LeandroNarloch

Não confunda conservador com reacinha

18.10.19

Filhos e apoiadores de Jair Bolsonaro realizaram semana passada um “evento conservador” – a Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC, na sigla em inglês). Dias depois, o presidente disse que avaliava migrar para um novo partido – o “Conservadores”. Veja que coisa estranha: muitos dos que se dizem conservadores no Brasil têm muito pouco do que grandes filósofos definiram como uma postura conservadora. É preciso diferenciar o conservador clássico do chato, do estridente que passa o dia perdendo amigos na internet, do reacionário que só se manifesta por maiúsculas – ou seja, do reacinha.

O conservador clássico, da tradição dos iluministas britânicos, defende a moderação, a prudência e o ceticismo como grandes valores do debate político. Já o reacinha liga pouco para esses valores: luta para derrubar a esquerda, mesmo que seja preciso avançar contra princípios constitucionais.

O conservador, diz o filósofo inglês Michael Oakeshott em “On Being Conservative”, defende o governante como “um árbitro cuja função consiste em aplicar as regras do jogo, ou a de um moderador que dirige um debate sem participar dele”. Já o reacinha, mesmo quando exerce cargos relevantes como o de ministro da Educação, sacrifica a liturgia do cargo para bater boca com opositores na internet.

O conservador lamenta rupturas, mas não é sempre contrário a mudanças – defende mudanças lentas e graduais. Edmund Burke, pai do conservadorismo inglês, defendia a independência dos Estados Unidos e criticava o colonialismo da Índia. Hoje seria favorável à legalização da maconha medicinal (proibir remédios não é exatamente uma posição conservadora).

Já o reacinha reage a qualquer mudança de costumes. Decide suas opiniões em oposição a seus adversários políticos. Criticará uma medida da esquerda mesmo se essa medida se alinhar a princípios liberais-conservadores.

O conservador tem uma relação de respeito e até de admiração pelos militares. Mas jamais seria favorável a uma ditadura militar, pois acredita que os direitos e a propriedade do indivíduo e sua família não podem servir a utopias ou teorias de gabinete que prometem melhorar a sociedade. Defende a moderação capaz de “comandar a defesa contra o totalitarismo de esquerda ou direita”, como diz Roger Scruton.

O reacinha, por outro lado, prefere chamar de “revolução” a ditadura militar brasileira que matou centenas de pessoas, entre elas gente sem ligação com o comunismo ou a luta armada. Foi o que fez Romeu Zema, governador de Minas Gerais, em evento no mês passado.

O conservador, segue Oakeshott, “é uma pessoa cautelosa e tende a indicar a sua aprovação ou desaprovação não de forma categórica, mas prudente”. Já reacinha grita, esperneia ou parte para as maiúsculas quando alguém se atreve a discordar de sua opinião.

O conservador defende a elegância, os bons modos e as convenções, pois “os destruidores dos costumes demolem mais do que o que eles conhecem ou desejam”, como diz Russel Kirk em “Dez Princípios Conservadores”.

Já o grande filósofo reacinha do Brasil passa o dia tentando chamar a atenção da imprensa disparando ofensas e palavrões no Twitter.

Leandro Narloch é jornalista e autor do 'Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil'.

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