RuyGoiaba

Nós somos o violinista do Titanic

20.03.20

Tentar escrever uma coluna de humor no meio de uma pandemia que já matou gente à beça pelo mundo, só deve piorar no Brasil e está deixando apreensivas (para dizer o mínimo) todas as pessoas que tenham dois neurônios funcionais faz a gente se sentir um pouco como o violinista tocando enquanto o Titanic naufraga. “Cavalheiros, foi uma honra tocar com os senhores nesta noite.”

O que me consola um pouco é que humor, sendo válvula de escape, não deixa de ser também uma estratégia de sobrevivência. Qualquer pessoa séria da área reprovaria o modo como Jair Bolsonaro e alguns de seus ministros usaram as máscaras de proteção na entrevista coletiva que concederam na última quarta-feira, 18. Eu só consigo pensar que o governo federal recebeu consultoria de Didi Mocó para aprender como pôr e tirar essas máscaras. “Isso, presidente, deixa pendurada na orelha mesmo. Agora cobre os olhos, assim. Tá lindo!”

É natural do ser humano procurar ver alguma graça nessas coisas para não se deixar abater pela noção, absolutamente correta, de que nós estamos MUITO ferrados. Ainda mais em um cenário de quarentena. Fechado em casa, eu não só passei a achar graça das péssimas piadas de Tiozão do Zap mandadas por alguns dos meus amigos como desisti de qualquer pretensão à civilização e aderi também à tiozice do WhatsApp (mentira: não desisti. Pelo menos ainda tento não espalhar boato cretino nem “receita caseira de álcool gel”). Deve ser assim que cubanos e soviéticos se sentem, ou se sentiam, no meio da desgraça: a piada é a vodca indispensável para sobreviver quando tudo em volta é Chernobyl.

(Abro aqui um parêntese completamente desnecessário só para contar a minha piada soviética favorita: um cara saiu pela Praça Vermelha gritando “Brejnev é um idiota!”. Foi preso e condenado a 15 anos: cinco por insultar o secretário-geral do Partido Comunista e mais dez por revelar segredos de Estado.)

Por outro lado, como já disseram por aí, essa pandemia é o momento de os antissociais brilharem. Sempre soubemos que esse negócio de ficar abraçando, beijando, mantendo contato com outros seres humanos e gostando de gente em geral não resultaria em boa coisa. Hoje, vejam vocês, o modo correto de provar nosso amor à humanidade é ficar o mais longe possível de nossos semelhantes.

Moral da história: seja menos Cazalbé de Nóbrega (recebendo todo mundo naquele banco d’A Praça É Nossa) e mais Silvio Santos (“vai pra lá, vai pra lá, hi-hi, ha-haaaae”). No fundo, Silvio é o violinista do Titanic que o Bananão merece.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Jair Bolsonaro poderia recorrer à pandemia do novo coronavírus para justificar a recessão que fatalmente se abaterá sobre o Brasil (o que aliás será verdade: até para os EUA já se prevê uma queda de nada menos que 14% do PIB no segundo trimestre). Poderia até utilizá-la para justificar medidas de exceção, que lhe permitiriam mandar no país sem aquele incômodo do Legislativo e do Judiciário. Em vez disso, o que o presidente escolheu fazer? Não apenas minimizar a pandemia – no que está sendo desmentido diariamente — e ir para a galera no domingo passado, 15, à moda do Seu Boneco da Escolinha do Professor Raimundo, como dizer na sua coletiva do dia 18, contra todas as orientações médicas e qualquer bom senso, que ninguém deverá se surpreender caso ele entre no metrô lotado em São Paulo, para “estar ao lado do povo”.

Jair Bolsonaro é provavelmente a pessoa mais JENIAU a já ter ocupado a Presidência do Brasil — um feito extraordinário no país que legou Dilma Rousseff à humanidade. A sequência de fotos abaixo comprova. Parabéns, presidente.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéPlacar do jogo: a máscara de proteção ganhou de Jair Bolsonaro por 3 a 0

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