Ali Khamenei: desafio aos americanos com efeitos planetários

Ninguém segura os aiatolás

O Irã faz um ataque direto contra refinarias da Arábia Saudita e o mundo bate cabeça sobre como reagir
20.09.19

Dezoito drones e sete mísseis de cruzeiro guiados por satélites foram lançados de algum ponto do Irã ou do Iraque na madrugada do sábado, 14. Sem serem detectados pelos radares da Arábia Saudita ou interceptados por caças, eles caíram em dezessete pontos das refinarias de Abqaiq e Khurais. Três mísseis não alcançaram seus alvos. Alguns se fragmentaram no ar pouco antes de atingir o chão, tática usada quando o objetivo é ferir mais pessoas.

Imediatamente, a empresa estatal de petróleo saudita, Saudi Aramco, foi obrigada a suspender metade de sua produção, o que derrubou em 5% a produção mundial. Na segunda-feira, 16, o preço internacional do barril de petróleo subiu 15%. O ataque despertou preocupação por um possível conflito armado entre o Irã e a Arábia Saudita, apoiada pelos americanos. Acostumados a atacar um ao outro através de terceiros, os dois países que disputam a hegemonia no Oriente Médio e seguem correntes distintas do islamismo poderiam engalfinhar-se de forma direta pela primeira vez.

O Irã negou a autoria dos ataques. Para ajudar no despiste, os rebeldes houthis do Iêmen assumiram animadamente a responsabilidade na segunda-feira, 16. O argumento caiu logo em seguida, pela incapacidade dos houthis de enviarem drones a uma distância de mais de 700 quilômetros e ainda atingir com precisão seus objetivos. Na quinta-feira, 19, uma reportagem da CBS afirmou que oficiais americanos não tinham dúvida de que o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, autorizara a operação.

À medida que foi ficando mais evidente de que a culpa era do Irã, contudo, menor foi ficando a probabilidade de uma retaliação militar em larga escala contra o país. Cada um a seu modo, Estados Unidos e Arábia Saudita passaram a buscar meios para se esquivar de uma encrenca gigantesca.

Para Donald Trump, uma ação militar poderia atrapalhar seus planos de reeleição em novembro do ano que vem. Desde a Guerra do Iraque, iniciada em 2003, os americanos não mostram apetite para uma nova guerra. Mesmo após a derrubada de um drone dos Estados Unidos no Estreito de Ormuz, em junho, o apoio entre os eleitores para uma ação contra o Irã oscilava entre 24% e 36%. “Para os americanos, o ataque contra as duas refinarias não é uma provocação grande o suficiente para merecer uma retaliação bélica. Muitos pensam que o dano é mais para a economia mundial ou que é um problema da Arábia Saudita, e não dos Estados Unidos”, diz o cientista político americano Benjamin Valentino, professor da Universidade Dartmouth.

ReproduçãoReproduçãoA fumaça após o ataque às refinarias sauditas: drones e mísseis no 11 de Setembro do setor petrolífero
Na tarde de segunda-feira, 16, Trump declarou: “Se eu quero uma guerra? Eu não quero guerra com ninguém. Eu sou alguém que gostaria que não tivesse guerra”. Dois dias depois, ele publicou uma mensagem no Twitter prometendo aumentar substancialmente as sanções econômicas contra o Irã — como se, nesse aspecto, houvesse muito mais o que fazer. Foi uma tentativa de apaziguar os que pediam alguma atitude forte.

O maior risco de uma ação militar americana seria o de incitar novos ataques iranianos contra a Arábia Saudita, que se revelou incrivelmente vulnerável. Apesar dos arroubos retóricos do príncipe herdeiro, Mohamed Bin Salman, os militares do país não querem um confronto com o Irã — que aumentou o esforço para fabricar sua primeira bomba atômica depois que os Estados Unidos de Trump romperam o acordo internacional que tentava evitar que o país dos aiatolás entrasse para o clube nuclear. Na quarta-feira, 18, o porta-voz do ministério da Defesa saudita, Turki Maliki, deu uma entrevista coletiva em que disse várias vezes que não se tratava um problema de seu país, mas da “comunidade internacional” ou do “mercado mundial de energia”. Maliki também evitou culpar diretamente o Irã pelos ataques, o que poderia obrigar seu país a se mexer.

A consequência da hesitação americana e saudita é que os iranianos podem ficar mais à vontade para importunar os demais. O maior objetivo deles é reduzir as sanções econômicas americanas, meta que poderia ser facilmente alcançada tirando Donald Trump da Casa Branca. “Penso que o regime iraniano tentará enfraquecer o presidente aos olhos dos americanos e do mundo, esperando que isso possa minar seu plano de ser reeleito”, diz o analista político Ali Bakeer, de Ancara, na Turquia.

A expectativa de mais confusão no Oriente Médio ao longo da campanha eleitoral americana pode elevar o preço do barril, que estava em 60 dólares, para um patamar de 80 dólares. Quem ganha com essa situação são os países produtores de petróleo que estão longe da confusão do Oriente Médio, como Rússia, Canadá e Brasil. Na segunda-feira, 16, primeiro dia útil após os ataques, as ações da Petrobras subiram 5%. Uma elevação nos preços internacionais do barril é benéfica para a empresa brasileira, pois aumenta o interesse pelos leilões do pré-sal. A Petrobras anunciou que tentará segurar os reajustes até o mercado se reequilibrar — mas, naturalmente, já houve aumento do preço do óleo que sai das suas refinarias.

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