Quem manda na "cabeça política" de Flávio Dino
Talvez o magistrado não esteja meramente obedecendo a Lula, mas seguindo suas proprias ambições políticas
Ao suspender os pagamentos de 4,2 bilhões de reais em emendas parlamentares de comissão nesta segunda, 23, o ministro do STF Flávio Dino (foto) defendeu a lei e a Constituição.
Em sua decisão, Dino criticou a "inobservância de deveres constitucionais e legais — aprovados pelo Congresso Nacional — quanto à transparência, rastreabilidade e eficiência na aplicação de bilhões de reais".
Dino ainda pediu a instauração de um inquérito na Polícia Federal para investigar os desvios feitos com as emendas de comissão.
Essas emendas costumam ser definidas pelos líderes das comissões do Congresso, sem que o tema seja debatido entre os seus integrantes. Além disso, ninguém sabe dizer ao certo para onde vai o dinheiro.
Foram medidas necessárias, aplaudidas pelas entidades que entraram como amicus curiae no pedido de mandado de segurança apresentado pelo PSOL.
"Diante de indicativo de crimes, a investigação é o caminho correto. Surpresa seria não haver a necessária apuração. O ministro Flávio Dino está correto e merece aplauso por isso", diz Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, uma das citadas como amici curiae.
Dino também acolheu um pedido do Instituto Não Aceito Corrupção para que fossem divulgadas as atas das reuniões das comissões.
Jogada política
Se não há o que discutir sobre o mérito da questão, entender o seu tempo, as razões e as cosequências políticas da decisão de Dino é algo mais complexo.
O fato de Dino ter esperado a votação do pacote de corte de gastos demonstra um cálculo político, por parte do juiz que foi escolhido por Lula para o STF justamente por ter uma "cabeça política".
Como escreve Rodolfo Borges em Crusoé, "a questão é que a resposta do ex-ministro da Justiça de Lula veio apenas depois de o governo do petista conseguir aprovar o pacote de corte de gastos no Congresso, o que só ocorreu graças à liberação das emendas".
As negociações ainda vão se estender para o próximo ano, quando o Congresso deverá segurar a aprovação do Orçamento, exigindo novamente a liberação de emendas.
Vale lembrar, ainda, que Dino tem ambições políticas.
Essa disputa teve início quando Lula começou a usar o STF como força auxiliar para exercer pressão sobre o Congresso, numa tentativa de recuperar o controle do Orçamento.
Uma de suas consequências é a diminuição do poder do Palácio do Planalto.
Como escreveu Leonardo Barreto em Crusoé, "Lula, quando traz o Judiciário para a briga política, se torna um ator menor. Além disso, a insegurança favorece ministros do STF que, ao final, sempre têm a palavra sobre quem estava certo e quem não. Ter todo mundo no banco dos réus é tudo o que um juiz político (ou político juiz, no caso de Dino) pode desejar".
Enquanto Lula perde poder, Dino se fortalece.
E vale lembrar que o ministro do STF — que já foi governador do Maranhão, senador e ministro da Justiça — sempre pensou em um dia tentar a Presidência.
Talvez o magistrado não esteja meramente obedecendo a Lula, mas seguindo suas proprias ambições políticas.
Leia em Crusoé: Derretimento institucional na prática
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Comentários (1)
Clayton De Souza pontes
2024-12-23 18:09:19Esse xadrez do Dino ainda vai dar o que falar. Os parlamentares gostaram de sentir o gosto da grana, que tem sido usada conforme seus interesses nem sempre republicanos