"Fim de foro seria salto civilizatório", diz Alvaro Dias
Autor da PEC do fim do foro, ex-senador do Paraná acredita que o STF não tem interesse na proposta, porque não quer perder poder

O paranaense Alvaro Dias (foto) é o autor da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que acaba com o foro privilegiado.
Dias, que concluiu seu último mandato de senador em 2023, vive em Curitiba e conversou com Crusoé sobre o avanço de seu projeto no Congresso.
O fim do foro privilegiado voltou a ser debatido para tentar conter os avanços do Supremo Tribunal Federal (STF) no Legislativo.
O que levou o sr. a propor essa PEC?
Eu apresentei essa proposta em 2013. Ela foi aprovada no Senado em 2017. Depois de muita negociação, o texto foi para a Câmara dos Deputados. Passou pela Comissão de Justiça e pela Comissão Especial, mas aí foi para a gaveta.
Tivemos durante todos esses anos a oportunidade de aprovar o fim do foro privilegiado, mas isso infelizmente não aconteceu.
O foro privilegiado é uma excrescência. Coloca o Brasil como um país de quinto mundo em matéria de Poder Judiciário.
Se o fim do foro for aprovado, isso seria um salto civilizatório.
Por quê?
A Constituição diz que somos iguais perante a lei. Mas o foro é um privilégio para mais de 50 mil autoridades no país.
Há uma relação de reciprocidade entre o Supremo e o Congresso, porque só o Senado pode controlar o Supremo, e só o STF pode julgar parlamentares em razão do foro privilegiado.
A forma de acabar com isso é retirar esse poder do STF, acabando com o foro privilegiado.
Parece que os parlamentares querem acabar com o foro porque não querem ser julgados pelo atual STF...
A questão é: o que atende aos preceitos constitucionais? Todos devem ser iguais perante a lei. Então não importa saber a quem beneficia eventualmente o fim do foro privilegiado. Me parece que hoje há esse enfoque: "Ah, vamos aprovar o fim do foro privilegiado para beneficiar esse ou aquele". Não é este o objetivo da proposta, não.
A proposta, ao contrário, tem o objetivo de estabelecer o cumprimento ao dispositivo constitucional, que diz que todos somos iguais perante a lei. Porque enquanto existir foro privilegiado estamos desmentindo esse dispositivo constitucional.
E não há no mundo nenhum país — e você pode pesquisar o mundo inteiro, todas as nações poderosas ou não — não há país democrático que tenha uma instituição parecida com o foro privilegiado do Brasil.
Quem que é contra o fim do foro privilegiado?
Os parlamentares que têm problemas com a Justiça. A tradição é de que os políticos são protegidos no Supremo. Essa é uma constatação. Quantos políticos já foram condenados no Supremo?
Também não há interesse de acabar com o foro privilegiado no Supremo.
O foro confere poder ao Supremo. Se o foro acabar, o poder de julgar parlamentares será retirado do Supremo, a não ser em última instância.
Então, para garantir a interdependência dos Poderes, para que o Supremo recupere sua credibilidade, é fundamental o fim do foro privilegiado.
Há outras maneiras de conseguir esse mesmo objetivo?
Outra maneira seria substituir a indicação política do presidente, trocar o apadrinhamento político pela meritocracia.
Existem propostas tramitando no Congresso sobre isso. O Ministério Público poderia indicar um nome, o magistratura outro nome, a advocacia outro nome. Seriam três candidatos. Esses três nomes poderiam ir para a mesa do presidente da República, que escolheria um deles e o encaminharia para a sabatina no Senado.
Isso acabaria conferindo ao nome aprovado uma ampla liberdade de atuação. Porque ele não deveria mais a ninguém. O ministro do STF ganharia o cargo em razão dos seus méritos pessoais. Seria uma conquista pessoal, e não o resultado de apadrinhamento.
Outro ponto seria estabelecer um mandato para os ministros do Supremo. Poderiam ser oito anos, dez anos. Seria fundamental fixar um período.
Dessa forma, estaríamos valorizando o Supremo, que acabaria recuperando credibilidade.
Um argumento contra a PEC do fim do foro é que, se os casos de políticos fossem para a primeira instância, haveria mais influência política, principalmente em algumas cidades e estados do Brasil...
Esse me parece um argumento contraditório, porque a influência dos políticos é maior no Supremo. Veja quantos políticos foram condenados pelo Supremo. Quase nenhum.
E mesmo que exista influência política no município, existe a possibilidade de o Ministério Público pedir recurso. Então, aí seria possível estabelecer o rito normal.
O foro privilegiado é obviamente uma depreciação do nosso sistema de Justiça. Não creio que isso seja recomendável para um país que quer se tornar uma grande nação.
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