FelipeMoura Brasil

Depois do eclipse

20.12.19

“Ainda estou tentando entender o que ele fez. Parece que ele não vai falar com a imprensa por orientação do advogado dele. Se Deus quiser, ele vai esclarecer tudo em breve.”

Foi o que me respondeu Flávio Bolsonaro sobre Fabrício Queiroz em 12 de dezembro de 2018, logo após vir à tona a movimentação bancária atípica de R$ 1,2 milhão na conta do então assessor do gabinete do filho 01 de Jair Bolsonaro na Alerj.

Passado um ano da revelação, a única declaração esclarecedora de Queiroz foi que “o MP tá com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente”.

Agora que o plenário do STF derrubou a liminar do apanhador de cometas Dias Toffoli, que havia suspendido investigações baseadas em dados do Coaf, e que Gilmar Mendes, em consequência, teve de liberar a investigação específica sobre Flávio, o Ministério Público do Rio de Janeiro começou a cumprir a profecia do ex-assessor.

Queiroz recebeu R$ 2 milhões em 483 depósitos de 13 assessores de Flávio, de acordo com dados das quebras de sigilo bancário obtidos pelo MP-RJ, que acusou o filho do presidente de ter usado transações imobiliárias e a própria loja de chocolates para lavar dinheiro do esquema de devolução parcial de salários conhecido como rachadinha.

Resultado: a defesa de Flávio voltou a apelar ao STF para que suspenda novamente a investigação, decisão que caberá ao relator Gilmar, que já recebeu Flávio até em casa. O atual senador também publicou um vídeo no qual diz que “há uma perseguição absurda no Rio” e que há quem queira atingi-lo “para atingir o presidente da República”. Ou seja: posou de vítima, escorando-se na popularidade do pai (cuja esposa, relembro, teve depositados em sua conta R$ 24 mil provenientes de Queiroz, segundo o Coaf).

É a mesma atitude dos anônimos e militantes de gabinete cujos nomes e cargos, respectivamente, eu revelei; dos deputados que lhes garantem as boquinhas; dos blogueiros de crachá cujas viagens e eventos foram bancados com fundo partidário; e dos defensores do aparelhamento da TV Escola. Toda vez que são expostas suas imoralidades individuais, eles acusam que há uma armação para derrubar o governo.

Após a operação realizada contra Lulinha para apurar a utilização de firmas dele e de Jonas Suassuna no pagamento de despesas pessoais da família Lula da Silva, Lula afirmou que o Ministério Público Federal recorre a “malabarismos” para atingi-lo, perseguindo sua família. Questionado se o MP persegue Flávio, Jair Bolsonaro insinuou uma armação do governador do Rio, Wilson Witzel: “Vocês sabem o caso do Witzel, foi amplamente divulgado aí, inteligência levantou, já foi gravado conversa entre dois marginais citando meu nome para dizer que eu sou miliciano. Armaram.”

A retórica da família Bolsonaro e de sua militância virtual está cada vez mais parecida com a do PT. Depois do eclipse do cometa, muita gente ainda está  tentando entender se, guardadas as devidas proporções, as atitudes também.

Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

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