O inferno de Neymar
O orgulho é a raiz de todos os pecados na 'Divina Comédia' de Dante, e a pena pela preguiça se paga correndo sem parar
Abandonai toda a esperança, vós que entrais na Vila Belmiro. É como o torcedor do Santos se sente ao constatar que Neymar Jr. não trouxe a redenção prometida.
O Santos só conseguiu marcar seus dois gols de honra contra o Flamengo na última rodada do Campeonato Brasileiro depois que o último grande craque do país deixou o campo. Coincidência, alegam os fás de Neymar — e eles ainda existem aos montes.
Mas é cada vez mais difícil sustentar a idolatria, ainda mais porque, além de não jogar como antes e quase não conseguir entrar em campo por conta das sucessivas lesões, o atacante se comporta muito mal dentro de campo, a ponto de incomodar os colegas.
Orgulho
"Ó cristãos orgulhosos, míseros cansados, que, enfermos da vista da mente, confiais nos passos para trás, não percebeis que nós somos vermes nascidos para formar a angélica borboleta?”, diz Dante, ao passear com Virgílio pelo Purgatório, enquanto ambos observam os pecadores que pagam suas penitências carregando pedras nas costas.
O orgulho é a raiz de todos os pecados na Divina Comédia de Dante. É o que levou Lúcifer para o último círculo do inferno, por trair o Criador e é também os que os penitentes vistos por Dante e Virgílio carregam nas costas para expiar seus pecados.
Neymar representou por muito anos uma perspectiva de glórias para o futebol brasileiro que nunca se concretizou. O grande talento se perdeu em escolhas erradas na carreira e no temperamento, que se manifestou da pior forma, mais uma vez, na derrota para o Flamengo.
Mamba Mentality
O atacante reclamou dos colegas de time e os expôs ao deixar o meio de campo para ir bater um tiro de meta, como se estivesse fazendo algo de bom, como se liderasse.
Criticado, sacou uma imagem clássica do falecido Kobe Bryant, na qual o jogador americano permanece imóvel diante de um adversário que ameaça arremessar a bola em seu rosto. Essa referência à Mamba Mentality de Kobe só aumentou o abismo entre o que Neymar é hoje e aquilo que todos achavam que ele poderia ter sido.
"Mamba Mentality significa tentar ser a melhor versão de si mesmo. É uma busca constante, uma busca infinita”, definiu Kobe, que publicou um livro sobre o assunto.
É uma filosofia de vida que lembra muito mais Cristiano Ronaldo do que Neymar.
O jogador que surgiu destinado a dar ao Brasil o hexacampeonato mundial voltou ao país após rodar o mundo para tentar colocar o Santos — e a própria carreira — nos eixos, mas não parece a disciplina exigida para recuperar a forma, nem para liderar o time, que voltou à zona de rebaixamento dois anos após ser rebaixado pela primeira vez em sua história.
A pena para os preguiçosos no Purgatório da Divina Comédia é correr sem parar, o oposto do que fizeram em vida. Mas aí já será tarde demais.
Rodolfo Borges é jornalista
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