido?
É uma crítica boba. Basta olhar as previsões do Banco Central para a inflação. Não se realizaram. O próprio Paulo Guedes disse que as privatizações iam gerar mais de 1 trilhão de reais em 2019. Não aconteceu. Então ele quer criticar os outros porque erraram previsões? Vai desmerecer uma instituição por causa disso? Essa instituição é importante. Já ajudou o Brasil no passado e pode ajudar no futuro. E o futuro a Deus pertence. 

Mas não é o caso de precisar de ajuda agora, certo?
O Brasil não tem grau de investimento. Ou seja, é um país considerado arriscado pelas agências de risco. Nós temos um problema fiscal sério. Estamos longe de ser um caso resolvido. Mas, mesmo se tivéssemos um cenário de 100 anos de progresso pela frente, esse tipo de postura não condiz. O Guedes falou mal do Ilan Goldfajn. Mas o Ilan é um cara que todo mundo respeita na comunidade, que tem uma formação acadêmica impressionante, que esteve em Princeton e realizou um ótimo trabalho no Banco Central. 

Essa notícia pode afastar investimentos?
Pode. E pensar que não foi nem por causa de uma crítica, mas de uma previsão ruim… No fundo, sabemos que o problema é outro. A questão é que o Guedes está incomodado. Ele está vivendo um negacionismo econômico. Quando as instituições apresentam números diferentes dos dele, Guedes se revolta. Então, para ele, todo mundo está errado. Os agentes do mercado estão equivocados, os bancos também. O Banco Central acabou de botar um crescimento baixo para o ano que vem. Daqui a pouco, o Guedes vai dizer que eles também estão errados. A mensagem para o mundo é que o Brasil tem um governo que não aceita que digam qualquer coisa fora da narrativa oficial, a qual faz uma avaliação cada vez mais distante da realidade. 

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