MarioSabino

Greenwald tenta nos censurar

05.07.19

Na última quarta-feira, fiz um podcast no Antagonista+ com o seguinte texto:

Glenn Greenwald está magoado com a cobertura que O Antagonista faz do episódio das mensagens roubadas atribuídas a Sergio Moro e procuradores da Lava Jato. Ele cobra nas redes sociais pelo apoio que nos deu no caso da censura imposta pelo STF, como se devêssemos retribuir o que pensávamos ser apenas apreço pela liberdade de imprensa. É um equívoco. Não fazemos esse tipo de troca, embora nada tenhamos contra a mais antiga das profissões.

Greenwald não está fazendo jornalismo, e sabe disso. De bobo, não tem nada; mas está cheio de bobos caindo na sua conversa fiada. Ele está apenas se servindo do produto de um furto – material de autenticidade duvidosa, sujeito a manipulações e não devidamente escrutinado, como foi reconhecido por um dos seus funcionários. Tudo isso para tentar tirar o chefe de uma organização criminosa da cadeia. E, assim, abrir caminho para a anulação de todas as condenações obtidas pela maior investigação de corrupção da história brasileira.

Greenwald pode nos chamar do que quiser. Ontem, disse que somos um site que serve para publicar vazamentos de procuradores. Bom, mesmo que fosse verdade, é melhor que servir de canal para bandidos. Aliás, estamos pensando em usar como slogan publicitário a sua invencionice de que O Antagonista é porta-voz da Lava Jato. Obrigado pela ideia, Greenwald.

O sujeito é um espertalhão. Antes de começar a publicar o material no seu site (cujo nome é revelador do que se trata o seu verdadeiro negócio), ele buscou lavar as mensagens roubadas por meio de uma parceria com a Globo. A emissora não quis nada com Greenwald porque percebeu que era uma furada. Ele, então, atacou a Globo – e recebeu uma resposta dura do diretor de jornalismo da emissora, Ali Kamel, que disse que a Globo não dava cheque em branco a ninguém, “especialmente a Glenn Greenwald”. Depois que Gilmar Mendes recolocou na pauta de julgamentos da Segunda Turma do STF o pedido de suspeição de Sergio Moro (deve ter sido coincidência, claro), Greenwald conseguiu emplacar uma parceria com a Folha de S.Paulo e a Veja. A revista, felizmente, conta com a voz sensata de José Roberto Guzzo, seu ex-diretor. Ele escreveu no Twitter: “De todos os desastres que eu já vi na nossa imprensa, incluindo aqueles em que eu tive culpa, participação ou responsabilidade, esse foi o pior de todos, disparado. Os Diários Associados não chegariam nesse fundo do poço”. Posso dizer que também as minhas inúmeras culpas no jornalismo não chegaram perto.

Com o material, digamos, legitimado por dois grandes veículos de imprensa, Greenwald e os seus miquinhos redobraram nas redes sociais a mentira de que somos a favor da censura e de um estado “policialesco”. O mesmo truque usado contra nós quando nos posicionamos contra a permissão para entrevistar Lula na cadeia em pleno período eleitoral – uma tentativa partidária, não jornalística, de influenciar e tumultuar as eleições. Volta e meia repetem a lenga-lenga. Exigir respeito dessa gente é inútil.

Não publicamos grampos ilegais por uma questão de princípio, como já disse em outro artigo. Se há jornal que o faz, está no seu direito – assim como está no nosso direito apontar as manipulações e as mentiras divulgadas a partir do que foi entregue a Greenwald. Quanto à PF, ela cumpre tão-somente o seu dever ao tentar identificar o hacker que roubou mensagens atribuídas ao ex-juiz Sergio Moro e aos procuradores da Lava Jato. Faria o mesmo se Moro não fosse o ministro da Justiça.

Ninguém prendeu ou prenderá Greenwald para obrigá-lo a quebrar o sigilo de fonte. Seria tão grave e inconstitucional quanto violar o sigilo de correspondência de qualquer cidadão, ainda mais quando o conteúdo se refere a uma investigação criminal. A coisa fica pior porque está claro que a intenção do hacker é embaraçar a administração da Justiça, para a manifesta alegria do divulgador. Se a PF concluir que Greenwald não participou do roubo nem pagou por ele, dará um atestado de idoneidade ao mártir americano, pelo menos nesse ponto. Greenwald deveria até aplaudir, já que diz não ter nada a temer, e parar de tentar nos censurar porque noticiamos que a PF está no caso. Ela não estaria se a fonte não fosse criminosa – por isso também a censura à Crusoé e a O Antagonista foi ultrajante. Vi-me diante de um delegado da PF, a mando de um ministro do STF, pelo fato de a revista ter publicado uma reportagem baseada em documento legal, entranhado num processo público da Lava Jato.

Democracia tem ladrão, liberdade de imprensa e polícia para quem precisa de polícia, naturalmente.

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