Reprodução/FacebookWalter Faria, dono do Grupo Petrópolis: time estrelado de advogados

Recuperação sob suspeita

Negócio bilionário em favor do grupo Petrópolis contou com juíza que já trabalhou com filho do ex-corregedor-geral de Justiça Luís Felipe Salomão
08.08.24

Homologado em outubro de 2023, o processo de recuperação judicial do grupo Petrópolis tem sido questionado por alguns credores e por integrantes do Ministério Público do Rio de Janeiro por indícios e vícios procedimentais e falhas processuais encabeçadas pela então juíza da 5ª Vara Empresarial do Estado do Rio de Janeiro, Elisabete Franco Longobardi.

Entre os vícios, talvez o mais gritante seja o fato de que a juíza responsável pelo processo nomeou como perito judicial um dos advogados responsáveis pela recuperação judicial do grupo Petrópolis em pelo menos dez ações distintas. Uma possível situação de conflito de interesses.

O advogado em questão é Luís Felipe Salomão Filho, filho do ex-corregedor-geral do Conselho Nacional de Justiça Luís Felipe Salomão.

Salomão, o pai, é aquele ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que homologou um outro acordo, esse judicial, entre o Banco do Brasil e duas empresas que foram ligadas a Edison Lobão em plena noite de domingo, conforme revelou também com exclusividade a Crusoé.

Mas voltemos à recuperação judicial do grupo Petrópolis. Para quem não lembra, o conglomerado é responsável por diversas marcas de cerveja, incluindo Itaipava, Crystal e Petra.

O grupo apareceu com certa frequência nas páginas policiais a partir de 2019, com o desencadeamento da 62ª fase da operação Lava Jato, denominada Rock City.

De acordo com a Polícia Federal (PF), o proprietário do grupo, Walter Faria, mantinha uma estrutura de empresas no exterior para o pagamento de propinas. Teoricamente, Faria agia de forma alinhada à Odebrecht, que também mantinha um setor de operações estruturadas para chamar de seu. Faria ficou preso durante um período de quatro meses. As investigações, para surpresa de zero pessoas, foram anuladas por determinação do ministro do STF Gilmar Mendes.

Em dificuldades financeiras após a Lava Jato, o grupo acionou o Poder Judiciário e apresentou em março de 2023 um pedido de recuperação judicial para negociar dívidas que, no período, chegavam a aproximadamente 4,4 bilhões de reais. No início daquele mês, a juíza Elisabete Franco Longobardi assumiu a 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro e ela passou a tomar conta do processo bilionário.

O grupo Petrópolis contratou um caminhão de advogados estrelados para tentar equacionar essa dívida. Só da família Salomão, foram três. Além do já mencionado Luíz Felipe Salomão Filho, o grupo contratou o outro filho do ex-corregedor, Rodrigo Cunha Mello Salomão, e Paulo Cesar Salomão Filho, filho de Paulo Cesar Salomão, que foi desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e é irmão do ministro de Luiz Felipe. Há também  Karine Nunes Marques –– irmã de Kassio Nunes Marques, ministro do STF.

Outros parentes de ministros já trabalharam com o grupo, como Viviane Barci de Moraes, mulher de Alexandre de Moraes, e Maria Carolina Feitosa, enteada de Gilmar Mendes. Ou seja, tudo em casa. Tudo em família.

Com esse plantel estrelado, o grupo conseguiu homologar o seu pedido de recuperação judicial sem pedido de perícia e em um tempo menor que o habitual.

Na decisão, Elisabete Longobardi considerou que as cláusulas da recuperação judicial foram “objeto de extenso debate” e que ocorreu uma “maciça votação favorável à aprovação” de todas as cláusulas pelos credores do grupo. De fato, o plano havia sido aprovado por uma assembleia formada por 96,4% dos credores em 11 de setembro. Mas a reunião foi questionada pelo Ministério Público.

Na manifestação, o MP argumenta que houve manipulação da assembleia, pela inclusão de uma cláusula em que os credores que endossaram a recuperação teriam benefícios, enquanto aqueles que fossem contra seriam retaliados.

Cláusulas desse teor causam prejuízo à liberdade do voto e tratam de forma desigual credores que estão na mesma classe de crédito, simplesmente pelo fato de não concordarem com o plano posto em votação”, argumentou o MP. “Ora, quando falamos do instituto da recuperação judicial subentende-se como uma reunião de esforços coletiva, onde credor e devedor, em razão da função social da empresa, cedem para um bem maior.

Fontes que acompanharam a recuperação judicial do grupo Petrópolis apontaram o acordo judicial como um dos mais bem-sucedidos da história empresarial brasileira. Entre os trabalhadores, não houve deságio; mas entre os credores com garantia real, credores microempresários e quirografários (que não têm preferência de pagamento) houve um deságio de 70% sobre o valor nominal da dívida. Um baita negócio para os devedores.

A reportagem de Crusoé tentou contato com a juíza Elisabete Longobardi e com Luís Felipe Salomão Filho, mas não obteve retorno.

O grupo Petrópolis afirmou, por meio de nota, que “não comenta processos judiciais em andamento”.

O caso ainda está em trâmite na Justiça do Rio de Janeiro.

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  1. O problema é que ficamos saltando de um escândalo para outro e vamos perdendo assim a nossa capacidade de nos indignar. Já foi esquecida a bandalheira das agências de publicidade e a negociata da Caixa. Logo vem outra… e assim vamos nos acostumando com o fedor.

  2. Colocam a opção de compartilhamento do texto pelo Whatsapp e outros, mas não se consegue compartilhar com pessoas que não são assinantes do Crusoé/Antagonista. Elas só conseguem ler a parte inicial do texto...Fica muito limitado, assim !

  3. O Brasil estaria bem melhor se a LAVA-JATO não tivesse sido destroçada por Presidentes e STF. Se não economicamente, ao menos moralmente.

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