LeandroNarloch

Como ser presidente — dicas para iniciantes

06.09.19

Parabéns! Você foi eleito presidente da República. Notamos que Vossa Excelência tem enfrentado certas dificuldades nesses meses de experiência, por isso montamos este pequeno guia com dicas bastante básicas que certamente contribuirão com seu desempenho. Boa leitura! E veja se presta atenção.

1. Filhos

Na Presidência, como em jantares importantes, convém tirar as crianças da sala. Crianças costumam fazer birra, arranjar briga e querer coisas em momentos impróprios, irritando os convidados.

Por exemplo, se o seu filho insistir para ser embaixador brasileiro em Washington, é melhor dizer logo a ele: “Para o seu quarto, já!”. Atender o pedido pode estragar o melhor momento do jantar, quando todos comemoram a aprovação da reforma da Previdência no Congresso. Concordar e depois voltar atrás mostrará que Vossa Excelência é reticente, não tem muita certeza do que faz.

O vício em celulares e tablets também deve ser combatido, principalmente se seus filhos têm acesso a suas redes sociais. Podem criar polêmica publicando infantilidades em seu nome.

2. Poderes

O governo é dividido em três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Vossa Excelência é chefe do primeiro, depende do segundo e pode se ferrar com o terceiro. Tente não criar à toa conflitos com outros poderes. Se precisa que o presidente da Câmara lute por suas reformas no Congresso, não vá dizer em público que ele “é da velha política”. Pode levar um corridão e ter de pedir desculpas.

Convém aprender desde logo que, apesar de ser chefe de um Poder, Vossa Excelência não pode tudo. Não pode, por exemplo, transformar a Amazônia num grande estacionamento de shopping (apesar de muita gente gostar da ideia). A tentativa provocará boicotes que causarão prejuízos a agricultores e pecuaristas, justamente os seus principais apoiadores.

3. Ministros

Escolha ministros que tenham alguma mínima proximidade com a pasta que dirigirão. O Ministério da Educação, por exemplo, tem diversas siglas difíceis: Fundeb, Fies, Sisu, Inep, Semesp, Sealf, FNDE. Uma verdadeira loucura! O ministro deve pelo menos conhecer de cor o significado dessas siglas. Também são requisitos para o cargo saber usar a vírgula e dominar as demais regras ortográficas. Se o ministro falhar nesse ponto, talvez seja o caso de sugerir a contratação de um revisor de texto. Ou demiti-lo.

4. Boa vizinhança

Apesar de o país sob seu comando não ter grande importância mundial, ser uma espécie de Osasco do mundo, suas falas e comentários terão grande repercussão internacional. Pense duas ou três vezes antes de falar alguma coisa que possa ser interpretada como grosseria contra outros chefes de Estado. Cuidado extra para não ofender a família de líderes de parceiros comerciais do seu país. Declarações assim repercutirão mais que as boas medidas do seu governo, encobrindo notícias positivas da economia ou do combate à violência.

5. Discursos e entrevistas

Mesmo que Vossa Excelência queira ter imagem de irreverente, anti-establishment, as pessoas esperam um mínimo de seriedade das falas de um chefe de Estado. É recomendável não parecer uma criança ao se pronunciar. Por exemplo, a frase “Estamos trabalhando para combater os focos de incêndio na Amazônia” não é complexa e soa como a de um estadista. Não é o caso de “vamos fazer xixi e cocô pra apagar o mato, kkkkkkk”.

Os eleitores, principalmente os preocupados com o meio ambiente, se importam mais com palavras e sinalizações de virtude do que atitudes em si. Irritá-los com palavras só o deixará vulnerável quando ocorrer uma onda de queimadas ou desastres ambientais.

6. Fetiches

A propósito, convém deixar fetiches e obsessões para momentos privados. É comum as pessoas terem desejos esquisitos a quatro paredes, mas os cidadãos não são obrigados a saber dos seus. Restrinja sua fascinação por xixi, cocô e práticas sexuais heterodoxas ao ambiente apropriado. Sob o risco de os eleitores começarem a associar o seu governo a esses termos.

Leandro Narloch é jornalista e autor do 'Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil'.

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