Ricardo Stuckert/PRLula, ainda nos tempos de presidente, com José Eduardo dos Santos no Planalto: parceria

Conexão Angola

Mensagens interceptadas revelam que a cleptocracia angolana temia que delatores do petrolão expusessem sua relação heterodoxa com a Petrobras
07.02.20

Em maio de 2014, dois meses depois da deflagração da primeira fase da Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajou para Angola. Na capital do país africano, Luanda, encontrou José Eduardo dos Santos. Naquele ano, o ditador completava 35 anos na presidência por “indicação” do seu partido, o Movimento Popular de Libertação de Angola, o MPLA. A visita era mais um capítulo da estreita relação que, ao longo dos governos petistas, rendeu parcerias da Petrobras com a estatal angolana de petróleo, a Sonangol, empréstimos do BNDES e polpudos contratos para empreiteiras brasileiras, entre elas a Odebrecht. José Eduardo dos Santos ainda ficaria mais três anos no governo.

Assim como Lula, desde que deixou o poder o ex-ditador enfrenta uma série de denúncias de desvio de dinheiro público. As autoridades angolanas avançam em investigações contra seus filhos, entre eles a poderosa Isabel dos Santos, que ao longo do governo do pai se tornou uma empresária de sucesso, com propriedades e negócios espalhados pelo planeta.

Parte do dinheiro desviado das empresas angolanas sustentou dois empreendimentos imobiliários luxuosos em João Pessoa, na Paraíba. O investimento foi alvo de uma Operação da Polícia Federal que chegou a fazer buscas nos endereços de José Carlos de Castro Paiva, um ex-funcionário da Sonangol e do Banco Angolano de Investimentos, o BAI. Crusoé teve acesso a um relatório que reproduz as mensagens de WhatsApp trocadas por ele com representantes da cleptocracia angolana.

DivulgaçãoDivulgaçãoO resort na Paraíba: ainda há muito o que apurar na relação Brasil-Angola
As mensagens mostram a preocupação do grupo com as incursões da Lava Jato na Petrobras. Entre os interlocutores de Castro Paiva, estava o ex-vice-presidente angolano, Manuel Vicente, também envolvido nos escândalos da era Santos.

Um dos diálogos, em especial, expõe o temor de Castro Paiva e de Ana Paula Gray, então presidente da comissão executiva do BAI, com as investigações sobre o petrolão. A conversa é de 2016. Naquele ano, Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras, revelara que a compra de blocos de petróleo da Sonangol por 300 milhões de dólares havia rendido 50 milhões em propina para a campanha de Lula à Presidência em 2006. Cerveró contou que soube do repasse por ninguém menos que Manuel Vicente, o outro interlocutor de Castro Paiva.

Ana Paula Grey diz em uma das mensagens que as revelações dos delatores da Petrobras são “um pouco assustadoras”. E manifesta a torcida para que a parte angolana da história, na qual se incluía juntamente com Castro Paiva, não fosse “contaminada” pela investigação. “Espero que não”, responde o interlocutor, entre risos.

Reprodução/InstagramReprodução/InstagramIsabel dos Santos, até há pouco festejada por ter construído um império empresarial: negócios sob suspeita
As conversas de Castro Paiva com Manuel Vicente, apontado por Cerveró como confidente do repasse de 50 milhões de reais à campanha de Lula, deixam evidente a proximidade entre os dois. Também expõem o quanto Castro Paiva era próximo do próprio José Eduardo dos Santos, o ex-ditador angolano.

Manuel Vicente foi presidente do conselho de administração da Sonangol e Castro Paiva, tido como seu braço-direito, dirigiu a filial da estatal no Reino Unido. Foi de uma conta da petrolífera na terra de Elizabeth II que saíram verdadeiras fortunas para offshores em nome de operadores financeiros ligados a Isabel dos Santos, a filha enrolada de José Eduardo Santos.

A PF chegou a Castro Paiva ao seguir o caminho do dinheiro dos investimentos imobiliários angolanos em João Pessoa. Paiva conheceu a Paraíba por meio do português João Carlos Pina Ferreira, seu operador no Brasil. As buscas realizadas em 2017 que resultaram na apreensão das mensagens de WhatsApp eram para ser o passo final da investigação, que durou sete anos. Mas agora, com o vazamento de papéis que revelam a teia de negócios feitos mundo afora pelos poderosos da ditadura angolana com dinheiro de origem suspeita, o caso deve ganhar novos capítulos. Com possibilidade, inclusive, de avançar sobre as conexões brasileiras que tanto preocupavam a turma.

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