Os vetos de Bolsonaro à lei de abuso de autoridade
O presidente Jair Bolsonaro (foto) vetou 14 artigos, três incisos e dois parágrafos únicos no projeto de lei de abuso de autoridade aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado nesta quinta-feira, 5. Entre os trechos excluídos, estão a punição ao uso de algemas. E partes que criavam insegurança para a atuação de policiais, juízes ou promotores,...
O presidente Jair Bolsonaro (foto) vetou 14 artigos, três incisos e dois parágrafos únicos no projeto de lei de abuso de autoridade aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado nesta quinta-feira, 5.
Entre os trechos excluídos, estão a punição ao uso de algemas. E partes que criavam insegurança para a atuação de policiais, juízes ou promotores, como decretar prisão "em manifesta desconformidade com as hipóteses legais" ou induzir investigados a praticar crimes para prisão em flagrante, dois itens cujos vetos foram recomendados pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. Outra exclusão recomendada pelo parecer do ministro foi a do artigo que obrigava a autoridade a se identificar no momento da prisão de um investigado.
Leia abaixo os artigos vetados e as razões apontadas na mensagem do presidente enviada ao presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, para as exclusões.
1. "Ação pública incondicionada": O artigo 3º determinava que os crimes previstos na lei seriam de "ação penal pública incondicionada", ou seja, não dependeria de manifestação prévia de qualquer pessoa para ser iniciada. Mas caberia ação privada "se a ação penal pública não for intentada no prazo legal".
Razões do veto: o artigo é desnecessário porque toda ação penal pública já é considerada incondicionada pelo Código Penal e a admissão de ação penal privada "já é suficientemente tratada na codificação penal vigente".
2. Limitações a exercício de função policial: O artigo 5º proibia a autoridade que tivesse praticado um crime de exercer funções policiais ou militares no município onde a infração tivesse sido cometida, ou onde morasse ou trabalhasse a vítima.
Razão do veto: Fere o princípio da isonomia, "ao prever a proibição apenas àqueles que exercem atividades de natureza policial ou militar".
3. Prisão em "desconformidade com hipóteses legais": O artigo 9º punia com quatro anos de detenção e multa quem "decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais", ou deixasse de "relaxar a prisão manifestamente ilegal", "substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível" ou "deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível."
Razões do veto: O artigo "gera insegurança jurídica por se tratar de tipo penal aberto e que comportam interpretação, o que poderia comprometer a independência do magistrado ao proferir a decisão pelo receio de criminalização da sua conduta."
4. Limitação a prisão em flagrante: O artigo 11 estabelecia a detenção de um a quatro anos e multa para quem "executar a captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei, ou de condenado ou internado fugitivo".
Razões do veto: Geraria "insegurança jurídica, notadamente aos agentes da segurança pública, tendo em vista que há situações que a flagrância pode se alongar no tempo e depende de análise do caso concreto". Além disso, "a propositura viola o princípio da proporcionalidade entre o tipo penal descrito e a pena cominada."
5. Produção de prova: Foi vetado o inciso III do artigo 13, que considerava constrangimento fazer o preso "produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro".
Razões do veto: A mensagem do presidente afirma que "o princípio da não produção de prova contra si mesmo não é absoluto como nos casos em que se demanda apenas uma cooperação meramente passiva do investigado", e o trecho "contraria o sistema jurídico nacional ao criminalizar condutas legítimas, como a identificação criminal por datiloscopia, biometria e submissão obrigatória de perfil genético (DNA) de condenados".
6. Divulgação de imagens: O artigo 14 punia a produção e divulgação de imagens de presos, investigados ou vítimas, sem consentimento ou mediante constrangimento ilegal, com detenção de seis anos e dois meses de multa.
Razões do veto: "Não se mostra possível o controle absoluto sobre a captação de imagens de indiciados, presos e detentos e sua divulgação ao público por parte de particulares ou mesmo da imprensa, cuja responsabilidade criminal recairia sobre os agentes públicos", alegou a mensagem enviada por Bolsonaro ao presidente do Congresso. "Por fim, o registro e a captação da imagem do preso, internado, investigado ou indiciado poderá servir no caso concreto ao interesse da própria persecução criminal, o que restaria prejudicado se subsistisse o dispositivo", acrescentou.
7. Direito ao silêncio: No artigo 15, que prevê punições para quem constranger alguém a depor, foi retirado o parágrafo único. No item, considerava-se que incorria no mesmo crime "quem prossegue com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio" ou "de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público, sem a presença de seu patrono".
Razões do veto: O interrogatório é uma oportunidade para o investigado conhecer as perguntas formuladas sobre a investigação, e de "exercer o silêncio apenas em algumas questões, respondendo voluntariamente às demais, cuja resposta, a seu exclusivo juízo, lhe favoreçam". Além disso, "a falta de assistência por advogado ou defensor público durante o interrogatório não deve ser criminalizada, uma vez que se trata de procedimento administrativo de natureza inquisitiva e não configura falta de defesa ao indivíduo."
8. Identificação de autoridade: O artigo 16 foi vetado inteiramente e punia com prisão de seis meses a dois anos e multa a autoridade que "deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso por ocasião de sua captura ou quando deva fazê-lo durante sua detenção ou prisão".
Razões do veto: A ocultação da identidade pode ser necessária para a "garantia da vida e integridade física dos agentes de segurança e de sua família, que, não raras vezes, têm que investigar crimes de elevada periculosidade, tal como aqueles praticados por organizações criminosas."
9. Uso de algemas: O artigo 17 tipificava como crime usar algemas ou meios de restrição de movimentos "quando manifestamente não houver resistência à prisão, internação ou apreensão, ameaça de fuga ou risco à integridade física do próprio preso, internado ou apreendido, da autoridade ou de terceiro".
Razões do veto: O artigo trava de "forma genérica" a questão. Além disso, iria contra o "princípio da intervenção mínima, para o qual o Direito Penal só deve ser aplicado quando estritamente necessário", e o uso de algemas já é regulado por uma súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal.
10. Impedir encontro com advogado. O artigo 20 que punia quem "impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado".
Razões do veto: O governo avaliou que a redação do artigo dava margem para que se criassem situações em que pudesse ser impedido o acesso do advogado ao cliente, caso houvesse justa causa, gerando insegurança jurídica. O direito de conversar com o advogado já é assegurado por outras leis.
11. "Expor o investigado": O inciso II do artigo 22 punia quem executasse "mandado de busca e apreensão em imóvel alheio ou suas dependências, mobilizando veículos, pessoal ou armamento de forma ostensiva e desproporcional, ou de qualquer modo extrapolando os limites da autorização judicial, para expor o investigado a situação de vexame".
Razões do veto: O item gera insegurança jurídica ao falar de 'forma ostensiva e desproporcional' na redação "por encerrar tipo penal aberto e que comporta interpretação". Além disso, "em operações policiais, o planejamento da logística de bens e pessoas competem às autoridades da segurança pública."
12. Indução ao crime: O artigo 26 considerava crime "induzir ou instigar pessoa a praticar infração penal com o fim de capturá-la em flagrante delito, fora das hipóteses previstas em lei".
Razões do veto: "A criminalização da conduta pode afetar negatividade a atividade investigativa, ante a potencial incerteza de caracterização da conduta prevista", já que "não raras são as vezes que a constatação da espécie de flagrante, dada a natureza e circunstâncias do ilícito praticado, só é possível quando da análise do caso propriamente dito, conforme se pode inferir da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal".
13. Omissão de informação: Criado para punir a autoridade que "prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo com o fim de prejudicar interesse de investigado", o artigo 29 teve seu parágrafo único retirado da lei. O parágrafo estabelecia que "incorre na mesma pena quem, com igual finalidade, omite dado ou informação sobre fato juridicamente relevante e não sigiloso".
Razões do veto: O trecho causava insegurança jurídica "por encerrar tipo penal aberto e que comporta interpretação". Outro motivo seria que o parágrafo poderia entrar em conflito com a Lei de Acesso à Informação, "tendo em vista que pode conduzir ao entendimento pela possibilidade de divulgação de informações de caráter pessoal, as quais nem sempre são sigilosas, mas são protegidas por aquele normativo."
14. Ação "sem justa causa": O artigo 30 também foi vetado inteiramente, e punia o ato de "dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente".
Razão do veto: A proposta punha em risco o instituto da delação anônima, que pode ser feita, segundo entendimento do STF.
15. Negar informações à defesa: O artigo 32 considerava crime "negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível".
Razões do veto: "O direito de acesso aos autos possui várias nuances e pode ser mitigado, notadamente, em face de atos que, por sua natureza, impõem o sigilo para garantir a eficácia da instrução criminal", segundo a mensagem de Bolsonaro. Além disso, os parâmetros da questão já estão estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal.
16. "Erro relevante": O artigo 34 estabelecia ser crime "deixar de corrigir, de ofício ou mediante provocação, com competência para fazê-lo, erro relevante que sabe existir em processo ou procedimento".
Razões do veto: "Ao dispor que 'erro relevante' constitui requisito como condição da própria tipicidade", o artigo "gera insegurança jurídica por encerrar tipo penal aberto e que comporta interpretação". A proposta também contraria o interesse público ao disciplinar hipótese análoga ao crime de prevaricação, já previsto no Código Penal.
17. Restrição a reuniões: O artigo 35 puniria a autoridade que "coibir, dificultar ou impedir, por qualquer meio, sem justa causa, a reunião, a associação ou o agrupamento pacífico de pessoas para fim legítimo".
Razões do veto: Foi excluído "tendo em vista a generalidade do dispositivo", que é protegido pela Constituição. A proteção constitucional, no entanto, "não se traduz em uma salvaguarda ilimitada do seu exercício", porque a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já determinou que "o direito à liberdade de se reunir não se confunde com incitação à prática de delito nem se identifica com apologia de fato criminoso."
18. Divulgação de informações: O artigo 38 criminalizava a autoridade que antecipasse "por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação".
Razões do veto: A proposta viola o princípio constitucional da publicidade dos atos da administração pública, "cujos valores da coletividade prevalecem em regra sobre o individual, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal". Outro motivo alegado foi o de que "a comunicação a respeito de determinados ocorrências, especialmente sexuais ou que violam direitos de crianças e adolescentes, podem facilitar ou importar em resolução de crimes".
19. Prerrogativas de advogados: O último artigo a ser vetado, o 43, constituía como crime "violar direito ou prerrogativa de advogado".
Razões do veto: As condutas criminalizadas pelo artigo são consideradas "legítimas pelo ordenamento jurídico", de acordo com a mensagem enviada a Alcolumbre. "As prerrogativas de advogados não geram imunidade absoluta", lembra a explicação divulgada pelo presidente no Diário Oficial junto ao projeto sancionado.
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Comentários (10)
zenaide
2019-09-07 12:05:22Depois de dizerem que o presidente não era flexível , não conversava com os abutres vem dizer que Bolsonaro, fez acordão ..Vsc queriam o que ? O presidente teve que mudar a tática pq se não esses merdas não votavam a reforma, tinha que ceder em algum ponto, retardando um pouco o projeto do Moro, mas não que ele é contra o Moro, a defesa da corrupção , o problema que tem que usar de estratégia paras coisas andarem , não é facil naquele ninho de cobra as coisas andarem , ele bem conhece aquilo.
Sandor
2019-09-06 20:05:58Tenho certeza de que cada artigo tanto do que passou como do que foi vetado é de que algum maldito político passou pela situação kkkk bando de vagabundo
MARIO KUME
2019-09-06 17:38:17Se fosse em Singapura estas leis estariam sendo "queimadas" em praça pública. Lei de abuso de autoridade !? Nem deveriam existir... deixem a Polícia Federal trabalhar em paz.
Hesse
2019-09-06 07:36:41Não havia anunciado 36 vetos?
Rubens
2019-09-05 21:28:22Agora além de ter um STF comprometido com à corrupção. Teremos uma pgr comprometida com a corrupção e contra a lava jato. Pior quem escolheu foi eleito pelo povo para lutar contra corrupção. Isso é traição 🤬 e ainda para completar a cagada não vetou o estatuto da criminalidade 🤬🤬🤬
Stella
2019-09-05 20:39:38Vetou porque.. porquê vetou?? Tem algo no ar.. controle ? Longa manus ??
Eudes
2019-09-05 20:27:51Confio totalmente no Bolsonaro, mas, neste caso, embora existam abusos de autoridade que necessitam ser punidos, pela forma obscura que esta lei foi aprovada, eu a teria vetado integralmente.
LuisR
2019-09-05 19:33:46Depois de algum tempo, a decepção com JB foi aumentando de forma gradativa. Agora, que já o conhecemos melhor há uma previsibilidade do que de fato irá ocorrer relativamente ao que ele anuncia. Se for um anúncio que lhe criou expectativa positiva, divida por uns 30-40 e esse será o provável resultado final. Anti-matemático, mas pode ser negativo!!🤔🤔 No caso específico, os pontos positivos deveram-se exclusivamente ao Ministro Sérgio Moro.
Sonia
2019-09-05 19:31:50Nossa de 36 para 19 sobrou muito papo e faltou bastante decisão
LuisR
2019-09-05 19:22:48Pelo visto as leis foram feitas apenas para punir autoridades policiais, ou seja, favorecendo aos bandidos que roubam, sequestram, estupram, matam, enfim... é a legislação, feita de / para bandidos. Situação semelhante às atuais aplicáveis aos "legisladores" e juízes do STF, que no caso Toffoli tem até o irmão laranja envolvido na tramóia.