RuyGoiaba

100% suco de Brasil

03.01.20

Feliz 2020, sobreviventes. Tudo bem com vocês?

Vim passar o Réveillon na praia, aquele lugar paradisíaco cheio de areia, calor e turistas barulhentos e suados. Estava em plena atividade antropológica, observando o curioso gosto dos nativos pelo funk pornozão — aquele em que TODAS as músicas fazem referência àquela parte da anatomia feminina que rima com eta-eta-eta, é a lua, é o sol, é a luz de Tieta-eta-eta —, quando meu chefe me lembrou: havia uma coluna por escrever. Tentei contra-argumentar que não faço mais parte da civilização ocidental, o calor e a leseira derreteram meus miolos e todo o resto, só consigo articular palavras terminadas em “eta”, nem faço ideia de que dia é hoje, quanto mais escrever coluna etc. Mas os prazos, meus amigos, são implacáveis.

O bom é que o Brasil às vezes escreve a coluna para mim. E eu nem preciso de muito esforço de imaginação — basta citar os fatos. Décio Pignatari, o grande poeta concretino (não confundir com o Décio Piccinini do Show de Calouros), costumava dizer que no Bananão o surrealismo como gênero literário não tinha dado certo porque o país JÁ era surrealista. E a história do sujeito acusado de atirar o coquetel molotov na produtora do Porta dos Fundos confirma isso mais uma vez.

O tal sujeito, Eduardo Fauzi, foi chefe de um certo sindicato de guardadores de carros no Rio e, em 2013, deu um soco no secretário municipal Alex Costa durante uma entrevista para a TV — na época, a prefeitura fazia uma operação para fechar estacionamentos irregulares na zona portuária. Recentemente, voltou a circular um vídeo do mesmo ano em que Sininho, aquela moça do PSOL, dizia que outros ativistas faziam greve de fome pela soltura de um grupo de presos que incluía Fauzi — sim, o futuro terrorista integralista.

Pensam que acabou? Tem mais. Segundo relatos de conhecidos que estudaram com ele na UFRJ, Fauzi era conhecido como o Rei do Mambo: ia para a faculdade de camisa aberta no peito, medalhão, shorts e sapato bicolor. Viajava o mundo disputando campeonatos de zouk, dança semelhante à nossa lambada (não estou brincando: joguem o nome do cara + “zouk” no YouTube). Teria participado de um concurso de dança na República Tcheca sem avisar a mulher. E, dizem, nessas andanças teve um filho com uma dançarina russa.

E esse cara, com esse currículo, um belo dia resolve virar integralista, gravar encapuzado aquele vídeo ridículo (com um filtro de voz malfeito, que a galera do Twitter conseguiu limpar no dia seguinte) e atirar uma bomba na porta da produtora responsável pelo especial de Natal mais sem graça dos últimos 2.000 anos. Não consigo imaginar nada mais 100% suco de Brasil: aqui até o terrorismo é essa esculhambação em que o Rei do Mambo se mete a ser Bin Laden. Não me espantarei nem um pouco se prenderem o Fauzi e ele disser algo como “virei integralista porque ‘tava atrás de umas receitas de arroz integral, tá ligado? Aí, quando fui ver, curti azideia dos cara. Anauê!”.

***

A GOIABICE DA SEMANA

Mesmo com o recesso do fim de ano, o Instituto Corto Cabelo e Pinto continua em plena atividade por este Brasilzão de meu Deus. Foi sem dúvida a assessoria do instituto que providenciou os cartazes em que a prefeitura de São Sebastião anunciou seu Réveillon com “queima de fogos e DJs”. Acho música eletrônica um saco, mas jamais chegaria ao ponto de fazer churrasquinho de DJ no Ano Novo — se bem que o funk pornozão está quase me fazendo mudar de ideia.

Prefeitura de São SebastiãoPrefeitura de São Sebastião“Hoje a DJ Joana d’Arc vai incendiar o público! Burn the DJ! Vem, 2020!”

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