O sigiloso ‘rachid’ do PT
Presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, o petista André Ceciliano ocupa uma cadeira que já foi o trono da corrupção no estado. Os seus três antecessores no cargo, que por duas décadas comandaram a casa, estão na cadeia trancafiados pela Lava Jato. No final de novembro, Ceciliano também sofreu um dissabor na Justiça. O Supremo Tribunal Federal manteve a ação penal contra ele por fraude em licitação e desvio de verba na compra de uma ambulância, realizada ainda em 2004, na época em que era prefeito na Baixada Fluminense. Fora o contratempo desse processo que até ameaça caducar, o deputado navega em calmaria na política fluminense. A investigação do “rachid”, que aperta o senador Flávio Bolsonaro, até agora não deu em nada para o petista, embora seu gabinete na Assembleia esteja no topo da relação de movimentações suspeitas. Segundo o antigo Coaf, atual Unidade de Inteligência Financeira, quatro assessores de Ceciliano movimentaram 49 milhões de reais, quarenta vezes o valor de 1,2 milhão atribuído a Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio.
O mesmo se aplica aos demais 21 parlamentares sobre os quais o Coaf identificou operações suspeitas num total de cerca de 200 milhões de reais. O Ministério Público Estadual até abriu investigação criminal contra oito deles, incluindo Ceciliano, que tiveram os sigilos bancário e fiscal quebrados. O inquérito, no entanto, está em segredo de Justiça, o MPE não divulga nomes de investigados relacionados aos casos e nem sequer é possível acompanhar as etapas do processo no site do Tribunal de Justiça. A quebra de sigilos ocorreu em 11 de abril. No começo de julho, houve uma audiência no Tribunal de Justiça do Rio entre advogados dos acusados e os promotores. O Ministério Público não quis responder a Crusoé em que estágio estão as investigações contra o petista e demais parlamentares. Além de Ceciliano, outros dois deputados cujos assessores registraram movimentação expressiva, conforme o Coaf, foram Paulo Ramos, do PDT, hoje deputado federal (30 milhões de reais), e Márcio Pacheco, do PSC, líder do governo de Wilson Witzel na Assembleia (25 milhões de reais).
Não por falta de elementos. Apenas dois funcionários do petista, o empresário Carlos Alberto Dolavale e sua ex-mulher Elisangela Barbiere, movimentaram mais de 40 milhões de reais entre 2011 e 2017, segundo o antigo Coaf. Eles possuem negócios em Paracambi, município onde o deputado foi prefeito e comprou a tal ambulância numa licitação sob suspeita de fraude. “Esse dinheiro é meu mesmo. Eu faço movimentação nas lojas aqui da cidade. Nada a ver com Assembleia”, disse Dolavale. “Já procurou ver o do Queiroz?”, perguntou o empresário. Dolavale esteve nomeado na Assembleia entre 2011 e 2012. Diz que saiu do emprego porque o salário era baixo. O filho trabalhou no gabinete de Ceciliano até março, com vencimentos de 3,3 mil reais. Em novembro, abriu juntamente com o pai uma construtora com capital de 500 mil reais. Elisangela deixou a Assembleia em janeiro e entrou para o ramo de estacionamento. Tudo em Paracambi, uma cidadezinha de 47 mil habitantes. Por meio de sua assessoria, Ceciliano afirmou que abriu mão de seu sigilo bancário e mandou seus funcionários entregarem extratos de contas e cópia do imposto de renda para o Ministério Público. Ele afirma ainda que um dos citados no relatório do Coaf nunca foi empregado de seu gabinete. “Portanto, o montante de 49 milhões não corresponde à realidade. A apuração do MPE se refere a movimentações nas contas de funcionários e não na do deputado”, disse a assessoria. Os deputados Paulo Ramos e Márcio Pacheco não responderam a Crusoé. Eles já negaram irregularidades anteriormente.
Nas eleições de 2018, Ceciliano declarou bens de 1,9 milhão de reais, 362 mil em dinheiro vivo. Ele assumiu o comando da Assembleia Legislativa no final de 2017, quando a Lava Jato prendeu o presidente Jorge Picciani, do MDB, acusado de receber propinas das empresas de ônibus em troca de aprovar projetos favoráveis ao setor. O ex-deputado Paulo Melo e o ex-governador Sérgio Cabral, outro que presidiu a Assembleia, também estão presos. Com trânsito em vários partidos, o petista conseguiu se eleger presidente em 2019, mesmo em desvantagem, uma vez que o PT possui apenas três parlamentares contra 12 do PSL, o então partido de Bolsonaro. Até agora, tudo vem dando certo para ele.
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