Para frear a tragédia, o Congresso quer ser o adulto na sala
A inação do governo federal no combate à pandemia e o descaso do presidente Jair Bolsonaro com a crise sanitária motivaram uma romaria de governadores, embaixadores e empresários em busca de interlocutores em Brasília. Diante da escalada das mortes e das dificuldades em obter vacinas, deputados, senadores, e, sobretudo, a cúpula do Legislativo passaram a...
A inação do governo federal no combate à pandemia e o descaso do presidente Jair Bolsonaro com a crise sanitária motivaram uma romaria de governadores, embaixadores e empresários em busca de interlocutores em Brasília. Diante da escalada das mortes e das dificuldades em obter vacinas, deputados, senadores, e, sobretudo, a cúpula do Legislativo passaram a ser abordados com pedidos desesperados de ajuda. Convencidos de que nem a trágica marca de 300 mil mortos será suficiente para mudar o comportamento do presidente Jair Bolsonaro, gestores locais e o setor produtivo cobram que o Congresso Nacional assuma o papel de adulto na sala. A estratégia de escantear Bolsonaro e dar mais protagonismo ao Parlamento, entretanto, esbarra em empecilhos legais e políticos. Pela Constituição, cabe ao governo federal planejar e executar políticas públicas, nomear e exonerar ministros e elaborar o orçamento. Parlamentares têm ação limitada e, sem a participação ativa de Bolsonaro e seus ministros, não podem tomar completamente as rédeas da luta contra a pandemia, mesmo diante de um presidente da República inábil e inoperante.
Do ponto de vista político, o Congresso tem um extenso rol de mecanismos para pressionar o Planalto e forçar Bolsonaro a sair da letargia negacionista -- da obstrução de votações, passando por convocações de autoridades, pela abertura de CPIs, até ao impeachment. Mas boa parte desses artifícios exige a proatividade dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco. Eleitos com apoio decisivo de Jair Bolsonaro há pouco mais de um mês, eles ficaram em cima do muro nos últimos meses, sem cobranças mais incisivas ao governo. Em mais uma demonstração de boa vontade e tolerância com Bolsonaro, os presidentes das duas casas toparam embarcar em um “pacto nacional” para a luta contra o coronavírus. Para o meio político e integrantes do Judiciário, o acerto institucional anunciado com pompa não passa de um engodo. Depois da repercussão negativa do acordão entre os poderes e irritado com o fato de Bolsonaro estar represando indicações políticas do Centrão, Lira subiu o tom pela primeira vez e anunciou que, se não houver mudanças de rumo, o Parlamento poderá adotar “remédios políticos amargos”. Na Esplanada, a dúvida é se a advertência do líder do Centrão terá como resposta uma efetiva correção de trajeto ou uma nova oferta de cargos para acalmar os ânimos.
O comitê de crise formalizado por decreto nesta quinta-feira, 25, prevê uma articulação entre o Legislativo e o Executivo para conter a disseminação rápida da Covid-19. A iniciativa surge um ano após o início da pandemia, quando variantes mais mortais já circulam sem controle pelo país. Bolsonaro até tentou vender a tese do freio de arrumação, mas o primeiro gesto teve cara de mais do mesmo: apesar do discurso de “união nacional”, o presidente da República vetou a presença de adversários políticos e saiu da reunião com louvações ao chamado “tratamento precoce”, condenado diuturnamente por especialistas. Sobre a articulação centralizada de medidas mais rígidas de isolamento, alternativa implorada por governadores e prefeitos, nenhuma palavra. “Quem conhece Brasília sabe o nome disso: embuste. É só mais uma estratégia para dividir desgastes”, afirmou o senador Alessandro Vieira, do Cidadania. “A melhor forma de o Congresso colaborar no combate à Covid é com a abertura de uma CPI, para que haja a atribuição de responsabilidades. Bolsonaro continua com a política genocida de boicotar o isolamento, as medidas de controle, atacar governadores e retardar o processo de vacinação”, acrescentou o parlamentar.
Um pedido com o número necessário de assinaturas para instalação de uma CPI até foi entregue a Pacheco, mas ele, por ora, se esquiva como pode do assunto. Diante do cenário, Vieira e colegas do Cidadania apresentaram um mandado de segurança ao Supremo Tribunal Federal para cobrar a abertura da comissão de inquérito. A expectativa no Congresso é de que o ministro Luís Roberto Barroso conceda uma liminar para que CPIs possam ser criadas sem a necessidade de anuência do presidente do Senado. Barroso tem sido o integrante do Supremo mais crítico à postura de Bolsonaro e ironizou a formação de um “pacto nacional”. “Fico feliz de saber que, com um ano de atraso, decidiram montar uma comissão, depois de 300 mil mortos”, afirmou o ministro. Já Marco Aurélio Mello jogou a responsabilidade para o Executivo sobre a condução da pandemia. “Evidentemente, o que estiver à altura do Legislativo e do Judiciário, segundo a Constituição Federal, se fará, sabendo-se que o Judiciário só age mediante provocação. Os poderes são harmônicos e independentes, mas ninguém substitui o Executivo, a quem cabem as políticas públicas”, afirmou a Crusoé. Se o Supremo tirar poderes de Pacheco e forçar a abertura da comissão para investigar os erros no combate à pandemia, a pressão sobre o governo aumentará exponencialmente. “Uma liminar do Supremo possibilitará que a gente abra uma CPI na Câmara também”, antecipa o deputado Kim Kataguiri, do DEM.
Nos bastidores, a insatisfação do Centrão já preocupa o entorno de Bolsonaro – sobretudo depois “do sinal amarelo” aceso pelo presidente da Câmara. O atrito aumentou com a nomeação de Marcelo Queiroga para o Ministério da Saúde por indicação do senador Flávio Bolsonaro – Lira esperava ter ascendência sobre o cargo –, a resistência do presidente em acomodar um aliado do presidente na Câmara na vice-presidência do Banco do Brasil e com o voto do ministro do STF Kassio Marques em favor de Sergio Moro, por influência de Bolsonaro, o que contrariou o Centrão, apinhado de parlamentares encalacrados na Justiça. Segundo interlocutores de Lira, a pressão do empresariado, que ficou ao lado de Bolsonaro em 2018, mas dá sinais de descontentamento com o ritmo lento da vacinação, também contribuiu para a elevação do tom dos discursos.
As novas cobranças do Centrão por espaço na Esplanada podem acabar respingando no chanceler Ernesto Araújo. O principal representante da ala ideológica no primeiro escalão, Araújo há muito perdeu qualquer poder de negociação com grandes potências mundiais, como a China e os Estados Unidos, e tem sido responsabilizado pela falta de jogo de cintura nas negociações pelas vacinas contra a Covid-19. Nas últimas horas, segundo O Antagonista, começou a circular o nome do senador Nelsinho Trad para o comando do Itamaraty. A escolha de Trad, que presidiu a Comissão de Relações Exteriores do Senado, atenderia ao interesse do PSD no governo.
Quem também está ameaçado é o assessor para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, também do time dos ideológicos. Durante a sessão do Senado em que foram discutidas ações do Brasil para a obtenção de vacinas, Martins fez um gesto que provocou a ira dos senadores, irritou o presidente da República e até integrantes da ala militar. "Senado não é lugar de brincadeira", disse o presidente da casa, Rodrigo Pacheco. Sua situação no governo é considerada insustentável. Mas o presidente não pretende deixar o aliado no sereno. A ideia é reacomodá-lo num cargo de assessoria fora do Palácio do Planalto.
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Comentários (10)
SONIA
2021-03-29 10:27:55Governadores e Prefeitos, virem-se! Ou peçam ajuda aos seus padrinhos: aquela gente do STF
Maria
2021-03-26 20:24:06E tudo vai acabar em pizza no dia D e na hora H. Quem viver verá!
Antonio
2021-03-26 18:15:47Bem que essa CPI acho que seria boa. Iria descobrir para onde foram os bilhões que o Governo enviou aos estados e Municípios para cuidar da pandemia.
EMANUEL
2021-03-26 18:03:38É possível iniciar uma CPI sem anuência do presidente do Senado? Então vamos começar com a CPI da Lava-Toga. Que tal!!!
AIRTON
2021-03-26 16:05:35O Congresso só está cobrando a fatura e não querem mudar muita coisa não. Só querem o Bolsonóquio de quatro. E ele O Incompetente, quer ficar no cargo e não ir para a cadeia junto com a familicia . Esta pagando o preço. Só que com o nosso suor. Esse é o pior presidente de todos os tempos. Pior até que a Dilmanta.
José
2021-03-26 15:00:29Então, os antas/crusoé emitem opiniões de seus entendimentos, o certo é que querem desestabilizar o PR tentando derrubar ministros, no caso Pazuello já disse quem o obrigou a pedir o boné, o centrão, querem por que querem o pixule e isso esses antas não derem o devido destaque. Muita ciumeira e ganância aflorada desse centrão, depois de Ernesto Araújo será a vez de Ricardo Sales, vai vendo...
Olívia
2021-03-26 14:24:14Teatro. A única ação eficiente do congresso teria sido impichar o genocida diante do primeiro pedido.
MENEZES88
2021-03-26 13:16:46BOA MATÉRIA..RESUMINDO EM POUCAS PALAVRAS: A HORA⏳⏰ DO BOZO ESTÁ CHEGANDO, AOS POUCOS VÃO FRITANDO ESSE GENOCIDA DE MERDA. AINDA VEREMOS TODOS DESTA QUADRILHA RESPONDENDO PELAS MAIS DE 300 MIL MORTES.🚔🗡⚔☠
Maria Regina Fernandes Cruz
2021-03-26 13:09:26Torcendo para que o Barroso decida pela CPI
Palhaço Bozo
2021-03-26 12:50:40Mentira deslavada dos presidentes do Congresso. O que eles querem é que o Bozo cumpra com o compromisso de disponibilizar estatais e ministérios para os partidos corruptos continuarem a mamar gostosamente nas tetas governamentais. É só o Bozo abrir as pernas que toda essa pressão para combater a pandemia acaba. De um jeito ou de outro, vamos continuar vendo milhares de mortes/dia por incompetência criminosa do Bozo e sua política negacionista e genocida de enfrentamento da pandemia.