A americanização da política brasileira
Lula discursou neste domingo, 30, dizendo que "não existem dois Brasis". Os números que saíram das urnas revelam que isso não passa de pensamento positivo. O que se viu, desde o primeiro turno, é que metade do Brasil escolheu o presidente Jair Bolsonaro (na foto, com Trump) e a outra, Lula. Mais de 90% dos...
Lula discursou neste domingo, 30, dizendo que "não existem dois Brasis". Os números que saíram das urnas revelam que isso não passa de pensamento positivo.
O que se viu, desde o primeiro turno, é que metade do Brasil escolheu o presidente Jair Bolsonaro (na foto, com Trump) e a outra, Lula. Mais de 90% dos votos foram para um desses dois candidatos, mesmo quando havia outros nomes na disputa.
Essa polarização intensa deixa o Brasil mais perto dos Estados Unidos, em que a população se divide em identidades políticas bem construídas e opostas, sem nunca mudar de lado. Por lá, a maior parte da população se define como republicana ou democratas. Muito raramente os americanos votam em candidatos do outro partido.
Essa definição do voto por identidades faz com que outros fatores percam relevância. No início do ano, apostava-se que a economia seria um fator determinante no voto, mas mesmo a melhora dos indicadores não permitiu que Bolsonaro virasse o jogo nas pesquisas eleitorais.
Eventos chocantes como o ataque de Roberto Jefferson a policiais federais com tiros e granadas e a atitude de Carla Zambelli de sacar uma arma e apontá-la para um homem em São Paulo não levaram os bolsonaristas a repensar o voto. Em vez de lamentar a ação de Jefferson, muitos adotaram a retórica de que ele era um petista, ignorando seu passado recente de apoiador entusiasmado de Bolsonaro.
"Esses eventos não afetaram quase nada. Isso revela que o eleitorado no Brasil está cristalizado, mais do que qualquer outra coisa, em identidades políticas. Eleitores do Bolsonaro, mesmo desapontados ou chocados com algum evento ou uma fala do presidente, não mudam de lado. Eles não se conseguem se enxergar no campo oposto. Trata-se de algo muito novo para a sociedade brasileira, que está evoluindo para o modelo americano", disse Andrei Roman, diretor da AtlasIntel, na live de OAntagonista e Crusoé deste domingo. "Nos Estados Unidos, democratas votam em democratas, republicanos em republicanos. O que faz a diferença são os moderados, ou independentes. O que acho engraçado e que, no Brasil, esse campo do meio acabou sendo menor que nos Estados Unidos. Foi uma evolução histórica muito inesperada."
Da mesma forma, as demonstrações de amizade de ditadores da América Latina não retiraram votos de Lula. Para eles, não há contradição em Lula se dizer um defensor da democracia e apoiar ditaduras.
Os ânimos exaltados entre os representantes dos dois lados aumentam a chance de episódios de violência na sociedade. No Brasil, ocorreram assassinatos por motivação política em Mato Grosso, Santa Catarina, Ceará, São Paulo e Paraná. Nos Estados Unidos, na semana passada, um homem invadiu a casa da parlamentar Nancy Pelosi e agrediu seu marido a golpes de martelo.
Outro efeito da polarização é o maior comparecimento às urnas. Na eleição americana de 2020, entre Joe Biden e Donald Trump, o comparecimento foi de 67%, um recorde neste século, considerando que nos Estados Unidos o voto é facultativo. No Brasil, pela primeira vez desde a volta da democracia, o absenteísmo foi menor no segundo turno (20,5%) do que no primeiro (20,9%). Normalmente, a abstenção aumenta porque há menos cargos em disputa e ocorre uma desmobilização dos partidos, reduzindo o interesse na política.
"A literatura afiram que, quando as eleições são muito apertadas e os dois candidatos são muito diferentes, as pessoas tendem a comparecer mais. Isso acabou se comprovando" disse o cientista político Leonardo Barreto, diretor da Vector Research, na live de OAntagonista e Crusoé.
O Brasil pós-segundo turno imita os Estados Unidos também no descaso com os rituais democráticos de alternância de poder. Depois de perder as eleições de 2020, Donald Trump montou em um helicóptero no gramado da Casa Branca, pegou um avião e zarpou para sua mansão na Flórida, para evitar de participar da tomada de posse de Biden, em Washington. No Brasil, depois da vitória de Lula nas urnas, Bolsonaro não ligou para parabenizá-lo. Até o momento da publicação desta reportagem, ele permanecia em silêncio.
Uma ligeira diferença entre os dois países é que, depois do primeiro turno, que deu a Bolsonaro uma quantidade de votos além do esperado, o presidente evitou falar em fraudes nas urnas eletrônicas, enquanto Trump criticou ferozmente o sistema eleitoral americano a ponto de seus seguidores invadirem o Capitólio e tentarem impedir o reconhecimento de Joe Biden no Colégio Eleitoral, em janeiro de 2021.
Mas o histórico do brasileiro mostra que há grandes chances de Bolsonaro voltar a falar em fraude para motivar seus eleitores, mesmo sem qualquer evidência. Se isso acontecer, o Brasil se tornará uma uma réplica bananeira da democracia americana.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (9)
Lucia
2022-11-03 00:36:46Chegamos a esta situação de polarização não porque queremos copiar os EUA. Essa afirmação é imbecil. Chegamos aqui por obra e graça de um Supremo de baixíssima qualidade e conhecimento técnico! Um Supremo pequeno, medíocre, despreparado! A bipolarização tem nome e sobrenome: Edson Facchin.
Ricardo
2022-11-01 12:27:01Duda Teixeira é o único jornalista isento da crusoe e que entende do que fala e coloca os fatos reais, para o leitor tirar conclusões. Os demais, dantas, graeb e Alexandre Soares, são o centro do universo e vomitam as opiniões pessoais, que não interessam aos leitores. A crusoe morreu. Esse retrocesso explica a saída do Mario e do Diogo.
Alessandro
2022-10-31 21:59:55Sim, eu sabia que odiava o ex-presidiário e os petralhas, só não imaginava o quanto. Descobri o quanto hoje, ao ver o movimento dos caminhoneiros: fiquei triste com a notícia, mas espero que piore muito, muito mais. Gostaria de ver a secessão do país, obviamente o “nosso” território compreenderia SC, PR, MS e nele, esquerdistas seriam convidados a se retirar por bem. As opções “por mal” seriam o encarceramento ou o banimento. Ahhhh que bom seria…
KEDMA
2022-10-31 14:14:34Demorou um tempo para descobrirmos que copiamos o que há de melhor e de pior no regime americano, apesar de muitos não reconhecerem. Muitos que detestam a América esquecem que quase tudo aqui fazemos, falamos ou compramos vem de lá.
Ricardo Heurich
2022-10-31 14:01:18Importante mencionar que o voto no Brasil, diferente dos EUA , está ligado a figuras e salvadores da pátria. Nesse ponto estamos distantes da política americana. Aqui ainda não se nota vínculo à partidos.
Mauro Santos
2022-10-31 13:37:19De abstenções e votos inválidos foram 37.9 milhões, mais os votos do Bozo 58.2 milhões. Significa que mais da metade (abstenções e votos inválidos) optou por nenhum e nem outro. Somando os votos do segundo colocado a representatidade do molusco em conserva está com a validade vencida. Para o esquema de corrupção isso pouco importa.
JULIANA
2022-10-31 13:27:47De novo uma réplica bananeira 🙄.
SILVIO WERSON
2022-10-31 12:30:08Presidentes são funcionários públicos, demiti Bolsonaro e por absoluta falta de opção dei uma nova chance ao verme, não há o que polemizar.
Marcello
2022-10-31 12:22:35A bem da verdade, muita gente votou em JB, porquê detesta o PT! Houvesse melhores opções, os votos não iriam para nenhuma dessas duas tranqueiras!