FelipeMoura Brasil

O ‘qualquer um’ do Intercept

05.07.19

Sergio Moro descreveu na CCJ da Câmara o método de Glenn Greenwald, cujo site, The Intercept Brasil, divulgou mensagens atribuídas ao então juiz da Lava Jato.

“Não gosto de criticar veículos de imprensa, mas o veículo em questão tem uma narrativa, tem um sensacionalismo, e ele quer demonstrar uma tese que ele previamente estabeleceu.”

Foi o que escrevi na coluna anterior, duas semanas atrás.

Assim como, na corrida eleitoral de 2018, Glenn afirmou que o “trabalho dos jornalistas é demonstrar” que “Bolsonaro é uma grave ameaça aos princípios básicos da democracia, um mentiroso patológico e um fanático”, o suposto jornalista agora busca demonstrar, entre outras, as seguintes teses também manifestadas por ele no Twitter:

A) “Moro e LJ [Lava Jato] usaram meios corruptos para ‘combater a corrupção’”;

B) “corromperam o sistema legal: usando a ameaça de prisão, para forçar as pessoas a dizer coisas que *não acreditavam*, para conseguir o que queriam”;

C) “forçaram [Léo] Pinheiro a dizer exatamente o que precisavam”.

A tese A foi publicada por Glenn junto ao print de mensagens atribuídas aos procuradores Angelo e Monique, com destaque para o comentário dela de que “Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado por seus resultados”.

O que a suposta maledicência privada prova? Contra Moro, nada, a não ser que ele não tinha apoio unânime entre procuradores. Sobre Glenn, sim: que trata fofoca como informação de interesse público capaz de embasar uma acusação de corrupção.

O ex-juiz comentou o diálogo:

“Tem procuradores ali que nunca atuaram na Lava Jato, [nem] sequer trabalharam comigo (…) para poder fazer esse tipo de afirmação. O juiz, no sistema brasileiro, tem poderes, sim, para tomar determinadas medidas de ofício: [para] ele decidir, independentemente de requerimento da Polícia ou do Ministério Público. Isso está expresso na nossa legislação. Na Operação Lava Jato, eu sempre atuava mediante requerimento, dificilmente tomei alguma decisão, e certamente não tomei nenhuma decisão mais drástica, sem que houvesse um requerimento do MP ou da PF ou de algum outro órgão envolvido. Eu tenho absoluta tranquilidade quanto a isso.”

Já as teses B e C vieram acompanhadas da notícia da Folha – parceira do Intercept na divulgação do material, não nas teses sobre supostas ilicitudes de Moro – intitulada “Lava Jato desconfiou de empreiteiro pivô da prisão de Lula, indicam mensagens”.

A desconfiança da Lava Jato sobre o então potencial delator Léo Pinheiro só indica que os investigadores agiam com o ceticismo necessário ao lidar com criminosos envolvidos no maior esquema de corrupção da história do país.

Mesmo assim, o próprio empreiteiro, preso há 3 anos e 7 meses, escreveu uma carta ao jornal, refutando a tese de que foi forçado a incriminar Lula. “Não sou mentiroso nem vítima de coação alguma”, escreveu Pinheiro. “A minha opção pela colaboração premiada se deu em meados de 2016, quando estava em liberdade, e não preso pela operação Lava Jato. Assim, não optei pela delação por pressão das autoridades, mas sim como uma forma de passar a limpo erros que cometi ao longo da minha vida.”

O ex-presidente da OAS enumerou as provas que corroboraram seus relatos e que confirmaram o pagamento de propina no tríplex e no sítio (como documentos de propriedade, e-mails internos, registros de encontros com Lula, troca de mensagens com João Vaccari Neto sobre contas, além de testemunhos de trabalhadores das obras).

“João Vaccari cobrava propina de cada contrato entre OAS e Petrobras. Combinei com Vaccari que todos os gastos do tríplex e sítio seriam descontados da propina”, reiterou.

Em entrevista à Jovem Pan, Leandro Demori, editor do Intercept, havia dito que a decisão de publicar os diálogos aos poucos – em vez de esperar (o que levaria tempo) para divulgar tudo de uma vez – derivou de um “senso de justiça”: da urgência em colaborar para que uma “injustiça” não se prolongasse. No caso, contra Lula.

Como Moro destacou: “Qual foi a mensagem que revela qualquer espécie de inocente que foi condenado? Não existe nada.”

Naturalmente, porém, esse “nada” incomoda os defensores dos corruptos presos, a ponto de Glauber Braga, deputado do PSOL, ter apelado à calúnia, acusando Moro de “ladrão”; e de Glenn ter celebrado a notícia de que um procurador anônimo confirmou a maledicência privada contra Moro atribuída à procuradora Monique Cheker.

Ao reforçar como a autoria da fofoca foi checada por seu site, Glenn tuitou, triunfante:

“Qualquer um pode fazer acusações. Qualquer um pode usar insinuações. A única coisa que importa para pessoas racionais é a evidência.”

O “qualquer um” do Intercept, finalmente, estabeleceu uma tese que fica de pé.

Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

Felipe Moura Brasil é diretor de Jornalismo da Jovem Pan.

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