Pedro Ladeira/Folhapress"A grande pornografia são os atos de corrupção que foram feitos contra os cofres públicos"

A pornografia do poder

O deputado Alexandre Frota diz estranhar a rotina do Congresso e ataca os que o enxergam com preconceito por seu passado de ator pornô. A maior pornografia, afirma, é a roubalheira contra os cofres públicos
19.07.19

Alexandre Frota chegou à Câmara dos Deputados em fevereiro após obter 155.522 votos pelo PSL, o partido de Jair Bolsonaro ao qual ele se filiou no ano passado. Foi o 16º deputado mais votado do estado de São Paulo. Artista consagrado da Rede Globo nos anos 1980, frequentador assíduo de colunas sociais e capas de revistas de fofocas, ele acabou se tornando figura assídua de barracos televisivos do terceiro escalão do showbiz nacional. Sua carreira artística foi definhando até ele estrelar filmes eróticos no início dos anos 2000, quando dividiu o set de filmagens com uma travesti.

Ainda em 2013, Frota abandonou o meio artístico e passou a gravar vídeos com mensagens políticas. A boa repercussão o aproximou dos movimentos de direita que pediam o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Nos seis meses da atual legislatura, Frota se tornou um dos principais articuladores políticos da base do governo.

Do seu passado artístico, o deputado guarda pouca coisa. Sobre amigos antigos, ele diz que a maioria faz parte do passado pois têm ligações com partido de esquerda. Quanto à fase pornô, diz não se arrepender. Para ele, pornografia mesmo é a corrupção. “As pessoas têm que ter cuidado ao apontar o dedo para mim porque ali dentro tem gente com um histórico muito pesado”, diz. Embora integre o primeiro time de defensores de Jair Bolsonaro, Frota não deixa de criticar o presidente. “Bolsonaro precisa ter mais personalidade. Precisa ser cumpridor das promessas e acordos.” Eis a entrevista.

Há algo de pornográfico no poder, em Brasília?
A grande pornografia são os atos de corrupção que foram feitos contra nossos cofres públicos e contra o povo brasileiro. A maneira como fizeram no passado foi muita violenta. Foi um estupro.

O sr. sofre preconceito no Congresso por sua história como ator pornô?
Ali dentro (do Congresso Nacional) todos têm um passado. Alguns, um passado extremamente violento de corrupção. Então fica difícil alguém apontar o dedo para mim, sendo que eu não roubei, não corri com dinheiro na cueca, não corri com malinha de dinheiro. As pessoas têm que ter cuidado ao apontar o dedo para mim porque ali dentro tem gente com um histórico muito pesado.

O sr. se arrepende de algo de seu passado?
Não me arrependo. Minha vida é um livro aberto e todas as páginas são importantes. Errando ou não, acertando ou não. Eu tive a vida que escolhi. Fui eu que fiz minhas opções. As opções todas foram minhas e eu pago um preço por isso. Mas sou muito bem resolvido com essa questão (a dos filmes eróticos).

O que dizer sobre o mercado de sexo que dizem haver no Congresso?
Já ouvi falar muito, mas não vou poder te ajudar. Primeiro, porque saio do hotel onde moro para o Congresso e do Congresso para o hotel. Só saio em Brasília para jantar. Eu não vivo a noite de Brasília. Não vou a festas. Não aceito nenhum convite e estou vivendo muito bem assim. Acordo às quatro e meia da manhã e vou dormir às dez e meia da noite. Devem existir as festinhas, as confusões sexuais. Mas eu não sei delas. Se soubesse, te falava.

O sr. não é convidado?
Nunca fui convidado. Sou um cara extremamente careta, apaixonado pela minha família, pela minha filha de cinco meses. Minha vida é trabalhar e ir para casa.

Qual sua impressão sobre o Congresso, depois de um semestre por lá?
Acho confuso. A Câmara tem um ritmo, o Senado tem outro. Mas faz parte dessa mudança de paradigma. Não podemos esquecer que ficamos nas mãos da esquerda por 14 anos. Mudar todo o sistema, o aparelhamento todo em seis meses é difícil, ainda mais quando se tem um governo que permite ter um poder paralelo do (escritor) Olavo de Carvalho, que muitas vezes interfere nas questões importantes.

Pedro Ladeira/FolhapressPedro Ladeira/Folhapress“Bolsonaro precisa ter mais personalidade. Precisa ser cumpridor das promessas e acordos. Precisa ter respeito com o Congresso”
A influência de Olavo de Carvalho é o maior problema deste governo?
O governo tem vários problemas. (Tem o problema do) Bolsonaro com os filhos, temos o problema dos filhos (do Bolsonaro) com o Congresso, e tem esse governo paralelo do Olavo de Carvalho. Agressões verbalizadas aos militares, ao vice-presidente (Hamilton Mourão), aos generais, aos deputados, ao presidente do Senado, da Câmara, e isso partindo dessa ala maluca, destemperada, que é a ala do Olavo de Carvalho. O governo tem que ser menos ideológico no sentido do que o próprio Bolsonaro falou na posse, de que ia governar para todos e que o governo não teria viés ideológico. É um governo que precisa ter mais personalidade. Bolsonaro precisa ter mais personalidade. Precisa ser cumpridor das promessas e acordos. Precisa ter respeito com o Congresso.

Vê perspectiva de mudança?
Depende do presidente. Ele tem que pegar o telefone, ligar para o Olavo de Carvalho e mandar que ele cale aquela boca velha dele. É isso que ele tem que fazer.

Seu partido também é um foco de problemas, não?
O PSL dá problema porque é o reflexo do que é o Bolsonaro hoje. Por isso é que tem dado tanto problema. O PSL é um partido novo, com 54 deputados que pensam diferente, que chegaram com uma cabeça extremamente diferente. São deputados novos, de primeiro mandato, e que não tiveram apoio nem respeito do governo. Foi o primeiro partido a ser preterido do governo, já na transição. E sozinho não vai a lugar nenhum. É o segundo maior partido na Câmara, mas quem manda ali são os partidos moderados, não são nem os de esquerda nem os de direita.

O sr. se tornou um articulador relevante do governo. Como isso aconteceu?
Quando você vira deputado, existem diversas questões que precisa trabalhar. Precisa se moldar à casa, ao sistema, ao ritmo da política que é diferente daquele que a gente imagina. Meu foco sempre foi combater a corrupção e continua sendo, mas eu abri outras frentes. Hoje, preparo um projeto sobre mulheres e outro voltado para as crianças. Fui destacado pelo PSL para ser titular da Comissão de Cultura. E no decorrer do caminho virei coordenador do partido na comissão da Previdência, o que foi fundamental para mim. Fui convidado depois do fracasso e insucesso que tinha sido a primeira ida do (ministro da Economia) Paulo Guedes na Câmara, em que houve aquele massacre e o apedrejamento verbal contra ele, o que não foi bom para o PSL, para o governo e para a direita.

Pedro Ladeira/FolhapressPedro Ladeira/Folhapress“São poucos os artistas com quem eu converso. A maioria hoje faz parte do passado, tem ligações com partidos de esquerda”
Mas o sr. tem tentado influir também na política cultural do governo. O sr. indicou um nome para a Secretaria de Audiovisual.
Indiquei o Pedro Peixoto, que é um excelente diretor, tem mais de 50 programas. Tirei o Pedro da Fox (o canal de televisão) para poder servir ao governo. Eu apenas tinha ajudado o (ministro da Cidadania) Osmar Terra (com a indicação). Agora, acharam por bem mandar o Pedro para o Rio de Janeiro e vão colocar uma pessoa no lugar dele. É uma decisão do Osmar Terra. Eu respeito, mas não faria isso.

A cultura no governo Bolsonaro foi esquecida?
Não diria esquecida. O governo deu uma dimensão à cultura que é essa. Era um ministério e virou uma secretaria. Não cobrou dos devedores (da lei Rouanet), não puniu quem participou da farra cultural, fez uma reforma na lei (Rouanet) muito branda e a trocou por uma lei de incentivo cultural nacional, que deixa ainda muito a desejar. A cultura vem passando por diversos problemas. Estou reconstruindo minha amizade com o ministro Osmar Terra. Acho ele um excelente ministro, mas deveríamos dar mais atenção à Secretaria de Cultura. Acabou que o governo nem puniu o passado nem deixou que o presente e o futuro andassem.

O sr. se relaciona bem com o setor?
São poucos os artistas com quem eu converso. A maioria hoje faz parte do passado, tem ligações com partidos de esquerda, com o PT, o PCdoB, o PSOL. Tanto que a maioria é militante, filiada ou abençoada por esses partidos. São os artistas que mais se beneficiaram no passado com esses incentivos governamentais. Claro que não podemos generalizar, mas tivemos muitos problemas graves no passado em relação a prestações de contas, a espetáculos que receberam recursos mas não foram apresentados, a turnês com prazo inferior ao programado. E não vejo o governo buscando a solução para esse passado.

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