MontagemOs superministros de Bolsonaro: nas mãos de Guedes e Moro está o destino do novo governo

Agora é com eles

O sucesso do novo governo depende do sucesso de dois de seus principais personagens: Paulo Guedes e Sergio Moro. Se eles funcionarem, Bolsonaro estará no paraíso
04.01.19

As formalidades que marcam a inauguração de um novo governo costumam deixar pistas sobre o papel – e o tamanho do poder – de seus integrantes. Os primeiros dias de Jair Bolsonaro como presidente deram sinais claros de que o sucesso de sua gestão dependerá, em grande medida, de dois personagens: Paulo Guedes, o todo-poderoso do Ministério da Economia, e Sergio Moro, o xerife do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Alçados à condição de estrelas, os dois tocarão setores que, além de cruciais para a concretização de promessas de campanha de Jair Bolsonaro, englobam algumas das principais demandas dos brasileiros hoje. Na área econômica, a geração de emprego e renda. Já na seara de Moro, a redução da criminalidade e o combate à corrupção. Bolsonaro tanto sabe disso que deu a ambos superpoderes para exercerem seus cargos. Os dois tiveram carta branca para nomear quem quisessem — o que, claro, acabou sendo feito. Nesse cenário, é praticamente impossível o presidente fazer um bom mandato se a dupla fracassar. Por outro lado, se ela der minimamente certo, o governo terá tudo para ganhar o carimbo do sucesso.

No caso da Justiça, o juiz que liderou a Lava Jato chegou ao time de Bolsonaro levando o capital político de símbolo da maior operação anticorrupção da história nacional. Em seu primeiro dia no cargo, Moro destacou que o combate à corrupção, ao crime organizado e à violência urbana serão os principais eixos de sua gestão. Deixou claro que vai fortalecer a Lava Jato e incentivar operações conjuntas. Para isso, convocou alguns dos principais nomes da operação para ocupar postos relevantes no ministério. Em outra frente, o ex-juiz quer aprovar uma lei autorizando a prisão imediata de condenados em segunda instância, regra que está em vigor, mas que periga ser derrubada em breve pelo Supremo Tribunal Federal.

Além disso, medidas como a integração dos sistemas de segurança dos estados e a criação de um banco com o perfil genético de condenados por crimes dolosos também já estão no radar. É uma forma de agilizar investigações, proteger inocentes e inibir a reincidência de criminosos, diz Moro. O combate ao crime organizado será prioridade. Para tanto, o ex-magistrado não quer inventar a roda. Pretende repetir as estratégias bem-sucedidas nos Estados Unidos e na Itália. “O remédio é universal, embora nem sempre de fácil implementação: prisão dos membros, isolamento carcerário das lideranças, identificação da estrutura e confisco de seus bens”, afirmou o ministro no evento em que foi empossado.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéMoro conversa com Dias Toffoli na solenidade que marcou sua chegada ao Ministério da Justiça e Segurança: em busca de apoios
Moro sabe que enfrentará uma realidade inédita para ele e típica da administração pública: muita pressão, pouco dinheiro e burocracia em excesso. Diante disso, é possível concluir que Bolsonaro, ao empoderar Moro, também acabou por criar uma espécie de blindagem para o caso de suas promessas de campanha nas áreas delegadas ao ex-juiz não surtirem o efeito esperado. Como deu carta branca para o ministro e aos diversos nomes da Lava Jato por ele convocados para sua equipe, o eventual sucesso poderá ser facilmente faturado pelo presidente. Já o fracasso poderá ser debitado exclusivamente na conta de Moro, o senhor absoluto de sua pasta.

Por sua vez, Paulo Guedes faz apostas altas e polêmicas na economia e não poupa palavras para defendê-las. O superministro, que assumiu o posto negando o título e exaltando a importância do trabalho em equipe, é crucial para o governo Bolsonaro porque está em suas mãos a saída do país da maior crise econômica de sua história. Mais do que isso: caberá a ele implementar uma agenda pró-privatização sem precedentes no Brasil.

O “Posto Ipiranga” da campanha tem na ponta da língua o diagnóstico e a receita para a situação econômica do país. Para ele, a crise decorre de um problema básico que nunca foi enfrentado por nenhum plano econômico recente no país: a expansão contínua dos gastos públicos em relação ao PIB nas últimas quatro décadas, para, muitas vezes, sustentar relações espúrias entre os setores público e privado. “Burocratas corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo brasileiro”, afirmou no discurso de posse. Isso levou o país à inflação, às crises cambiais e ao baixo crescimento. A solução que ele oferece está baseada em um tripé: aprovação da reforma da Previdência, privatização de estatais e reforma do estado. Junto a isso, Guedes promete ainda a simplificação tributária, com o objetivo de criar um imposto único, e a abertura comercial do país.

A agenda soa como música para o mercado, outrora receoso com o nacionalismo econômico que Bolsonaro verbalizou ao longo de sua carreira. Ele pode não ter se convertido, mas escolheu um dos mais liberais economistas brasileiros para ser o fiador da prometida guinada do país. Nesse sentido, se Guedes fracassar, a confiança dos setores produtivo e financeiro no presidente ficará extremamente abalada – mas, a exemplo do que que ocorre em relação ao fator Moro, o seu sucesso poderá ser largamente faturado por Bolsonaro. É dessa equação que dependerá, de agora em diante, a popularidade do presidente e também os seus planos futuros, seja o de se reeleger-se ou o de fazer o seu sucessor.

Adriano Machado/CrusoéAdriano Machado/CrusoéGuedes, em sua posse, recebe os cumprimentos de Rodrigo Maia
A premissa de Guedes é que, solucionando a questão fiscal do país, haverá mais recursos para as áreas sociais, destacadas tanto na fala do ministro da Economia quanto na de Moro nesta semana. Mais até que nos dois discursos que o próprio Bolsonaro fez no dia de sua posse. O presidente, ao contrário do que Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff fizeram quando assumiram, não mencionou a desigualdade social e as camadas mais baixas da população como prioridade. O deslize foi corrigido. Guedes falou em “capital humano”, “classes desfavorecidas”, “apoiar a área social”, “desigualdades”, “saúde”, “educação” e “saneamento”. Moro afirmou que “o crime atinge mais fortemente os mais vulneráreis” e ressaltou por duas vezes que, “seja qual for sua renda”, o brasileiro tem direitos.

Chamou atenção, ainda, a forma como Moro e Guedes pediram apoio para levar adiante seus planos de ação. Guedes pediu ajuda, falou em “construção conjunta”, disse que “os Três Poderes vão ter que se envolver”, e até enalteceu o papel da imprensa no processo de conscientização da opinião pública para as reformas. Moro elogiou o legado das gestões anteriores e declarou que “o ministério e o próprio governo podem não acertar sempre, mas sempre farão o melhor com a pretensão de fazer a coisa certa”. O aceno é, na verdade, quase que uma admissão de que o sucesso do governo nas duas frentes dependerá também de terceiros. Nem Moro, nem Guedes — e, consequentemente, Bolsonaro — conseguirão ser bem-sucedidos em suas tarefas sozinhos. Muitas das medidas nas áreas da Justiça e da Economia precisam ser aprovadas pelo Congresso Nacional. Moro, por motivos óbvios, não é popular no meio político, e sua agenda anticorrupção conflita diretamente com os interesses de grande parte das velhas cabeças do Parlamento. Há rejeição a ele também na ala anti-Lava Jato do STF, liderada por Gilmar Mendes. Já Guedes demonstrou, desde a vitória de Bolsonaro, não ter muito tato com a política e com os códigos de Brasília. Os gestos em favor de alianças só confirmam que, em nome do sucesso nas duas frentes, valerá até flexibilizar os discursos de outrora. E compor.

Foi por esse motivo que o próprio Bolsonaro, deputado federal por 27 anos, fez também acenos conciliatórios ao Congresso em seu discurso de pouco mais de dez minutos no plenário da Câmara, na terça-feira. Ao assinar o termo de posse, ele falou em “governar com vocês”, dirigindo-se aos parlamentares, e realçou a necessidade de um pacto nacional entre os três poderes. “Estou casando com vocês”, brincou. Se Moro e Guedes funcionarem como o esperado, o presidente poderá manter seu figurino de campanha, inflamando seus apoiadores e repetindo seus discursos e tuítes, porque o essencial estará encaminhado.

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