'A Organização', o livro-reportagem de Malu Gaspar, mostra Lula como ele é
O ex-presidente Lula é um dos personagens centrais do livro-reportagem "A Organização — a Odebrecht e o esquema de corrupção que chocou o mundo” (Companhia das Letras), que chega nesta sexta-feira, 20, às livrarias. A jornalista Malu Gaspar narra, com fartura de detalhes, como a Odebrecht montou sua estratégia para se aproximar de Lula e...
O ex-presidente Lula é um dos personagens centrais do livro-reportagem "A Organização — a Odebrecht e o esquema de corrupção que chocou o mundo” (Companhia das Letras), que chega nesta sexta-feira, 20, às livrarias. A jornalista Malu Gaspar narra, com fartura de detalhes, como a Odebrecht montou sua estratégia para se aproximar de Lula e para financiá-lo ainda “na baixa”, bem antes de o petista virar presidente, para faturar “na alta”, quando ele ascendeu ao poder.
Como precisava garantir que as facilidades continuassem durante o governo Dilma Rousseff, a empreiteira continuou a cortejar Lula por saber que ele seguiria mandando, de certa forma, no Planalto. Durante a troca de guarda, havia um temor na cúpula da Odebrecht de que a relação com Dilma não transcorresse de maneira tão melíflua.
O livro descreve em minúcias um encontro no Palácio do Planalto em 30 de dezembro de 2010 “destinado a marcar a transferência do relacionamento de Emílio e Lula para Marcelo Odebrecht e Dilma”. Na Odebrecht, o medo de um governo Dilma era tanto, escreve Malu Gaspar, que eles só se referiam ao mandato da “madame” com termos como “tragédia”, “desastre” ou “perigo”. “Lula é o nosso seguro contra Dilma”, dizia Emílio.
Na pasta que levou ao encontro, no gabinete presidencial, Emílio tinha uma folha de papel impressa com a tradicional lista de assuntos a tratar com o presidente. Eram seis itens, segundo o livro: “Quem fala em nome dela e para que tema” e “disponibilizar apoio junto ao Congresso” encabeçavam o rol. Mais abaixo vinham os outros quatro tópicos: “Com ele: Estádio Corinthians”; “Obras sítio”; “1ª palestra Angola”; e “Instituto”.
Enquanto o garçom servia café e água, relata Malu Gaspar, Emílio introduziu o assunto: “É importante que vocês mantenham a relação que há entre nós”. Lula corroborou, olhando para a sucessora: “Esses aqui têm sido nossos amigos sempre, e espero que você, Dilma, tenha com eles a mesma relação que eu tive”.
Depois de percorrer o roteiro que levara impresso, Emílio Odebrecht e Lula conversaram a sós no fundo do gabinete. “Olha, chefe, o senhor vai ter uma surpresa. Nós vamos garantir o prazo que havíamos dado lá no programa do sítio”, disse o empreiteiro ao petista, referindo-se às obras encomendadas por Marisa Letícia no sítio de Atibaia. De volta ao carro, já a caminho do aeroporto, Emílio demonstrou euforia ao falar com o filho: “Fique tranquilo, estamos com o seguro garantido”.
Abaixo, outros trechos de destaque do livro:
Paulo Roberto Costa e a ordem de Lula
Diante das pressões de José Janene, então líder do PP, para emplacar Paulo Roberto Costa na diretoria de Abastecimento da Petrobras, sob pena de o governo não contar mais com os votos do partido na Câmara, o então presidente Lula convocou uma reunião em seu gabinete no Palácio do Planalto. Estavam presentes o então chefe da Casa Civil, José Dirceu, o ministro de Relações Institucionais, Aldo Rebelo, e o presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, além dos líderes do PP. Diante do pedido de Lula para nomear Costa, Dutra tergiversou: “A indicação de um diretor tem que passar pelo conselho, presidente, e isso está um pouco complicado”. Mas Lula, segundo o livro, não queria arriscar seu governo “em nome de pruridos corporativos”. O presidente, então, ordenou em tom de ameaça: “Dutra, se o Paulo Roberto Costa não estiver nomeado em uma semana, vou demitir e trocar todos os conselheiros da Petrobras”.
O “Instituto” e o futuro financeiro de Lula
Em 2010, como se não bastasse o frenesi do final do governo Lula e a campanha eleitoral, uma terceira prioridade dos petistas ocupou a cúpula da Odebrecht: o plano para garantir financeiramente o futuro de Lula depois de deixar o Palácio do Planalto. Uma das soluções era criar uma entidade nos moldes do Instituto FHC, a ser financiada pelo empresariado. A ideia inicial era comprar um prédio no bairro de Indianópolis, Zona Sul de São Paulo. O pecuarista José Carlos Bumlai, amigo pessoal de Lula, um dos encarregados do projeto, procurou Marcelo pedindo que a Odebrecht comprasse o imóvel por 10 milhões de reais e permanecesse como proprietária no papel enquanto o instituto não estivesse criado. Inicialmente, Marcelo estava reticente: “Primeiro eu preciso da aprovação do Palocci, porque já combinei com ele um valor para atender Lula”. Dias depois, Marcelo, temendo a repercussão na imprensa, disse ao ex-ministro da Fazenda: “Palocci, eu prefiro doar o dinheiro. Acho arriscado comprar o prédio”. Palocci tentou abortar a operação, mas não conseguiu. Os 10 milhões de reais foram liberados para Bumlai e Roberto Teixeira, compadre e advogado de Lula que também participou do projeto. O dinheiro, lembra Malu Gaspar, seria registrado na cota “Amigo”, que contabilizava as despesas com Lula, e debitado dos créditos de Palocci.
Roberto Teixeira e a operação para justificar as obras no sítio
No final de fevereiro de 2011, Alexandrino Alencar, o executivo da Odebrecht responsável pela ponte com Lula, recebeu uma chamada de Roberto Teixeira. “Agora que a obra de Atibaia terminou, nós precisamos formalizar”, disse. Como não havia sequer uma fachada para justificar os gastos da Odebrecht no sítio, precisava de documentos que dissessem que a obra havia sido paga por Fernando Bittar, dono formal da propriedade, para que no futuro não se pudesse acusar Lula de ter recebido vantagem indevida de uma empreiteira. Em reunião em 1º de março com Alencar e Emyr Costa, que havia tomado conta da obra, ficou acertado que um subempreiteiro, cujos funcionários trabalhavam sem identificação, tomaria a frente. “Esse subempreiteiro poderia emitir uma nota?”, perguntou Teixeira, afirmando em seguida que seria preciso que ele assinasse um contrato fictício justificando os serviços. “Alguns dias depois, a missão estava cumprida”, narra o livro.
A ajuda a Palocci e Dirceu
Depois de o escândalo do mensalão e do episódio da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa tragarem José Dirceu e Antonio Palocci, Lula procurou Emílio Odebrecht. Preocupado com o futuro dos dois aliados, disse: “Por favor, ajude os dois. No Palocci, confie com os dois pés. Com Dirceu, mantenha um pé atrás”. A Odebrecht já vinha ajudando Dirceu por intermédio de Fernando Reis, o presidente do braço ambiental da empreiteira, que havia sido escalado por Marcelo para se aproximar do ex-ministro da Casa Civil. Também apoiou Palocci que, no ostracismo, se oferecia para dar palestras sobre o surto de gripe aviária que atacava o país.
O saldo do PT na Odebrecht
Todo o esforço de Emílio Odebrecht e Lula rendeu frutos na relação ganha-ganha entre a empreiteira e o petista. No final de 2009, o PT já tinha 114 milhões de reais de saldo acumulado com a Odebrecht, distribuídos nas rubricas “Italiano”, “Pós-Itália” e “Amigo”. Os resgates eram tão frequentes que elas naturalmente passaram a ser chamadas no grupo de “contas-correntes”. “Podia haver outras empresas tão próximas do governo, podia haver outros empresários tão enfronhados no ministério, mas, naquele momento, dificilmente alguma delas teria mais influência do que a Odebrecht”, escreve a jornalista.
O patrocínio ao caçula de Lula
Nos últimos meses de 2011, Emílio Odebrecht procurou Lula, já em seu instituto, na tentativa de “amainar os atritos” que ocorriam entre Marcelo Odebrecht e Dilma Rousseff. “Ajudo, claro. Essa briga é ruim para o Brasil, é ruim para ela”, disse o ex-presidente. Emílio sabia que Lula andava preocupado com o filho caçula Luís Claudio e fez uma proposta. “Vamos fazer o seguinte: você me ajuda, porque santo de casa não faz milagre, a mudar essa forma de Marcelo agir, inclusive de ajudar ele perante Dilma (...) e eu vou ajudar na formação do seu filho”, prometeu o empreiteiro. Em nova visita de Emílio ao instituto, Luís Claudio disse que pretendia investir em um torneio chamado Touchdown – ele estava convencido de que o grande negócio no Brasil era o futebol americano. A Odebrecht gastou, entre 2012 e 2015, 2,1 milhões de reais, sem que a Touchdown tivesse conseguido se consolidar como negócio”, diz o livro. "A Organização — a Odebrecht e o esquema de corrupção que chocou o mundo” chega às livrarias físicas e virtuais nesta sexta-feira.
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Comentários (10)
Maria
2020-11-24 07:07:52Muito bom Malu Gaspar 👏👏👏🇧🇷🇧🇷🇧🇷👏👏👏🇧🇷🇧🇷🇧🇷
Cristian
2020-11-23 18:11:46De VOMITAR. E pensar que estão flanando pelo país e pelo mundo afora e bem resguardados por bancas milionárias de advogados e por juizes do STF obviamente
Deolinda
2020-11-22 09:59:37👏🏻👏🏻para Malu Gaspar !
Marina
2020-11-21 18:10:16No entanto, já vi até filósofa que deveria aparentar sabedoria, vir dizer que Lula foi condenado sem provas. Vá ter costas quentes assim pra o diabo que o carregue!
Edmundo
2020-11-21 16:16:50Como o povo é idiota! Ainda perde tempo de escrever sobre este moço. Para mim tem mais valor o Beira Mar do que esse moço chamado Lula.
Lourival
2020-11-21 06:48:39De maneira sórdida, cúmplice e canalha, como de hábito, diante da avalanche de comentários sobre a ação de Lula contra Regina Duarte, onde o cachaceiro assaltante de nove dedos pede indenização em favor da sua " honra " Crusoé/Antagonista retiraram a postagem. Depois, o que nos propôs ser uma " ilha no jornalismo " quer que incautos como eu, renovem as assinaturas. Jornalismo indigente moral, que muda de opinião de acordo com certo$ convencimento$ não merece nossos caraminguás.
MARCOS
2020-11-20 18:08:10A Segunda Turma do STF pretende inocentar o Lula e os outros suspeitos nas investigações da Lava Jato e imputar toda culpa ao Moro, além de acabar com a Lava Jato, com a ajuda do PGR e do presidente. A batata deles está assando. MORO2022
MARCOS
2020-11-20 18:00:57E, apesar de todas as evidências das sujeiras do PT, PP, PDT, MDB e seus partidos satélites, alguns membros do STF, principalmente da maligna Segunda Turma, estão convictos de que o culpado de tudo é a Lava Jato e o Dr. Sérgio Moro, a quem continuam fazendo questão de prejudicar e imputar a pecha de suspeição.
Celso
2020-11-20 13:14:01O moro tem sorte , porque esse pessoal falasse com o Putin já teriam mandado envenenar ele
Getulio
2020-11-20 13:06:50Sabe-se que Engrenagem é título de livro famoso, publicado há muito. Mas não seria adequado à publicação ora citada? A engrenagem cleptocrática implica o funcionamento bem azeitado de todas as peças políticas. Se falha uma, travam-se as demais. Nada retrata melhor uma cleptocracia que a figura da engrenagem. E como se define cleptocracia? Trata-se do (des)governo aparelhado por larápios com o único intento de enricar a quadrilha e seus padrinhos e afilhados. O resto é puro jogo de espelhos.