Pior que Watergate

10.05.19

As notícias do cenário político no Brasil andam a mil por hora. As manchetes do fim do expediente raramente são as mesmas que iniciaram o dia e é necessário um tempo extra para acompanhar o noticiário político internacional. Com a globalização e o efeito de ação e consequência quase imediato entre muitos países, as eleições presidenciais americanas em 2020 — e seus desdobramentos — podem ter um impacto forte também no Brasil. E aqui na terra do Tio Sam, a política também anda acima da velocidade máxima. Apertem os cintos.

Richard Nixon foi o 37º presidente americano e quem o conhece apenas pelos filtros de Hollywood não imagina como ele foi popular. Na verdade, o ex-senador pela Califórnia foi protagonista de uma das maiores goleadas eleitorais da história americana quando foi reeleito presidente com 520 dos 537 votos possíveis no colégio eleitoral em 1972. O republicano venceu em 49 dos 50 estados americanos.

Sua popularidade erodiu completamente em 1974 pela crise que ficou conhecida pelo nome do conjunto de prédios em que ficava a sede do Partido Democrata em Washington D.C., o Complexo Watergate. Nixon teve conhecimento das atividades de espionagem realizadas contra os adversários e acabou engolido pela revelação do escândalo que levou à sua renúncia.

Dois jornalistas do Washington Post, Bob Woodward e Carl Bernstein, foram os responsáveis por algumas das revelações mais importantes do caso, como mostrado no filme Todos os homens do presidente, de 1976. O caso logo entrou para o ideário popular e é especialmente importante para o jornalismo que, até hoje, se orgulha de ter derrubado um presidente americano.

O caso Watergate foi tão marcante para a política e para o jornalismo que quase sempre quando um novo escândalo surge, especialmente se ligado a uma longa investigação, cria-se um apelido com “Gate” no final. Mesmo sendo um apelido repetitivo, não deixa de ser revelador do espírito de muitos políticos e jornalistas de terem um novo Watergate para chamar de seu.

Se o jornalismo americano quer um Watergate do século XXI, depois das constrangedores tentativas de criar escândalos envolvendo Donald Trump e a Rússia, aparentemente o momento chegou com os indícios de que Barack Obama pode ter mandado o FBI espionar o atual presidente ainda quando era apenas um candidato. No entanto, a verdade é que grande parte da imprensa americana, ou assessoria do Partido Democrata, como queira, tenta a todo custo empurrar para debaixo do tapete o escândalo da atual política americana que contém requintes de fazer a crise que interrompeu o mandato de Richard Nixon parecer brincadeira de criança.

O pano de fundo da descoberta de um esquema hollywoodiano de espionagem que envolve a administração de Obama foi a investigação sobre o suposto conluio entre Trump e a Rússia nas eleições presidenciais de 2016. Os números que mostram o tamanho do absurdo irresponsável promovido pela narrativa do Partido Democrata são impressionantes. Depois de dois intermináveis anos de investigações, 2.800 intimações, 500 testemunhas, 19 advogados (a maioria ligada ao Partido Democrata), 40 agentes do FBI, 50 autorizações de escutas telefônicas e 500 mandados de busca, nenhum conluio foi encontrado entre Donald Trump ou qualquer outro cidadão americano com os russos.

A pouco mais de um ano das eleições presidenciais americanas em 2020, toda notícia ou opinião é explorada ao extremo, mas detalhes das investigações que mostram o antigo governo democrata usando o FBI e também parte do sistema judiciário americano para espionagem não têm o mesmo destaque que o horror que é Donald Trump não ter um animal de estimação até hoje. Os detalhes da operação, que estão no relatório oficial do Departamento de Justiça e que não merecem apenas um texto mas um roteiro cinematográfico, apontam como o Partido Democrata produziu dossiês falsos sobre o atual presidente americano para, através de agentes do FBI e do governo, forçar juízes a expedir mandados especiais de vigilância (FISA).

Sobre Trump e o tal conluio com a Rússia, a imprensa tradicional americana gastou mais de 500 mil artigos. O Washington Post publicou 1.184 matérias e artigos, o New York Times 1.156, a CNN pautou o caso 1.965 vezes e o canal ultra-esquerdista MSNBC rodou incríveis 4.202 matérias falando da fantasia democrata. E estes números só consideram o período até setembro do ano passado. A média foi de 15 matérias veiculadas por dia, todos os dias, baseadas em um pastel de vento. Mas o que a investigação, que custou aos cofres públicos 35 milhões de dólares, mostrou foi como o governo de Barack Obama, chamado por grande parte da imprensa de “scandal free” (sem escândalos), usou o FBI e agentes do governo como arma política para espionar cidadãos americanos e o candidato a presidente da oposição.

Com os números da economia americana como não se via havia muito tempo (menor taxa de desemprego desde dezembro de 1969), os democratas encontram dificuldades em emplacar uma nova narrativa contra a reeleição de Trump e podem estar se distanciando do eleitor americano médio com políticas e discursos que caberiam em um comício do PSOL, como propostas para mais impostos, apoio a imigrantes ilegais, inclusive com direito a voto, apoio ao aborto em qualquer fase da gestação e a inimaginável defesa do voto da cadeia para assassinos e criminosos de qualquer natureza.

Ainda há muito chão pela frente até novembro de 2020, mas o Partido Democrata de JFK, um ícone da política americana que provavelmente seria considerado de “extrema direita” hoje em dia, caminha a passos largos para ajudar a reeleger Trump. Enquanto democratas ainda esperam o vencedor das primárias do partido, e a próxima narrativa ou fato que desgaste a imagem do atual presidente, já que o relatório oficial das investigações mostra que não houve conluio com a Rússia ou obstrução de Justiça, o rumo que os políticos do partido de Obama e Hillary decidiram tomar, provavelmente também para esconder o escandaloso esquema de espionagem armado por eles, ainda é o de insistir que houve conluio entre Trump e Rússia. Só faltou combinar com os russos.

Ana Paula Henkel é analista de política e esportes. Jogadora de vôlei profissional, disputou quatro Olimpíadas pelo Brasil. Estuda Ciência Política na Universidade da Califórnia.

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