'Sou contra manifestações partidárias de jogador', diz ex-secretário-geral da CBF
No último mês, o Brasil vivenciou um novo e inusitado capítulo da polarização política. A realização da Copa América, que termina neste sábado, 10, com a final entre Brasil e Argentina, no Maracanã, provocou mais um confronto. O embate se deu entre os apoiadores de Jair Bolsonaro, que autorizou o evento a pedido da CBF,...
No último mês, o Brasil vivenciou um novo e inusitado capítulo da polarização política. A realização da Copa América, que termina neste sábado, 10, com a final entre Brasil e Argentina, no Maracanã, provocou mais um confronto. O embate se deu entre os apoiadores de Jair Bolsonaro, que autorizou o evento a pedido da CBF, e os opositores do presidente, que viram na decisão mais um ato negacionista em relação à pandemia e uma tentativa de cacifá-lo politicamente com o futebol.
A polêmica ocorreu em meio a uma denúncia de assédio sexual que resultou no afastamento do presidente da CBF, Rogério Caboclo, no início de junho. Foi Caboclo quem pediu a Bolsonaro para realizar a Copa América no Brasil depois que Argentina e Colômbia se recusaram a sediar a competição por causa do aumento do número de casos de Covid-19. No meio desse turbilhão estava Walter Feldman, demitido recentemente do cargo de secretário-geral da CBF após seis anos na entidade.
Antes de assumir o posto na CBF, em 2015, no auge do escândalo de corrupção conhecido como Fifagate, que levou à prisão de José Maria Marin e ao banimento de Marco Polo Del Nero, dois ex-presidentes da confederação, Feldman foi deputado pelo PSDB e um dos coordenadores da campanha presidencial de Marina Silva em 2014. Nesta entrevista a Crusoé, o ex-dirigente da CBF fala sobre a relação da política com o futebol e o episódio envolvendo a Copa América.
O sr. saiu da CBF em um momento conturbado, com o presidente Rogério Caboclo afastado após acusação de assédio sexual e os clubes se organizando para criar uma liga independente da confederação. Qual foi o motivo da sua demissão?
Uma das minhas tarefas institucionais era abrir canais com instituições públicas e privadas, no plano federal, estadual e municipal, com o Congresso Nacional e, principalmente, com os clubes brasileiros, criar uma relação forte que até então não existia. Porque a relação histórica da CBF é com as federações estaduais. Com a saída do Rogério Caboclo e essa crise toda, os clubes da Série A viram uma oportunidade de se organizarem e levantarem novamente a ideia de criação da liga, que é uma demanda frequente dos clubes. Eles marcaram uma reunião e pediram uma recepção da CBF. Eu conversei com o presidente Nunes (Coronel Nunes) e com os vices, recebemos os clubes, mas houve manifestação de alguns vices de que reunião foi açodada e que as demandas foram muito fortes para o momento que a CBF passa. Baseado nesse papel meio conflituoso entre as federações e os clubes, no qual eu navegava, esse talvez tenha sido o fato desencadeante para que um grupo de vice-presidentes dissidentes reivindicasse ao presidente Nunes a minha saída, até porque estamos nos aproximando do período eleitoral, onde federações e clubes vão definir o futuro da CBF.
A Copa América foi muito criticada porque o Brasil decidiu sediar o torneio em um momento crítico da pandemia. Por que a CBF aceitou o pedido da Conmebol e qual foi a participação do presidente Jair Bolsonaro na realização desse evento no Brasil?
O representante do Brasil na Conmebol era o Rogério Caboclo. A Copa América estava agendada há um bom tempo, recebeu a recusa da Argentina e da Colômbia, e no momento derradeiro, o presidente da Conmebol pergunta ao Caboclo se poderia ser no Brasil. Imediatamente, o Caboclo pergunta ao presidente Bolsonaro, que coloca sua total disposição e ajuda em realizá-la, e a Copa América é anunciada no Brasil. Portanto, foi um pedido do presidente da Conmebol, uma aceitação do presidente da CBF, condicionada à aprovação do presidente da República. A diretoria não foi consultada e a seleção brasileira e a comissão técnica discordaram dessa decisão.
E o sr. foi favorável?
Em nenhum momento fui consultado, mas eu era um braço operacional e realizei a maioria dos contatos com os governos para a escolha das sedes. Eu entendia perfeitamente a posição dos jogadores e do Tite em relação a esse conflito. Jamais, em nenhum momento da história houve um conflito tão manifesto entre a seleção e o presidente da CBF. Era um tema que deveria ser tratado com muito cuidado. A seleção brasileira é o que sustenta a CBF. Os recursos valiosíssimos que entram dos patrocinadores da seleção fazem com que a CBF injete dinheiro nos campeonatos.
O sr. acha que o presidente Bolsonaro tentou mesmo capitalizar politicamente com a realização da Copa América no Brasil?
Eu acho que o Caboclo deu a ele (Bolsonaro) essa oportunidade, ao oferecer essa decisão ao presidente da República. Ele foi colocado no palco dos acontecimentos. O equívoco do Caboclo foi não construir essa decisão internamente antes de demandar o apoio do presidente da República.
Na sua opinião, o Caboclo fez isso para tentar se salvar na presidência da CBF?
Não vejo isso, sinceramente. Ele recebeu essa demanda da Conmebol. O Caboclo foi muito importante na construção do calendário do futebol em 2020. Ele tinha clareza de que os campeonatos não poderiam parar, baseado em protocolo sanitário muito consistente e com uma logística que já era permitida com a retomada da malha aérea e dos hotéis, na pandemia. Então, para ele seria mais um evento. Estamos fazendo todas as competições, por que não a Copa América? Eu não vi como algo instrumental para o projeto dele. Era o motor dele. Todos nós na CBF sabíamos do desejo dele de não paralisar nenhuma competição. A visão dele era de que bola rolando alimenta a cadeia produtiva, gera contratos e que estávamos todos protegidos sanitariamente, o que efetivamente se comprovou. Não vi nenhuma tentativa de se apropriar da Copa América.
O sr. é a favor de jogador se manifestar politicamente?
Manifestações partidárias de jogador eu sou contra. Ele precisa tomar cuidado porque o torcedor dele é de todos os partidos. A paixão pelo jogador e pelo clube é tão intensa que se ele partidarizar ou politizar ele contamina essa paixão. Acho que ele pode se manifestar em relação a questões da sociedade, como o racismo, assédio, preconceito, igualdade de gênero, porque ele é uma referência, pode ajudar a sociedade a ter compromissos com causas mais nobres.
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Comentários (6)
Jurandir
2021-07-12 06:45:00qualquer um pode se manifestar, jogadores, artistas ou jornalistas desde que seja contra o governo federal ou favorável a esquerda, caso contrário será cancelado, simples assim, só não vê quem não quer
Celso
2021-07-11 19:27:15A posição desse senhor é brincadeira, faz parte da cúpula tudo certo
KEDMA
2021-07-11 09:53:24Se o grande compromisso da CBF é com os "dividendos monetários", o jogador de futebol pode sim se manifestar politicamente.
Eduardo
2021-07-11 09:24:20Pois eu Cidadão Brasileiro tenho uma opinião dogmática: além de péssimo presidente o nosso (seus e senhores/as fanáticos) é muito azarado (e bota azar nisso!).
PAULO
2021-07-10 19:58:33Estamos num país em que os comandantes das Forças Armadas, se manifestam politicamente, como agora, em defesa dos militares políticos e contra a nossa democracia. General de 3 estrelas discursa em ato político. Jogador de futebol é um cidadão. Se quiser se posicionar, que se posicione. Pelo menos jogador não tem ARMAS PAGAS POR NÓS CONTRIBUINTES, para nos ameaçar.
Chega
2021-07-10 17:32:03O jogadores de futebol pagam uma grana alta de imposto de renda e não podem se expressar politicamente, e os dirigentes estão sempre envolvidos em maracutaias e podem se expressar e se envolver politicamente, esta tudo errado no Brasil, 2022 vamos mais uma vez tentar arrumar o Brasil dessas castas politicos social que tentam dominar todo o pais, com o pais todo aparelhado.