Islamoesquerdismo, decolonização e a desordem moral do Ocidente
União de fanatismo religioso, violento e bárbaro com fanatismo político no qual violência e barbárie encontram justificação abala e ameaça o mundo ocidental

Há 2 anos, o grupo terrorista islâmico Hamas perpetrou, em solo israelense, um dos mais terríveis massacres da história.
Além do elevado número de vítimas (mais de 1200 pessoas assassinadas e 251 levadas como reféns), os terroristas ultrapassaram todos os limites de crueldade, assassinando bebês e crianças, torturando e estuprando mulheres, queimando famílias em suas casas e metralhando jovens que fugiam apavorados nos arredores da festa de música eletrônica que foi um dos palcos principais da terrível carnificina.
À agonia do massacre, seguiu-se a agonia dos familiares e amigos das pessoas sequestradas, dentre as quais idosos, mulheres, adolescentes, crianças e até bebês. Vítimas estas que, uma vez nas mãos dos terroristas, foram sendo eliminadas gradualmente sabe-se lá por quais formas de maus-tratos. Alguns foram resgatados ou libertados em acordos, restando hoje uma minoria de sobreviventes.
As denúncias dos hediondos crimes cometidos pelo Hamas foram fornecidas não só pelo Estado de Israel, mas por diversos órgãos de imprensa de todo o mundo e por entidades de direitos humanos, como a Human Rights Watch, cujas denúncias são, com frequência, reivindicadas por setores da esquerda hoje coniventes ou apoiadores declarados do Hamas.
Na verdade, os próprios terroristas filmaram a barbárie, vangloriando-se da selvageria.
Atrocidades
Recentemente, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, usou no seu terno, em discurso na ONU, um QR Code que, ao ser escaneado, leva a um site que reúne registros das atrocidades cometidas pelo Hamas naquele dia fatídico.
Tratou-se, portanto, de um fato brutal diante do qual e após o qual se esperaria nada menos do que um generalizado repúdio horrorizado. Mas não foi bem isso o que aconteceu.
Não houve unanimidade na condenação aos terroristas. Houve justificação e regozijo; houve uma macabra e satânica celebração do mal.
Aqui mesmo no Brasil, dois anos após o ocorrido em Israel, temos a infelicidade de ver, por exemplo, o partido de extrema-esquerda PCO programar um ato em comemoração dos dois anos do referido massacre, que chamou de “um dos mais gloriosos dias da história da humanidade”. Não se trata de ação isolada; é só uma das mais caricatas.
Isso nos leva ao tema central desse artigo: a desordem moral do Ocidente cujo apoio implícito ou explícito ao Hamas é um avançado sintoma.
Reprovados
Como muito bem pontuou Brendan O’Neill, no excelente livro After The Pogrom: 7 October, Israel and the Crisis of Civilisation, traduzido no Brasil por Andréa Kogan, naquele dia “o Hamas não testou somente a segurança territorial de Israel, mas também a consciência moral da humanidade”. Qual foi o resultado do teste? Fomos reprovados. Nossa consciência moral está embotada.
Qualquer um que respire fora de sua bolha ideológica e seja capaz de observar a realidade perceberá o aumento alarmante de antissemitismo no mundo.
Em nova roupagem, claro. Se antigamente o ódio aos judeus esteve fortemente ligado à extrema-direita, hoje ele é uma das principais bandeiras da extrema-esquerda, com a sua inusitada, paradoxal e extravagante aliança com o fundamentalismo islamismo.
Desde o atentado de 7 de outubro de 2023, acumulam-se sinais preocupantes, com atitudes de intolerância antijudaica que vão de insultos, ameaças e boicotes até ataques terroristas que resultam em mortos e feridos, a exemplo do ataque mais recente, ocorrido em 2 de outubro – dia do Yom Kippur, em uma sinagoga, em Manchester, no Reino Unido.
Fanatismo
O referido ataque foi perpetrado por Jihad Al-Shamie. O fanático islâmico sírio, naturalizado britânico, dirigiu um carro contra judeus que chegavam e saíam da sinagoga. Em seguida, saiu do carro e iniciou uma série de esfaqueamentos, deixando mortos e feridos.
O extremismo islâmico há tempos é um sério problema não apenas para judeus, mas também para cristãos ou para qualquer um que eles considerem infiéis, ou seja, a totalidade do mundo não-muçulmano. Ocorre que, uma vez consolidada a aliança do islamismo com a esquerda, questionar o Islã virou tabu:
“Você corre riscos quando levanta preocupações relativas ao extremismo islâmico. Você pode ser assediado, interpelado e agredido, […] você pode ser acusado do pior pecado nos círculos esquerdistas: ser chamado de islamofóbico”, escreve O’Neill em After The Pogrom.
O islamoesquerdismo é uma das maiores ameaças que o Ocidente enfrenta hoje, porque une um fanatismo religioso, violento e bárbaro a um fanatismo político no qual a violência e a barbárie encontram justificação.
O’Neill trata esse ponto com singular perspicácia, lembrando que, desde a década de 1970, há uma aproximação da esquerda pós-moderna ocidental aos islamistas radicais, tendo por pano de fundo a hostilidade em relação aos valores culturais e à pretensão de universalismo moral do Ocidente, ambos compartilhando um agressivo sentimento de revolta contra a racionalidade iluminista.
A decolonização
“Decolonização era a palavra que estava na boca e nos tuítes de muitos acadêmicos e alunos nas horas e nos dias imediatamente após a selvageria do Hamas.”
Brendan O’Neill faz questão de esclarecer, no entanto, que aquilo que os ativistas ocidentais de hoje entendem por decolonização não tem nada a ver com a decolonização que aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial, sendo, na verdade uma deturpação, uma traição ao verdadeiro ímpeto libertário das lutas anticoloniais daquele período.
A histeria atual dos movimentos pró-Palestina — que muitas vezes descambam para protestos violentos pró-Hamas e antissemitismo explícito — sustentam-se em inúmeras narrativas falsas.
Alguns fatos, portanto, precisam ser repisados: o Estado de Israel não foi estabelecido pelo colonialismo, mas pelo anticolonialismo e — algo um tanto mais óbvio — o Hamas não é um movimento de liberação nacional.
O’Neill denuncia, pois, o ponto de vista dos atuais ativistas e ideólogos decoloniais como uma inversão grotesca da moralidade e da verdade:
“O Estado fundado por meio de uma luta anticolonial é rotulado de ‘colonialista’ enquanto um movimento que se dedica ao massacre racista de judeus é chamado de ‘anticolonialista’. As pessoas diversas de uma nação democrática são chamadas de ‘supremacistas brancos’, enquanto intolerantes do Hamas que odeiam os judeus são colocados como combatentes da liberdade.”
Em seguida, o editor-chefe de política da revista Spiked explica que “há um paralelo ideológico, uma conexão moral, entre o ímpeto das elites ocidentais para decolonizar as instituições e o ímpeto do Hamas de matar israelenses”.
Não se trata apenas de uma opinião do autor. Como bom jornalista, ele traz inúmeros exemplos de acadêmicos que reivindicaram publicamente que suas “pesquisas” decoloniais fossem associadas aos eventos de 7 de outubro de 2023:
“Logo depois do pogrom, os Students for Justice in Palestine, um grupo da George Washington University, emitiram uma declaração elogiando o ataque do Hamas e declarando: ‘Decolonização NÃO é uma metáfora’.
A jornalista Najma Sharif destilou seu pensamento em um tuíte que viralizou logo após a carnificina do Hamas. ‘O que todos vocês acharam que decolonização significava? Boas vibrações? Artigos? Ensaios?’, ela perguntou. […]
Algo extraordinário estava acontecendo. Algo que exige nossa atenção. Acadêmicos correram para serem associados a um dos atos de violência mais cruéis de nosso tempo. Membros da classe acadêmica – professores, conferencistas, autores – estavam falando do pogrom do Hamas como: ‘Esta é a minha pesquisa em ação’.
Parece que estavam quase pedindo para serem responsabilizados (no mínimo, intelectualmente) pelo ato. Hamas foi o responsável militar pelo massacre, assassinato e sequestro de judeus. Mas o Ocidente letrado reivindicou sua responsabilidade moral.
O fato de que nossas classes letradas acolheram a atrocidade do Hamas como sendo um braço armado do seu próprio pensamento foi, definitivamente, revelador.”
Inversão de valores
É sobre essa triste “revelação” que esse artigo trata, essa estranha inversão de valores que fez com que os judeus, embora massacrados, tenham rapidamente perdido o direito de serem considerados vítimas, passando a ser tratados como os piores algozes.
Sim, desejo sinceramente o fim da tragédia humanitária em Gaza e das mortes de civis inocentes, como comentarei adiante. Mas importa notar que, antes mesmo de Israel responder com a guerra ao massacre perpetrado pelo Hamas, já havia manifestações nas ruas, nas universidades e nas redes sociais não apenas de apoio aos palestinos, mas de ódio a Israel.
Em relação a essa obtusidade moral, essa obnubilação da faculdade de julgar, merece destaque o fato, bem apontado por O'Neill, de que “o ativismo anti-Israel é uma extensão do antiocidentalismo que agora é abundante nos círculos ativistas. Os gritos de ira contra Israel são os gritos de ira contra a própria civilização ocidental”.
Gaza
O conflito ora com foco na guerra em Gaza é secular e se estende por quase todo o Oriente Médio, tendo por origem uma disputa de espaço entre judeus/israelenses e árabes/palestinos.
Ao longo da história e agora, razões têm sido apresentadas de parte a parte, com algumas propostas que abriram e abrem esperanças de solução.
Por outro lado, práticas abomináveis têm concorrido de ambos os lados, tornando a solução do problema cada vez mais difícil.
As origens do conflito são muito antigas; assim também as razões das partes. Quanto ao seu foco atual, que é a guerra em Gaza, a mesma Human Rights Watch que denunciou as atrocidades terroristas do Hamas denunciou também o governo/exército de Israel por prática de “crimes de guerra”, pelas mortes de civis palestinos em grande escala; indicando entre os mortos um número bastante alto de idosos, de mulheres e de crianças.
Mesmo assim, há uma diferença moral que precisa ser considerada. Não houve, da parte dos soldados de Israel, uma intenção deliberada de matar crianças e idosos. Seus alvos não eram, não são, os habitantes inocentes de Gaza. Os civis morreram como morrem civis em todas as guerras, mas soldados de Israel não torturaram, estupraram e assassinaram com suas próprias mãos palestinas indefesas, não sequestraram e mantiveram bebês em cativeiros.
No que diz respeito à moral, a intenção importa. É o que mais importa. Por mais tristes e trágicas que sejam as mortes em Gaza, elas são o resultado de uma guerra de contra-ataque a um grupo terrorista que se esconde por trás dos civis, transformados por eles em escudos humanos.
É preciso, porém, fazer um esforço para superar as abominações de ambos os lados e considerar as propostas razoáveis em direção a soluções possíveis. Uma razoável proposta de transição veio de onde pouco se havia de esperar; de ninguém menos que o atrabiliário e imprevisível Donald Trump.
Da Europa ao Japão, passando pelo Canadá e incluindo países árabes (Arábia Saudita, Emirados Árabes, Egito, Catar, Jordânia, etc), o “Plano de 20 pontos” de Trump obteve extenso apoio internacional.
Quaisquer que sejam os caminhos ou descaminhos seguidos, o cenário atual de Gaza tende a se modificar; ou se abranda em um purgatório razoavelmente administrável e suportável, ou se agiganta em um inferno imenso, conforme ameaça do próprio idealizador do recente plano de paz.
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