Matheus Lima/VascoO Vasco vai e volta da segunda divisão — e parece que neste ano vai de novo

O tempo desperdiça o Vasco

Os gigantes ameaçados de rebaixamento no Brasileirão se acomodaram no trono da própria nobreza, mas há outros reinos se erguendo
28.06.24

Pelo amor de Deus, vamos sentar no chão e contar histórias tristes sobre a morte de reis: como alguns foram depostos, alguns mortos em guerra, alguns assombrados pelos fantasmas que depuseram, alguns envenenados por suas esposas, alguns mortos dormindo, todos assassinados”, lamenta Ricardo II, em vias de ser deposto pelo primo Henrique, na peça de Shakespeare que leva seu nome. Esse é o clima do Z4 do Brasileirão 2024.

Não é de hoje que os maiores clubes do Brasil caem para a segunda divisão. Isso já ocorre há tanto tempo que alguns até já se acostumaram. O Vasco vai e volta, e parece que neste ano vai de novo. O Corinthians prepara a segunda queda com requintes de crueldade com sua torcida, e o Fluminense parecia inclinado a cumprir o destino de pagar a Série B, pelo menos até a demissão do impetuoso Fernando Diniz.

O Grêmio tem jogos a menos, por causa das enchentes no Rio Grande do Sul, mas, ao contrário do arquirrival Internacional, não consegue vencer jogando apenas fora de casa. E o gigante São Paulo, que parecia ter a casa arrumada após ganhar de forma retumbante a Copa do Brasil, claudica diante do cambaleante Vasco e sucumbe para o jovem Cuiabá, que não tem nem 30 anos, dentro da própria casa lotada — e esses estão longe de serem os únicos vexames recentes do tricolor paulista.

Pois o Cuiabá não dá pinta de que vai cair. Nem o Bahia ou o Fortaleza, que costumavam ronda a zona de rebaixamento. Nem mesmo o Criciúma e o Juventude ou o Bragantino. Do Botafogo e do Cruzeiro, que frequentaram tanto a Série B, nem se fala; seus problemas são outros desde que viraram sociedades anônimas do futebol. O Vitória ensaia uma recuperação, assim como o Atlético Goianiense. Mas quatro terão de cair, como ocorre em toda temporada.

“Ah, se eu fosse tão grande quanto a minha dor, ou menor que meu nome. Ou que eu pudesse esquecer o que fui, ou não me lembrar do que devo ser agora!”, lamentam corintianos, vascaínos, tricolores e santistas (que sofrimento na Série B…), repetindo Ricardo II. Seus clubes sentaram no trono da própria nobreza achando que seria o bastante. Fantasiando que continuaria sendo o bastante, como era até décadas atrás.

Agora, seus dirigentes ouvem a terrível tempestade cantar sem encontrar abrigo, veem o vento soprar forte em suas velas, e não reagem, perecendo enquanto se sentem seguros, do alto dos castelos que ergueram com títulos e vitórias memoráveis. Agora, eles contemplam o próprio naufrágio inevitável e iminente enquanto adversários mais humildes começam a erguer seus próprios reinos.

Fica a lição do Ricardo II de Shakespeare, que teve tempo para refletir na prisão antes de ser assassinado: “Eu desperdicei tempo, e agora o tempo me desperdiça”.

 

Rodolfo Borges é jornalista 

 

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