DiogoMainardina ilha do desespero

Os furos de Bolsonaro

21.02.20

O furo que atormenta Jair Bolsonaro não é o da repórter da Folha de S. Paulo, e sim aquele que foi cravado no peito de Adriano da Nóbrega. Meia hora antes de caluniar a jornalista, acusando-a de oferecer sexo em troca de reportagens, o presidente revelou sua agonia no Twitter, avisando que as mensagens do miliciano, apreendidas em seus telefones celulares, poderiam ser forjadas a fim de incriminá-lo.

No dia seguinte, o pavor de Jair Bolsonaro somou-se ao pavor de Flávio Bolsonaro, que vazou nas redes sociais as imagens macabras de uma autópsia clandestina, com um corpo cheio de furos, supostamente de Adriano da Nóbrega. Enquanto o filho do presidente vilipendiava aquele cadáver, seu advogado empenhava-se na manobra desesperada – e igualmente furada – de apagar a ficha criminal do miliciano morto.

Quando a Folha de S. Paulo publicou a reportagem sobre os disparos de Jair Bolsonaro no WhatsApp, às vésperas do segundo turno, fui o primeiro a desmontá-la. A primazia deveu-se, em parte, ao fuso horário: às quatro da madrugada, eu já havia escrito que a matéria prometia abundantemente mais do que entregava. A imprensa tem o dever de investigar a propaganda digital bolsonarista e de denunciar eventuais crimes, mas uma autópsia independente daquela reportagem revelava um monte de furos suspeitos.

Nada disso explica, porém, o ataque asqueroso do presidente da República contra a jornalista. A covardia de Jair Bolsonaro espantou-me ainda mais do que sua falta de compostura. Ele é o homem mais poderoso do Brasil, e conta com uma massa de linchadores ensandecidos. Além disso, suas obscenidades foram reverberadas pelo aparelho estatal, diante de um prédio público, e se tornaram ainda mais pornográficas porque, embora ele tente esconder a idade tingindo os cabelos na pia do banheiro, trata-se de um velho de 64 anos.

O fato é que Jair Bolsonaro, acuado, procurou enterrar o cadáver do miliciano no cemitério da imprensa. De certa forma, deu certo: o episódio grotesco da repórter já está quase esquecido. Mas os furos de Adriano da Nóbrega devem continuar a assombrá-lo por um bom tempo.

Os comentários não representam a opinião do site. A responsabilidade é do autor da mensagem. Em respeito a todos os leitores, não são publicados comentários que contenham palavras ou conteúdos ofensivos.

500
Mais notícias
Assine agora
TOPO